sexta-feira, 13 de junho de 2008

Uma porta entreaberta

Por Aimée

- Só quis dizer o que disse: não se afaste de mim.

Ela ouviu isso poucas semanas antes dele sair pela porta da frente. No entanto, apesar de todo descuido com ela e com seu sentimento, era só isso que ela gravara: não se afaste.

Ela recuou com pesar no peito, com choro engatado na garganta e sem refletir, achava bem no fundo que ele voltaria atrás, que ele a procuraria e a pouparia de dizer o que sentia. Passou a pensar maior por conta das quedas e dos baques que elas causam. Teve que aprender que muitas vezes é necessário dar passos para trás para poder avançar. E assim foi recuando da vida dele. Cortou-o como assunto, sumiu dos olhos dos amigos em comum, sumiu dos mesmos bares, dos mesmos horários, da mania de traçar sua rota com intuito de colidir com a dele.

Sentia-se avançando em diversos momentos. Mas era só ele chegar que retrocedia mil léguas e ouvia, bem ao longe, como o último suspiro de um moribundo: “não se afaste de mim”. Com o tempo passou a não evitar, precisou enfrentar esse querer como quem sai na chuva para se molhar.

Ficava sabendo dele pelos outros, sempre notícias sujas e feias. Quase sempre envolvendo mentira e mágoa. Ela pensava, angustiada, “te afasta de mim”. E na verdade, ela nem precisava pensar. Ele estava longe e essa tinha sido sua única atitude de hombridade: a distância.

Mas não tinha jeito. Sentia ele nos lugares, pressentia quando ia encontrá-lo. Sonhava com ele e pensava muito tranquilamente, que um dia aquela raiva ia passar e temia por isso, porque tinha certeza que no dia que isso acontecesse, iria ao encontro dele dizer que tudo bem, que passado era passado e provavelmente cairia em alguma mentira de olhos verdes, em alguma mesa de bar barato com pessoas idiotas porque fora somente isso que ele proporcionara. Por isso tinha medo de se esquecer. Temia por deixar o tempo passar, mas não tem como pará-lo, até porque ela sabia que os ponteiros não andam. Eles correm.

E sussurrava:
- Por favor, te afasta de mim...

***

Ele olhava com despeito e se arrependia de ter conhecido-a. Arrependia-se dos olhares, das ligações, de ter alimentado cada surto de menina mimada e tola. Mas sabia que já não dava mais para voltar atrás. E então dava graças a todos os santos por terem se afastado.

Quando a encontrava, fingia não a ver. Levantava a cabeça com soberba e arrogância e a transformava num fantasma, pensava para si mesmo:

- Puta mimada...

Era grosseiro com seus pensamentos mesmo sabendo que era ele o errado, que ela errara por culpa dele. Por suas obras e atitudes egoístas, ela tinha sido sim, uma puta. Mas como não cogitava a possibilidade de mudar de gênio, era bem mais fácil colocar a culpa nela.

Vira e mexe a encontrava com o outro cara, o novo namorado. Cara gente boa, ele pensava. Imediatamente a visualizava como uma bruxa feiticeira, que devia entorpecer o cara com suas estórias, com o perfume da pele dela, com aquela cara que ela fazia quando estava aborrecida que dizimava uma população toda só num olhar.

E quando a via com o namorado, nos bares por aí, pensava nos mil motivos que tinha para odiá-la, para querer derretê-la da humanidade, dessas bandas da terra, para nunca mais ver nada nessa vida tão narcisa quanto ela. Para nunca, nunca, nunca mais vê-la tão segura de mão dada com outro homem.

Por um segundo, escondia seu orgulho na embriaguez e imaginava-se perto dela, tocando seu ombro e via, como se fosse real, ela virando devagar e olhando por cima do ombro com olhar espantado.

Então, ele sussurrava:

- Não se afaste de mim.

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