sexta-feira, 6 de junho de 2008

O vício

Por Anna Carla Ribeiro

Olãããããã! Tudo bem?! Bom, gente, eu sei, eu sei. Não tá porra de merda nenhuma boa. Você continua com aquela pira no mindinho, aquele carro com a buzina quebrada e tendo que aturar aquela vizinha com hálito de estrume no elevador. Beleza, normal... Como já dizia Chico: “Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça. E a gente vai tomando e também sem a cachaça. Ninguém segura esse rojão”. É, eu também sei. Você levou a sério demais esse refrão e anda bebendo todo o seu salário. Afinal, o que te resta? Uma boa noite de sono com aquela maldita sensação de que falta alguma coisa? Algo se perdeu, e não foi o seu controle remoto. Se fosse, já seria o fim do mundo. Haja saco pra aturar o caos do mundo e ainda ter que levantar para assistir “Zorra Total”. O fim.

E então você pensa em todos os coitadinhos do mundo. Os desabrigados do Maranhão, os indonésios fugindo do vulcão, os pedófilos em potencial soltos por Roraima, enfim, uma desordem total. E fica pensando na pacata da sua vida. Sem problemas, pelo menos não desta magnitude. Seu acordar as oito da matina, seu café com leite e açúcar, a sua ida tranqüila ao trabalho, o seu despertador estomacal que grita de fome quando dá meio dia, os seus livros, a sua ginástica. Uma puta de uma vida tediosa. Chata pra caralho. E então você pede confusão, você precisa de ventos fortes que despenteiem todo aquele seu habitual cabelinho liso e sem graça.

E o destino, legal pra caralho esse bicho, te trás logo uma avalanche. Isso, acabou com o seu projeto de vida, exatamente como foi pedido. E você gosta. Fica até animado pelas sensações estranhas no estômago, pela expectativa, a novidade, a espera da bomba estourar. E ela estoura e destrói com tudo. Tudo de bom e de ruim. E o que te sobra? Uma vida pacata, que com o tempo volta a ser tediosa e necessita de mais paciência ainda, pra reconstruir aquela sua vidinha insossa de antes.

Você sabe que está exagerando. Você sempre faz isso, é mania, nasceu pra Hollywood, para a dramatização. Sua mãe te diz isso desde que você descobriu que ela é a sua mãe, todos os seus namorados também disseram. Mas a opinião deles não vale, eles sempre quiseram minimizar as merdas que faziam enquanto você maximizava até demais. Então você pensa, pensa, pensa. “Porque diabos eu sou assim?”. Será que a sua mãe comeu muita coxinha na gravidez e a sua retenção de sal é maior do que toda a população brasileira e por isso é tão difícil fazer da sua vida uma água com açúcar?

Não dá pra entender. Tem gente que tem seus vinte e poucos anos, nunca fez questão de ter um relacionamento sério e nunca se apaixonou. Não se sente sozinho nem se estivesse perdido na ilha de Lost. E aquela galera do “Pega mas não se apega”? Como assim não se apega, minha gente?! Já imaginou passar a vida só pegando? Sem nunca sentir ânsias de vômito ou quebrar a cama de pulos felizes só porque ele te mandou a mensagem: “Oi. Tenha um bom dia”? Será você sensível demais ao mundo ou até os golfinhos estão virando assassinos?

Viciada. Isso mesmo. Você é viciada. Não em drogas, talvez em cerveja, mas a sua compulsão mesmo é por paixão. Talvez amor, mas nunca é amor. É falta de amor próprio, é carência, é dependência, é egoísmo, é amizade, é desejo, é falta do que fazer, é paixão, é um bando de parafernalhas que tinham uma puta cara de amor. Você jurava que era, botava a mão no fogo e já virou carvão. E você então decide ir em busca desse tal de amor. É vício, a abstinência te leva à loucura e então você parte em busca dele em qualquer lugar. Nos olhos do loirinho frio, no sorriso do altão safado, na pegação do final da festa. Você sabe que não é amor, mas aposta todas as suas fichas que, quem sabe? Pode virar.

Mas não vira. Então você se atropela, perde metade dos seus cabelos, envelhece uns 37 anos, faz greve de depilação e economiza todas as cifras destinadas às lingeries. Diz que se curou da doença, que quer viver sozinha para sempre, ter uma casa com a bandeira do Payssandu de fachada e um cachorro chamado “Trovão”. Tudo papo furado. Não existe ex-gay, ex-frangueiro, ex-namorado amigão e, principalmente, ex-viciado em amor.

1 comentários:

Carol Barata disse...

Acho que me tornei uma viciada em calmaria...
Cansei do frenesi de sentir tudo ao mesmo tempo.


Mt legal o texto, como sempre!

:)

10 de junho de 2008 às 05:07

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