A partida

Ela abriu o jornal para ler enquanto tomava café. Nada demais: notícias sobre economia, doenças, desgraças, guerras, televisão e moda. Realmente, nada de novo no mundo. Desde que seu filho saíra de casa, Beatriz mantinha uma rotina quase que religiosa: caminhada pela manhã cedo enquanto o dia ainda clareava. Depois, ler jornal e tomar o café preto, sem açúcar. Ia ao trabalho e voltava de lá direto para casa. Pelo menos três ou quatro vezes na semana fazia algo diferente: ia ao cinema numa sessão bem tarde e bem vazia ou lia para idosos num asilo. Ao contrário dos demais, não tinha medo de envelhecer. A idéia de ficar mais velha era confortável. Talvez por isso convivesse tão bem com sua solidão. a9e40c148b0f6505d8f332497a578d3068ff7826_m


Já com seus cinqüenta e três anos ela ainda podia ser considerada uma mulher bonita, mantinha o andar de mulher esguia da juventude e o olhar altivo, mas sem nem um terço do brilho e da força imperativa que tivera há bastantes anos atrás, talvez mais de 20 ou quiçá uns 30 anos. Os cabelos já brancos a obrigavam a gastar tempo no salão de beleza, o que a deixava extremamente irritada, pois a fazia sair daquela rotina totalmente programada para manter-se sob nenhuma perspectiva de risco ou de surpresa, seja ela boa ou ruim.


Foi passando os olhos pelo jornal, como de costume, que viu aquele aviso fúnebre. Precisou ajeitar os óculos empurrando com o dedo indicativo para perto do rosto. Abriu o jornal na mesa e o esticou, como se o fato de passar a palma da mão em cima daquele pedaço de desgraça em preto e branco fosse apagá-lo. Beatriz lia e relia. Voltava a vista cansada para o aviso fúnebre dele.


Ela o conheceu quando tinha 18 anos e entre as festas de rock, bebedeira e tatuagem, o flerte virou romance. E com o tempo, o tempo certo de 10 anos, o que havia entre eles virou o maior amor que ambos tiveram e eis que aprenderam a mudar o sentimento para poder adaptá-lo e não deixar morrer. Ela sentiu uma lágrima escorrer em seu rosto cansado e era uma lágrima sofrida, daquelas que dói na alma.


Morre, aos sessenta anos, Rafael. Morre, aos sessenta anos – novo, muito novo ainda, alguns exclamariam – João Rafael Albuquerque. Ele faleceu às 9 horas da manhã do dia 22 de julho. Morreu de câncer.


- Antes câncer no pulmão do que na alma – diz Beatriz no seu velho hábito de procurar glória (ou indiferença) em meio à dor.


Sua atitude foi procurar a velha caixa de presentes que guardava toda a memória de toda uma vida. Eram as cartas, as fotos, os tickets de cinema, as contas de motel e a camisa dele. Era muita, muita coisa guardada mais na pele do que na simples caixa já envelhecida. Beatriz foi tirando um por um dos papéis e se negou a chorar. Ele não aceitaria que ela chorasse, de jeito nenhum.


Rafael era Dj de rock nas festas de garagem, nos áureos tempos das bandas alternativas. Eles se conheceram assim, em meio à noite e às falsas impressões que a vida noturna regtistra. Beatriz chamava atenção porque era alta, magra e apaixonada por um amigo dele. Ele não chamava atenção dela: era um tipo comum, quase que ordinário Ele namorava há muito tempo uma menina super careta e ele em si era meio quadradão. Gente boa, mas caretão.


Ela no auge dos seus 18 anos, caloura na universidade e recém terminada de um namoro longo, queria mais era curtir e foi por isso e talvez só por isso, que acabou beijando Rafael pela primeira vez. Foi mais para irritar o amigo dele, mais para aproveitar o impulso que a vodca causava. Mas o beijo bateu, deu liga, deu calor e foi assim que começou uma história que terminaria ali, em meio a lágrimas e uma caixa cheia de lembranças.


O romance deles correu como a maior parte dos amores mal-sucedidos, mais desencontro do que encontros. Eles viveram a intensidade da paixão por um ano, se vendo quase todo dia, enquanto ele ainda namorava. E ela foi querendo mais e mais, foi escrevendo a próprio punho cartas e cartas com promessas e dizendo que acreditava muito no mais no sentimento do que na necessidade de compromisso. Até sentir o vazio, a sensação de estar apenas tapando um buraco que outra pessoa causava no coração de Rafael. Era uma solidão profunda, algo parecido com querê-lo mais ou querer mais de toda intimidade que tinham.


Então ele tentava explicar que não tinha como terminar aquela relação de tantos e tantos anos com a outra, enquanto Beatriz seguia a vida beijando e se entregando as paixões momentâneas, sempre com intuito de instigá-lo e provar a ele que um dia, ele a perderia. Mas não adiantava, em meio às pessoas que atravessavam a vida dela, ela continuava a se entregar a ele de corpo e alma.


Eis que então ela cansou. Conheceu outro cara, namorou e fingia para si que o tinha esquecido e engravidou aos 20 anos. Por conseqüência, casou. O tal namoro de Rafael acabou, sem mais, nem menos. Ela sofreu e chorou sozinha em seu quarto, amaldiçoando a si mesma por ter um dia acreditado nele. Ele conseguia sofrer de uma forma mais dolorosa porque não admitia o sofrimento, não deixava sequer que um músculo de seu rosto se movimentasse de forma a demonstrar a quem ia lhe contar que ela estava grávida do namorado que ele queria saber como ela estava. Ambos abafavam e engoliam a seco a dor.


Nessa época, ele já não era mais o Dj de festa de garagem. Era o próprio dono de seu bar de rock, que todas as amigas dela freqüentavam porque era, enfim, o mais legal dos locais para malucos e alternativos. Mais uma vez, ela se via sozinha com um sentimento ruim: era da boca dessas amigas que ela ficava sabendo das festinhas particulares dadas a portas fechadas do tal bar.


Cruzaram-se uma vez, uma única vez, enquanto ela estava grávida e apenas se olharam porque só olhar bastava. Beatriz conseguia acreditar naquele olhar como acredita em Deus, em anjos, em Karma, em coisas do destino, porque durante muito tempo ela acreditou que ele seria o seu próprio destino, o caminho trilhado para felicidade.


Ficaram um bom tempo sem se ver. E quando se encontraram de novo, parecia que nada havia mudado, era o mesmo olhar, o mesmo carinho e tudo diferente. As dores passadas foram supostamente trancadas a sete chaves em qualquer canto longínquo. Voltaram a se ver, se desejar, se amar, porém dessa vez sem nem se tocar. Eram as palavras trocadas, o tanto de vida vivido e as novidades que queriam relatar um ao outro em tão pouco tempo que causavam o frisson desse reencontro.


Caminharam por entre encontros e desencontros o resto da vida, ele perto e ela longe. Ou ela aqui e ele lá. Alguém a mais ou alguém a menos na relação. Pouco importava. Ele era o único que a fazia derreter num sorriso e falavam um parta o outro um "eu te amo" tão gostoso que era de suspirar e de fazer com que todos os poucos que sabiam que isso perdurava até então se perguntarem qual era o porquê deles não estarem juntos de verdade.


Hoje, Beatriz tinha que encarar a morte de Rafael e não se sentia mais com idade de chorar por amor. Esse sentimento a tinha consumido a vida toda até deixá-la ressequida e amarga. Ela procurava naquela caixa a carta que tinha feito para Rafael antes dele partir para um outro país, para a primeira grande despedida que ambos sabiam que seria definitiva. Ela guardava uma cópia de cada carta entregue a ele porque dentro de si, era muito mais gostoso sentir algo próximo do que já sentira do esperar que esse mesmo sentimento fosse retribuído. Durante todos esses anos, não se preocupou com reciprocidade. Somente queria dar a ele o que tinha de melhor em si e sentia orgulho de si mesma por ter sido dona de um amor tão altruísta, tão puro.


Numa folha de papel de caderno, estavam escritas as dores e o amor de Beatriz:


"Rafael,


Os dias que eu sabia que estavas lá eram os mais felizes. Nem sei o que foi que me fez ligar para tua casa, do nada, depois de não sei, mais ou menos dois anos sem te ver. Talvez seja porque nunca existiu isso entre a gente. Tempo. É, não tínhamos noção nenhuma do que era tempo. Nem ruim, nem triste, muito menos para falsas paixões. Era tudo tão verdadeiro e intenso no nosso mundo.


Pouco me importava onde era e se era na beira daquela praia de rio, pisando na areia, bebendo vodca em plena quarta-feira. O despertador, a dor de cabeça no dia seguinte, os meus planos de vida eu deixava para outra hora. Queria mais era que o tempo parasse.


Eu acho que sei o porquê d'eu te amar tanto assim, tão acima de qualquer coisa. Deve ser porque eu tinha 18 anos quando te conheci e eu nem te dava bola, mas ainda assim via teus olhos brilharem quando eu entrava nas festas. E porque me enxergavas quase tirando a minha roupa e eras proibido, eras aquele que as amigas diziam para me afastar.


Mas eu nunca ouvi demais o que os outros falavam, afinal eles eram só os outros e não sabiam de nada. Pelo menos, não mais do que eu que ficava horas e horas e horas de madrugada ao telefone, quase querendo transpor a barreira do som e atravessar, fazer o caminho contrário que fazia a tua voz só para te abraçar, te beijar e dormir naquele frio do teu quarto, com a camisa listrada que dizias ser o meu pijama.


Talvez eu te ame tanto por causa do rock. Porque ia para aquela festa de garagem te ouvir tocar e eu fingia que nem sabia que estarias lá. Era um ritual: roupa nova, maquiagem, frio na espinha, borboletas no estômago e mais três amigas. Tudo isso para compor o meu ar blasé de "eu não pertenço a você".


Foi assim que fui tua durante todos esses anos, quase dez. Entre idas e vindas, sempre estivestes ali, no teu canto e eu cá no meu. Hoje, eu tenho mais medo de te perder porque sei que vais embora. Qualquer dia desses, não sei qual. Nem vou querer saber. Não vou saber me despedir de ti.


Antes de ires embora, quero te contar uma coisa. Um dia me disseste para ficarmos juntos. Eu fiz cara de boba e disse que sim. Achaste naquele momento que eu não entendia o que tu querias dizer e repetiste terminando a frase com a expressão:"... mas agora, de verdade!". Eu ri, virei para o lado e dormi.


Meu presente de despedida será te contar que nesse dia eu dormi com a sensação de já estar sonhando. Ouvi de ti exatamente o que queria e sabia que aquilo não podia ser verdade, não tinha como. Eu nunca seria tua e tu nunca serás meu. Sabemos que não somos pertences.


Porque nos amamos o mesmo tanto que já nos machucamos e eu ainda te amo. Um amor tão inexplicável, tão descabido que não tem como dar certo porque de ti eu aceitaria tudo e tu pouco te importarias com meus problemas, minhas crises ou minha histeria.


Eu ficaria rouca de tanto gritar que te amo, mesmo quando estivesses ao meu lado e tu serias um canalha tão verdadeiro que me olharias nos olhos, pegarias no meu cabelo pela nuca e dirias que me amas, mesmo depois de ter beijado outra boca. Olhar-me-ias e me desejarias assim como quando eu tinha 18 anos e assim seria. Uma história com final de feliz de um casal feito um para outro. O problema é que isso não existe.


O maior bem que posso te dar é esse. É saber – e só eu saber de tudo e mais um pouco de ti – que és livre, porque também o sou. Então, fica selado o pacto que fizemos naquele final de tarde, que seremos sempre assim, um do outro. Sem porquês, sem passados, sem histórias e desencontros.


Um dia seremos um do outro e assim foi combinado, que seria na nossa velhice. Só para escandalizarmos os que souberam de toda história e quando nos olharem na rua, os jovens, não acreditarão que ali houve loucura e brigas de amor.


Ninguém acreditará que por baixo da minha roupinha florida de senhora houve uma roqueira destemida, cheia de tatuagens e piercings correndo atrás de ti nas festas de rock. E tampouco acreditarão que eras roqueiro, sedutor e mulherengo.


Afirmaremos o nosso segredo de que os amores eternos são sempre aqueles impossíveis porque se alimentam somente de sentimento. Sem falsas esperanças. Te quero como te quis a uns anos atrás. Te quero não para ser só meu, mas porque és único e eu sinto que mesmo não sendo um bem material, eu pertenço a ti. És, desde então até minha partida, meu único grande amor.


Agora, podes partir...


Beatriz"


Agora sim, ela chorava. O filho fora de casa e um ex-marido frustrado que a considerava uma megera eram suas únicas referências. O emprego que servia mais para ocupar o tempo do que para encantar a mente era sua única utilidade atualmente. Chorou porque sua pele estava enrugada e porque queria ouvir aqueles rocks, beber daquele jeito e queria muito parar de chorar. Continuava a chorar porque queria ver Rafael, queria dizer na cara dele que ele a traíra, que ousara descumprir o pacto de envelhecerem juntos, de fazer do que é por deveras vezes a pior fase da vida de muitos a melhor época da vida dela porque eles estariam juntos e assim permaneceriam. Era esse o trato.


Beatriz olhava para o jornal e não acreditava que via sua última esperança de viver um resquício de felicidade, impresso num jornal em papel vagabundo. Tudo muito preto e branco. Sentiu-se entorpecida e resolveu beber um copo de uísque e um analgésico para aliviar a dor de cabeça. Um não, três. Talvez quatro, para dormir um pouco. Melhor cinco para acordar só amanhã.


Dois dias depois, o filho de Beatriz encontrava um bilhete escrito em cima de um aviso fúnebre no jornal de alguns dias antes:


"Tua partida foi a minha maior dor. Meu único alento é poder partir também".

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Pobre tem dessas coisas...

Por Moara Brasil

Ser pobre é uma merda mesmo. Andar de bonde pelo Guamá, meio dia, ouvindo tecnobrega no volume mais estridente , depois da faculdade, na “brea” de Belém, de salto alto, com fome, não é para qualquer um mesmo! E nos últimos minutos antes de descer na parada de ônibus, decidir se pára no restaurante que vende fiado ou arriscar almoçar em casa, e de salto alto, é sempre uma grande dúvida quando se tem que trabalhar exatamente duas horas da tarde. Decidi almoçar em casa, pois me falaram que ia rolar peixe na panela. O problema é que não senti cheiro de peixe no caminho da minha casa, e meu estômago junto com meus calos foram ficando mais tristes. É, a Cláudia não havia ainda preparado o peixão, e eu estava atrasada para o trabalho. Então decidi correr para o restaurante que vende fiado. Eu não gosto muito de lá, mas pobre não deve reclamar de muita coisa não. Entrei na sala, de cheiro gorduroso, daqueles que ficam impregnados no cabelo, procurei o povo do agência que eu trabalho, que sempre costuma almoçar por lá, e não vi ninguém. É, meu almoço seria solitário mesmo. E uma mesa vagabunda me esperava no cantinho.

Sentei, abri o livro “Luxo Eterno”, que eu estou estudando para o meu projeto de tese de conclusão de curso, coloquei o fone do meu mp3 nos ouvidos e esperei o garçom vir. Depois de ler quase uns dez minutos de identidade visual de marcas luxuosas das teorias de Lipovetsky, minha barriga roncou e resolvi procurar o tal do garçom.

Ele entrou na sala e disse que já ia me atender. Tudo bem, tudo bem. É bom ler num ambiente com odor de gordura e uma fome de gastrite. Fechei o livro, não consegui ler de jeito nenhum. E a TV me chamou a atenção: “Você já viu algo igual? Pois essa mulher é diferente, você já viu alguém escrever desse jeito?”. Enquanto isso o apresentador gordo mostrava um papel com uns rabiscos ilegíveis, com um fundo musical sensacionalista e o mistério da mulher que escrevia estranho era a grande sensação do programa da Record, naquele dia muito quente. E a mulher que escrevia diferente apenas escrevia de trás para frente. Entende? Na telinha da TV também brilhava uma notícia: Caso Isabella Nardoni, fique sabendo como pode ser fácil descobrir de quem é o sangue nas roupas encontradas.

E a minha barriga roncava, a minha mesa ainda estava cheia de pratos e restos alimentares que outro ser havia deixado por lá. Um trio de amigos trabalhadores chegaram, e sentaram na minha frente.

Olhei no canto do olho para a mulher loira, e ela perguntou para o garçom “O filé daqui é filé mesmo?”. Me irritei, mas não com o que ela havia falado, e sim porque outro garçom apareceu no recinto e não me atendeu. Acenei e chamei o maldito. “Espere um minuto”, ele disse. "ACONTECE que eu estou a meia hora aqui, já pedi para arrumar a minha mesa, todo mundo já está de barriga cheia e a sala está ficando vazia e ainda nem me ATENDERAM!”. "Tudo bem", ele falou na maior calma do planeta.

Mas eu não sei o porquê, meu filé escroto na chapa não veio, e sim o bife da cavala...ops...bife à cavalo da Loira do canto. Não era o meu dia mesmo, e o primeiro garçom surgiu das trevas para me perguntar adivinha.... “O que eu havia pedido mesmo?”. Claro que me irritei, disse que ia embora, e que não estava acreditando nisso. Mas enfim, tive paciência, e esperei pelo filé de pobre. E pra piorar, quando veio a comida, coloquei molho inglês na carne pensando que era molho shoyu, claro...porque restaurante de pobre pra gente pobre como eu coloca molho inglês em vidrinhos Sakura, só para enganar malditos pobres como eu.

E para finalizar, ainda tive que ficar esperando uns 20 minutos do lado de fora da agência, de salto alto, com calo no pé, jeans, uma comida de pobre no estomago e num corredor calorento, porque ninguém tinha chegado ainda. E quando os colegas chegaram, ainda me disseram que estavam no mesmo restaurante que eu...é... pobre tem dessas coisas, pobre tem que passar por isso. Pobre tem que sofrer mesmo, e não reclama!

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Lascívia

Ora, as obras da carne são conhecidas e são: ... Lascívia... (Gl 5:19)
Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena: ...Paixão lasciva... (Cl 3)

Por Sofia Brunetta

O nome dela era Lascívia Maria, Lascívia para os muito íntimos. Pouquíssimos. A mãe biológica era uma ex-hippie, ex-presidiária, ex-amante de um senador coronel fornicador famoso no velho oeste brasileiro: o interior de Maceió, Marujeripe. Saiu vida a fora e deixou a pequenina para ser criada pela avó paterna, rígida feito vara verde, do tipo que não escorre leite jeito maneira. Ouviu de um forasteiro, que aliás, julgava ser o verdadeiro pai da criança- a despeito do que bradava o falecido político- o salmo supracitado entre os prazeres da carne e as conversas de cama. Um pouco por gostar do ritmo que o nome assumia ao ser dito e muito por pendenga da bruxa-velha, registrou a menina.

Cresceu assim, do confessionário para as missas da tarde. Antes do almoço, novena e em dias de regra- esta prova viva de que a mulher é coisa do Demo- jejum pra aplacar os pecados da carne enquanto durasse a quizila com a natureza.Vestido comprido,cabelos presos, o andar inseguro das jovens prometidas ao Senhor. Como era sem graça a pobre criatura.

Foi assim até que um destes dias, quentes como só o inferno e o sertão podem ser, imergiu na tina com água fria, enquanto a avó não voltava para irem a missa. O sabão de coco, duro, escorregou pelo corpo franzino. E nesta de procurar, água que entra e sai, madeira roçando a pele limpíssima, quase estéril... Naquela tarde, e nos próximos dias, o corpo inteiro mais vivo, o sangue quente de Lascívia.
...
Rezar, confessar, imersão. A vida tornou-se um pouco mais colorida.

Fim de tarde quente, tomou refresco de pequi, geladinho, servido pelo menino da rua de baixo. Reparou que ele já estava bem crescido. Tomou outro, e outro. Estava forte, no ponto, o suco e o menino. Todo dia, enquanto a avó discorria o terço com as suas convives tão velhas quanto ela e o profeta, aproveitava pra matar a sede e prolongar a prosa. Mostrar um pedacinho das anáguas luxuosas de cambraia da cor da pele. Um convite ao pecado, ali, expostas. Recostava na soleira da porta rococó, sob os olhares blasé-sacanas de querubins que adornavam a madeira, crucifixo entre os peitos, para alegrar as tardes de entregas.

Araçá-boi, pitanga e o de pequi. Azedinho, né? Perguntava o vendedor, de olho na satisfação e as belas curvas da cliente. Os pingos da bebida escorregando no pescoço macio. Antes de encontrar o decote, agarrou-se com Lascívia.
...
À tarde, quando a avó chegou em casa, estranhou a febre da neta, mas não deu descanso: à missa e depois confessionário. Orgulhou-se da demora em sair da casinha. O Padre, sorridente, deu as alvíssaras pelas prendas da moça. Incansável . Os coroinhas que iam estudar o catecismo, saíam de lá sabendo sobre Eva e o pecado original mais que a velha beata poderia supor.

Rezou a missa com o Leiteiro, ensinou o latim para o jornalista forasteiro, e até o Seu Manoel, da padaria, quis saber mais sobre o caminho para a redenção dos pecados. Não importava a idade, aparência e tamanho. Todo homem é digno de redenção e Lascívia.

Logo havia arrebanhado fiéis, em especial entre os senhores de respeito, que a cada dia iam mais a missa. Ao seu lado a avó prendia o sorriso, tentando disfarçar o orgulho da neta, professora das palavras do senhor. Corada, mais redonda, como era bonita a doce Lascívia.

Ao meio dia o padre esperava ansioso, suor do pecado escorrendo pela batina. Naquele dia sua ausência foi sentida. Nem o catecismo, nem suco para matar a sede. Nem sermão, nem latim. A tarde quente, quase no fim.

“Lascívia: Propensão para a lubricidade, à luxúria. Libidinagem, sensualidade, cabritismo. Medicina Satiríase.” Repetiu mais de uma vez o significado, cada vez mais alto, até que um riso frouxo saiu pela garganta e escorregou dos lábios agora perniciosos. Naquela tarde resolvera demorar consigo.

Enquanto imergiu uma vez mais na tina gelada, cheiro de coco, os bons homens da vila suspiravam. Sobravam os sucos nos garrafões de barro e os meninos se arranjavam nas bananeiras, ansiosos pelo próximo ensinamento. Saudade, vício, luxúria, Lascívia.

Santo remédio, todos diriam.

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Eu amo Chester Cheetos

Por Anna Carla Ribeiro

O pai dela paquerou a minha mãe há 40 anos. A minha tia tem o pai dela como melhor amigo. Uma outra tia minha, mais voltada à boemia, adora beber com o dito cujo. Mesmo assim, nos conhecemos sozinhas, por uma dessas coincidências da vida que mais parecem estar escritas em algum lugar acima de nós.

A gente sempre conversa muito. Pela boca, pelos olhos, pelos polegares e por todos os gestos que involuntariamente costumamos fazer. Não é preciso explicar para a Carol o que eu odeio. Ela sabe, sempre sabe, mesmo quando eu tento disfarçar. Não tem jeito.

Primeiro tentamos ganhar a vida cantarolando “Aerosmith” pelas ruas de Belém. Fizemos sucesso no cemitério, estaríamos ricas se ela não tivesse tido uma crise de riso da cara do coveiro. “Tu pensa que é bonita, piveta?”, ele indagou irritadíssimo. E então fomos proibidas de mostrar nossos dotes por lá.

Aí resolvemos ter outras grandes idéias. Inventamos o programa de fitness “Fique Em Forma Na Madruga”, um ídolo patriarcal, a professora galinha, a lenda do carro esbandalhado e uma faca que corta tudo sem o menor esforço – até mesmo um prédio ou a alça viária.

Mais uma vez o sucesso voou de nossas mãos. Um dia, quando estávamos tomando suco de bolinhas e comendo miojo de tomate, depois de umas ‘buxudas’ de maça, seu irmão jogou todos os nossos projetos pela sacada para dar aos pobres. O sonho dele sempre foi ser japonês. Aí já viu, né?

Então tivemos que estudar juntas a vida toda para podermos sair do eterno castigo que nossos pais nos deram pela tamanha irreverência. Nos preparativos para a faculdade, nos empenhávamos nas provas. Provamos a pizza mista da Companhia Paulista e todos os dotes culinários da sua querida vovó. Além de experimentar, é claro, todos os compartimentos da casa na hora de tirar uma soneca.

Para o espanto de todos ao nosso redor, passamos juntas na faculdade. O que ninguém sabe é que só conseguimos êxito graças à nossa criatividade. Inventávamos músicas para gravar as matérias. “As Repúblicas Bálticas são, tchurururururururu.... Letônia, Estônia e Lituânia, dandandandannnn...”. O mundo é dos espertos, já dizia algum velho bem antes da gente nascer.

Depois de formadas, temos novas metas. Planejamos realizar a “Festa do Leopardo – Volume II” e já estamos nos preparativos para nos lançar na mídia. Isso mesmo. Carol entrará no Big Brother 2009 e depois seguirá carreira como cantora de pagodes antigos. Seu primeiro álbum será intitulado “Chester Bahia: A saga de uma pagodeira nostálgica”. Quanto a mim, estou treinando uns passos de hula dancers. Até o ano que vem devo estar no Hawaii.

Mesmo assim, sei que ainda nos encontraremos para novos planos, aventuras, fantasias, invenções, enxerimentos e coisa e tal. Ah, como eu te amo, Chester Cheetos.

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Para os amigos saudosos,

(Carta de uma grande amiga das ohvarianas)

Até que enfim consegui. Depois de todos esses dias, querendo desesperadamente conversar de verdade com alguém, escreverei para vocês meus amigos, que estão ao mesmo tempo tão longe e tão próximos.

Na verdade, entrei num casulo. Nada muito profundo consegue chegar. Tô numa de apreciar as superficialidades. O que tem refletido em tudo: faculdade, família, trabalho, amizades e amores. Não sei bem se por ter sede de querer fazê-las todas ao mesmo tempo, ou se de ter me empanturrado de todas.

Viver tudo tão depressa de certo modo me anestesiou. E esse meu constante torpor já se tornou tão claro que tenho me prejudicado com as conseqüências. Sabem que tem gente que até anda preocupada com meu comportamento? O que acontece é que mesmo assim, não me considero menor ou menos humana por tudo isso. Aliás, me considero até mais normal agora. Só que me deixa incomodada com essa novidade é que ando mais confusa, instável e muito, muito mais impaciente.

É foda. Fico olhando umas tolices ao meu redor, um menino falando merda, uma amiga chorando, chorando e não fazendo nada pra finalizar essas dores; uma galera que por mais engraçado que pareça, está à procura de uma coisa, mas sempre reagindo indiferente e conquistado tudo oposto ao que diz querer.

Todos os dias que eu saio com pessoas de neurônios ativos. Percebo que a busca por menos superficialidade existe, mas é tão difícil que ficamos assim, estagnados e num ciclo que é tão vicioso quanto escroto.

No começo até que é legal, engraçadão- “iuurrrulll todo mundo solteiro..” - mas depois, quando realmente precisamos conversar, trocar idéias, conhecimento, cadê? Não é de se espantar essa minha amargura, não. Bichinho danado em extinção, esses seres humanos. Lembram deles? Sensibilidade, calor humano, afeto, cumplicidade.

E reclamo! Não de barriga cheia e sim pela falta de ter como enchê-la. Mas digamos que eu esteja “meio satisfeita” por ainda ter pessoas que conseguem evoluir um bate papo, via msn, mesa de bar ou casa de amigos (...). Os demais, se não estão ausentes geograficamente, estão fisicamente, ou eu estou, sei lá.

A verdade é: cansei, cansei de ser boa, cansei de ser legal e cansei de ser sexy (trocadilho infame vale, né?!). Queria emoção de verdade, grupos de amigos, como vocês, que se metiam na casa do TT, com uma garrafa de vodka e muito pra conversar, de ver o pôr-do-sol e levar a Paulinha pra tomar seu santo sorvete da Cairú, de olhar ao meu redor e agradecer a Deus por tudo que me foi dado. Belém tá um saco sem vocês, e eu, tô mais ainda...

Contratam-se urgentemente, pessoas interessantes, ou então, desse casulo não tem borboleta que sai.

Amo vocês.

Vivi

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Bom dia por quê?

Há um surto de dengue no Rio de Janeiro. Ainda existem pessoas morrendo de tuberculose no Brasil, uma doença de vários séculos atrás. Chove a dois dias seguidos em Belém do Pará, então me digam: Bom dia, por quê?


A natureza se revolta quanto aos males que nós mesmos plantamos nela. O salário mínimo sobe, juntamente com o preço dos itens que compõe a cesta básica. O Governo teme um surto de consumismo causado por um outro surto de créditos pessoais fáceis que todas essas financeiras nos empurram a torto e à direita a aceitar esse dinheiro "fácil". Tudo isso pode vir a causar um súbito acréscimo na inflação brasileira. E tudo certo. A gente acorda e tem que desejar um bom dia para todo mundo.


Não consigo entender isso. Passei anos da minha sendo criticada por ser arrogante porque não tinha o hábito de "dar bom dia" às pessoas. Veja bem o termo: DAR BOM DIA. Quem sou eu para dar um bom dia a alguém, meu amigo? Eu só posso dar o que é meu e se meu dia ainda nem começou, como posso dá-lo a alguém?


Hoje posso considerar-me uma pessoa "educada". Claro, claro. Estudei anos e anos em colégios particulares caros, que a minha mãe suava as pencas para poder pagar. Fiz balé, estudei música, aprendi a tocar piano e olhava para os dois lados quando atravessava a rua. Aprendi a ler e a escrever e graças a Deus, posso dizer que criei o hábito por fazer ambas as coisas com muito bom gosto e requinte.


Mas só agora, prestem bem atenção, só agora que rio à toa, que acho graça das piadas sem graça das pessoas, que "dou bom dia" a quem eu nem conheço só pelo simples fato de cruzar com o mesmo em qualquer percurso banal, é que sou considerada uma pessoa educada.


Não sei se cuspo na cara dos outros agora ou se deixo para mais tarde, sabe? Não consigo entender, não entra na minha cabeça qual a dificuldade que encontram em ser simples, objetivo. Nunca deixei de desejar um bom dia aos que me cercam e se ainda não tomei uma dose de cianureto no café da manhã é porque transbordo de esperança a cada amanhecer.


Não jogo lixo na rua. Boto maior fé no desenvolvimento sustentável, da mesma forma que levanto a bandeira de que a Amazônia é nossa. Não sou preconceituosa com raça cor ou credo. Acredito plenamente na energia que as pessoas transmitem, acredito em cosmos. Rezo antes de dormir, leio o Evangelho sempre que sinto um aperto no coração e isso me acalma.7ee1d814a09abe924d6174a226c0d295b181fac0_m


Estou perdendo ou resgatando princípios? Ainda não sei. Eu acho que na verdade, educar-me só serviu para me deixar assim, com gastrite, porque me deu uma compreensão tão grande sobre um monte de coisa que me deu mais vontade de saber mais um monte de coisa e me sinto assim, vazia ainda de um monte, monte-monte muito grande de muita coisa que eu sei que o mundão lá fora está a espera de quem quiser desfrutar.


Não sei se quero aprender a conviver em sociedade. Nem sei se o que faço hoje em dia é isso. Não sei se vivo ou sobrevivo. Não sei se caso, compro uma bicicleta ou se opto por tornar-me vegetariana. Não sei. E ainda sim sinto uma paz interior por não saber, porque ver o noticiário de manhã cedo me dá calafrios aí eu volto a me perguntar: ora porra, bom dia para quem, hein?

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Onze e meia e Echo & The Bunnymen

Por Moara Brasil

Ontem, quando sentei nesse sofá, aparecestes bem do meu lado. Com aquela calça jeans velha e feia, uma camisa Hering e aqueles brincos da sua orelha esquerda. Por que sempre és a minha referência para todos? De ti, lembro daquela pipoca de panela, que só você num maldito século XXI sabe fazer tão bem. E eu te amava. Amava esse teu jeito de tratar uma mulher com respeito entre quatro paredes, e escondido de todos os olhares curiosos que nos cercavam. Quando o relógio marcava 11:30, meu coração acelerava de tanta ânsia por encontrá-lo. Era tiro e queda, 11 e meia e eu ouvia o meu "Echo & the bunnymen" tocar no meu celular ericsson, e eu gozava de tanta alegria. Tomava um banho e usava aquele perfume amadeirado só para você sentir que o amor tem cheiro. "Vamos locar uns filmes? Te encontro lá!". E eu ia toda feliz, como alguém que tivesse ganhado na Loteria, ao seu encontro.

A melhor parte das nossas madrugadas que eu nunca esqueço, era a briga na hora de escolher um filme em que ambos ficassem satisfeitos. Você vinha com aqueles filmes "western" ou de guerra, e eu com aqueles da sessão de dramas... e você falava "Lá vem tu com esses filmes tristes e sem pé nem cabeça". Mas eu insistia em fazê-lo gostar do meu mundo, e tu também insistias para que eu gostasse do seu. Só que eu disfarçava muito bem ao sorrir para a sua vida.

Sempre me contava que os teus dons para a cozinha,e agora lembrei daquelas batatas-fritas, era porque você tinha sido criado por umas 10 mulheres. E que era impossível não aprender o mundo delas, pois elas eram mais presentes do que qualquer célula do seu corpo. Por isso que você cuidava de mim, às vezes como uma irmã ou até como filha.

Mas eu não queria ser sua irmã, e muito menos filha. Porque eu te desejava. Desejava cada suspiro seu, a tua boca que eu olhava à 30 centímetros de distância. Eu sei que tu me desejavas, mas tu não me querias ainda. E tu lutavas contra os teus instintos. Mas sempre acabávamos na cama. E te viciastes em mim como em teu “Red”. Me ligava todas as horas e todos os dias.

Mas eu era igual a ti, e tu igual a mim. E não merecíamos um ao outro, porque éramos viciado na pior coisa da vida: a boemia. Para os outros, nós tínhamos um caso,ou até mesmo eramos os namorados modernos. Mas nenhum se assumia, e tapávamos nossas bocas. Enquanto isso, tu colecionavas algumas garotas, e eu tentava do outro lado com alguns meninos. E tornarva-se divertido saber das tuas e tu saber dos meus: Qual foi dessa vez?Mas logo esse?

E o contrato era que ninguem se comprometeria com ninguém, era apenas diversão.


Até que um dia tudo virou revolta em mim, tudo passou a ser raiva e uma lágrima atrás da outra. E foi o fim naquela noite, em que eu te dei aquele soco. Porque pra mim, naquele momento, merecias coisas piores, mas eu também não tinha a razão, e não admitia isso. Por que tudo transformou-se em um novelo de linha?

E naquele julho, nós estávamos fracos e acabados. Todos percebiam, todos comentavam. Todos tinham pena. Mais uma vez chorei no chuveiro, e partia as veias de tanta dor. Será que tu choravas?

E só via a tua frieza e pena nesse teu rosto branco. Mas eu insisti no que não dava mais. Decidida, andei pelas ruas do Reduto, numa tarde em que chovia eternamente. E fui até você, contar que não devias ir embora daqui, que eu te queria ao meu lado, chorei miséria, me humilhei como uma capricorniana nunca faria. Não vá embora. E o Echo &The Bunnymen tocou no meu celular (MALDITO ECHO & THE BUNNYMEN), mas não era você , era outro. Esperei as tuas palavras: "Não dá mais, minha querida. Sabe qual o problema? É que eu nunca terei sossego ao teu lado. Eu nunca seria teu homem e nem tu a minha mulher. Tu és livre, e eu não agüento isso”. Não falei mais nada, e disse “obrigada”. Segui desorientada pela chuva rala, e fui embora de ti para sempre, e sem vontade de olhar pra trás. Obrigada, meu amigo. Obrigada.

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Querido,

Lembro quanto esperei por ti. Tuas premissas de mudanças profundas, marcantes. As melhorias que promoverias em mim a partir da tua chegada. Sonhei ser bela, me sentir mais mulher, única. Virias pra deixar as melenas mais macias, minha pele como a de uma mocinha dos filmes de amor. Estive a espera do meu par perfeito, serias a concretização das minhas fantasias ocultas. Inconfessáveis, tão esperadas. Pra te ter comigo, enfrentei os horrores da disputa desenfreada. Duelei com outras com as quais a natureza deixou de ser generosa. Estavas ali...à vista, com aquela cara sorrindo pra mim. Sarcástica, traidora. A mentira é alva como o teu lindo sorriso. Por isso enganas tantas. Te abres pra qualquer uma, maldito.Enfeitas onde já há beleza, de resto depões contra elas. As feias.Que te sustentam, te mantém exposto, ali, em meio a tantos outros como tu, depois no meu banheiro e no de tantas outras que acreditam nas tuas promessas de juventude eterna.
Mereces o ralo, sabonete infeliz.

Sofia.

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Epitáfio de um morto-vivo

por Raoní Beltrão (Nosso querido amigo convidado e conhecido pelo famoso "Açoite sem fimmmm" )

Homens e homem, a diferença está no número. Principalmente quando novos, homens comportam-se de maneira bem peculiar em grupo, uma espécie de treino. Sim, pois um jovem sozinho é inseguro, porém em grupo é destemido. Tudo bem, alguns parecem que jamais envelhecem mentalmente e continuam a comporta-se de tal maneira, mas o fato é que durante os treinos de machismo, homofobia, arrogância e truculência são definidos padrões de comportamento específicos, a maioria referentes a relações com outros homens, principalmente os que se julgue “não tão homens assim”. Sobra um pouco também para o tratamento referente às mulheres, com exceção de algumas familiares, o treinamento padrão nesse caso advém da metodologia de casos imaginários de conquistas e desempenhos sem fim.

Em tais rodinhas, não há homem virgem, o mais inexperiente no mínimo já transou com inúmeras mulheres, simultaneamente inclusive. Pois, a inexperiência revelaria a falta de “macheza”. Nesse sentido, há o treino sobre casos imaginários referentes as performances sexuais, relegando as mulheres a meros aspectos anatômicos, resumidos basicamente em bunda e peitos, além da submissão é claro. Quanto a seleção, basta ser “comível”. E a chance de falha na hora “H” é praticamente irremediável para a moral machista. Pois, se a mulher for “comível”, não há argumento que justifique tal “fraqueza”.

Após a graduação em machismo, alguns homens passam a viver por si só e por em prática finalmente suas teses de dominação masculina. E aí, que alguns menos obstinados em buscar uma pós-graduação em machismo começam a experimentar contradições do conhecimento acumulado por toda a adolescência. Por exemplo, quanto ao apetite sexual, descobrimos que os atributos anatômicos não são suficientes para nos apetecer, inclusive sexualmente, praticamente uma blasfêmia! O descalabro é tamanho que chegamos até a nos envolver emocionalmente (um absurdo!) com mulheres que, digamos assim, não se encaixam aos padrões anatômicos pré-estabelecidos... Daí, vem a crise existencial, estaríamos perdendo a virilidade, o instinto predatório sexual?!

Algo tem que ser feito, para tanto voltamos à caça até abatermos uma presa digna de nota ao “grupinho” (leia-se a todos que consigamos contar). É então que vem a prova dos nove, imediatamente para cama, iniciamos o “teste de virilidade”. Porém, não mais que de repente, aquele afã todo se esvai nas lembranças das asneiras proferidas, naquele bate-papo digital que revelou aquela "falcidade" (com “c”!!!), naquele convite ao show do Bruno & Marrone, naquela sonoplastia fantasiosa, enfim... e na passagem “da primeira pra segunda” surgem certas dificuldades, onde estão as preliminares?, o afeto?, a cumplicidade? Começamos a sentir falta daquele jeitinho especial de amar, que só aquela pessoa especial conhece. E agora o que fazer? Para onde correr? É então que consolida-se o crime sem suspeito, temos um morto-vivo estirado entre as pernas! Logo ele, que acabara de desempenhar seu papel, começa a fa... fafa... falharrr! Oh, não! Seria o nosso fim?! A culpa só pode ser dessa maldita camisinha que nos prende! Alguém tem que pagar...

Talvez aí então, alguns de nós compreendamos que relações afetivas vão além do aspecto físico, e até esse aspecto começa a ser influenciado pela afinidade, pelo am.. am... amor (argh!) e o crime está consumado, o morto-vivo é encontrado, morre mais um machista-vivo e nasce um ser humano sensível a natureza e à humanidade. Encarar o sexo oposto como igual, pensar como um só, amar como todos e todas, libertar-se enfim da ânsia opressiva e alcançar a verdadeira felicidade, que é aquela que se compartilha. Ali então jaz um morto-vivo.

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Eu quero é pegar na mão II: dúvidas Ohvarianas!

[ Continuando os textos sobre eles! ]

Baseado em fatos surreais venho por meio deste, tentar entender, juntamente com minhas amigas, colegas, leitoras e afins, e buscar uma resposta para a pergunta que mais assola a mente das moçoilas casadoiras do planeta Terra. E a pergunta é bem simples, machos másculos: QUAL É O PAPO, HEIN?


Engulam o comentário vulgar que "qual é o papo?" só se pergunta para puta em final de festa. Você por acaso nasceu de chocadeira? Tua mãe não te ensinou a ter bons modos e a ser gentil, não-preconceituoso e cavalheiro independente de cor, credo ou religião? Pelo jeito, não.


Então, me explica aí. Continuo levando em consideração que você não nasceu de chocadeira – ou quem sabe até pior, que quem pariu você não foi uma mulher machista, porque isso eu não tolero - e que você tenha uma boa ³ justificativa para achar que qualquer mulher gostaria de receber uma ligação ás 5 h da manhã. Talvez você tenha tido dificuldade para largar a fralda descartável e fazer "bobagem" durante a hora do sono (dos outros) tenha se tornado um hábito. Talvez você só goste de escutar uma voz sonolenta feminina, assim como nos seus velhos tempos de Pampers Ultra-seca.


O que te faz pensar que porque a gente consegue dizer "eu te adoro", queremos casar, parir dez filhos, adotar um (que se chamará Júnior) e montar uma casa no campo? Se ligue, espertão. Não sabe ler? É "eu te adoro" e não "quer casar comigo?". Pelo jeito, sua dificuldade com interpretação de texto é tão grande quanto à desistência das fraldas noturnas.


E já que tocamos nesse assunto, interpretação de texto, língua portuguesa e gramática são ce9f154876ffa58bb7f2416d334d71fd00893b3d_mmecanismos que temos para nos comunicarmos com o mundo. Vale ressaltar, querido jumento, que tais palavras como "intaum", "naum", "agente", "concerteza", "em fim" e mais todos os seus chavões de msn, não existem. E por favor, não me venha com papo de linguagem cibernética. Eu imploro.


Meninas também sentem desejo, viu? Pasmem: sabia que elas até gozam?! É, amorzinho. Isso mesmo. E não pense que você é o gostosão, o bonzão da parada, a última bolacha do pacote só porque a viu fazendo caras e bocas e a ouviu na maior gemedeira. Tem um texto do Xico Sá – todo homem devia ser um pouco Xico Sá. Mal diagramado como for, queria um daqueles para mim, juro! E se não sabe quem é, joga no Google, benzinho – que fala sobre as mulheres que gritam em sofrimento quando gozam. Ele diz que essas geralmente estão fingindo gozar. Bem, digamos que Papai do Céu, quando nos desenhou, ele "tava" meio que debochando da classe masculina.


O resto é muito básico. Aonde você já viu ganhar recompensa por dizer que garota está "meio gordinha" ou perguntar se a mesma "está de TPM"? Isso é mais básico quanto não comentar que a sua mãe amava sua ex-namorada. Caso você ainda insista em bancar o super-sincero, esteja preparado para ouvir em cinco minutos, na mesma velocidade de narrador de corrida de cavalo ou da Mulher Melancia dançando na velocidade cinco a dança do creu, todos os seus defeitos, desde a cueca velha em noite de motel até a fixação por Playstation. Poupe-se da fúria de uma meio gordinha. Ainda mais se ela estiver de TPM.


No mais, anote aí: vocês, homens do século XXI, estão nos fazendo querer retroceder, regredir, não-avançar. Vocês, estão brochando nossas mentes com suas infinitas limitações, idéia pré-fabricadas sobre atitudes e posicionamentos. Vocês nos dão vontade de voltar atrás e tomar da mão das feministas revolucionárias cada sutiã queimado em praça pública, porque simplesmente nenhum homem vale a pena jogar um Valisére com bojo extra no fogo.


Vocês fazem vergonha aos seus antepassados machos, porque não têm atitude como os homens das cavernas que tomavam para si o objeto de desejo. Fazem vergonha aos românticos que passaram noites e noites suando de tuberculose e morrendo de escrever suas cantigas de amigo. Vocês fazem vergonha a si, porque estamos aqui, ali e acolá, em todos os cantos – seja sendo mãe, arrimo de família, chefe de empresa, bandeirinha de jogo de futebol, dançarina de funk, vendedora de picolé ou tudo isso ao mesmo tempo – e ainda assim, vocês demoram a ver tamanha simplicidade que é lidar com uma mulher.


Não somos difíceis de se encontrar. Somos assim, bem-resolvidas, assalariadas, formadas, inteligentes e bonitas. Sim, até as mais barangas são bonitas, meu bem. Porque assim se sentem. Nossas mães não nos ensinaram a ter a Barbie como modelo de beleza. Diferente das de vocês, é claro.


Nossa geração feminina não acredita que o que a Cinderella perdeu na festa foi o sapatinho de cristal, nem que o problema no caminho tortuoso da Chapeuzinho Vermelho era o Lobo Mau. Somos alfabetizadas e sabemos ler as entrelinhas. Não temos mais o mito de casar de branco, nem acreditamos que rachar a conta é humilhante.


Conversamos sobre futebol, sobre música e cinema. Topamos ver aquele filme de ação e vibramos com os gols que vocês fazem nas "peladas" com os amigos. Se fazemos questão de agradar a sogra é por saber que vocês não saem da barra da saia da mãe até sair de casa, então ser bem quista por alguém tão importante para vocês é como um caminho para ser querida por vocês também. É, isso mesmo. Até quando nos oxigenamos, alisamos, encrespamos os cabelos somos inteligentes. Não pense que não.


É baseado em tudo isso que vem a vontade de retroceder. Sim, porque ter sido bacana com seus amigos e com suas famílias caretas não adiantou. Gostar de boa música, de cinema, estar atualizada no que acontece no mundo, ter um senso de humor ácido e afinado tampouco ajudou. As horas e cifrões gastos em salões de beleza não adiantaram e pior ainda, nos fizeram perceber que algumas vezes é "melhor" ter dois peitões de silicone do que um zilhão de neurônios como item de fábrica, em perfeito funcionamento.


Então, retrocedamos. Vamos todas virar Amélias: Amélia Lora Cirino, costurando as cuecas rasgadas do maridinho. Amélia Moara Brasil, lavando as camisas customizadas com beijos de batom vermelho no colarinho. Amélia Ana Sofia D'Alburque Brunetta é de família tradiconal (logo se percebe pelo nome quilométrico) e, portanto, tem um nome a zelar e uma postura a manter, ela acredita que saia curta e excesso de blush são coisas de satanás. Amélia Anna Carla, escrevendo sobre o grande caso das toalhas de mesa roubadas do varal, no jornalzinho do bairro e por último, a ohvariana que vos fala, Amélia Carol Barata cuidando da casa e de não falar nada que não desagrade o maridinho.


Se é verdade que é preciso recuar para poder avançar, já demos o ponto de partida para a corrida em marcha ré. A última a chegar será "bem": bem-sucedida, bem-resolvida, bem-bonita, bem-inteligente, bem-legal, bem-simpática e totalmente mulher "quase" perfeita da primeira década do século XXI.


Todas em seus postos que será dada a largada!

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Carta para o ex amor

Meu amor,

Escutei a nossa música. Lembra? Como foste importante pra mim. Nos teus braços eu descobri mais de mim do que poderia esperar aquela altura. Com a vida seguindo no ritmo lento das histórias tristes, trouxeste a luz para os meus dias serenos. Frios, escuros, sem tuas lembranças doces. Me tiraste a paz, mas o melhor de ti, é que senti frescor. Encheste minha alma de cores e depois partiste.
E eu aqui, cheia de trabalho e coisas importantes pra resolver, ganhando dinheiro, planejando o futuro solitário e delicioso numa enorme banheira em que me refrescarei e terei a certeza de que foste um erro gostoso enquanto durou e que, por sorte e juízo durou pouco. Obrigada por teres vivido outras paixões ao mesmo tempo, assim não te apegaste e me fizeste tua mãe e doméstica, desfrutando o desafio de ter que te colocar pra frente a cada novo dia.
Nada. È o que és perto da imensidão dos meus novos planos e da vida que ainda tenho por viver sem tua presença incômoda, inerte. Ruidosa como a bosta da música que me ofereceste bêbado e agora fica martelando a minha cabeça.
Passar bem... longe de mim.

Sofia.

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O fantasma

Por Anna Carla Ribeiro

Da primeira vez a gente nunca esquece. Naquela noite só conseguia ouvir o barulho da chuva e o sopro agudo do vento ao entrar pela fresta da janela. Era noite sem lua, sem estrela, sem cosmos, sem vida. São Pedro castigava o mundo pela sua pertinente preguiça de existir. E o mundo me castigava por essa contínua ânsia de nunca parar e querer sempre mais, mesmo quando até as formiguinhas do meu quarto adormecem.

Talvez por isso tu tenhas chegado, sem convite, mas com toda aquela costumeira expansão. Ouvi os passos largos e pesados do teu tênis velho e o balanço das antiguidades da mamãe pela tua falta de atenção. Por impulso, dei um pulo da cama e quase saí correndo encontrar tuas pegadas, se não fosse por um detalhe: estás morto e enterrado.

Não entendo porque teu fantasma veio procurar a mim, depois de tanto tempo defasado. Talvez queiras me assustar ou te vingar pelas blasfêmias e toda a minha ignorância e falta de paciência. Talvez queiras me contar um segredo, me dizer como é a vida fora da vida, ou simplesmente és solidário o suficiente pra me fazer companhia quando escuto a música que diz coisas tão profundas. Ou por não conseguir mais atingir a minha profundidade. Ou pelo ‘não’ e pela falta dele. Não sei, definitivamente.

Sei que me assustas. Vou procurar minha mãe no meio da noite pra dizer que tive um pesadelo. Mentira... Saio de casa no começo da semana porque tomei gosto pela rua. Mentira... A verdade é que eu tenho medo da tua presença, das tuas aparições noturnas, do teu cheiro que expande pelo quarto quando abro a janela. Tenho medo de não só ouvir tuas risadas e sentir a tua afundada na cama – sempre espaçosa – mas de um dia acabar te vendo por completo. Já pensou descobrir que teu fantasma é de verdade? Acabo rezando pra que realmente existas, já que a tua falsidade ideológica me faz virar uma louca em potencial com síndrome de sociopata.

Nem sempre com o tempo a gente se acostuma. De repente, teu fantasma grudou mais que meu prendedor de cabelo. Estavas comigo em cada curva, cada esquina, cada pedacinho de torta de ricota, cada piada, cada mentira, cada roupa nova. E eu sempre te reneguei, porque gosto é de coisa de verdade, que possa pegar, pôr, ver, ser. Tudo o que me soa como platônico é que nem tu, mortinho da silva!

Veja bem. Eu não entendo dos vivos, imagine dos mortos. Não sei como funcionam as aparições imateriais, os ectoplasmas, os perespíritos, a mediunidade, o céu e a terra. Nem compreendo a atração entre dois corpos, a química e a física. Sou leiga até em gravidade. A gravidade dos meus erros, dos meus acertos, das minhas decisões. Não sei, definitivamente.

E então fujo horas a fio pela estrada, fazendo curvas rápidas pra que te percas em uma delas e fiques cansado de me alcançar. Já bem longe, sinto que finalmente consegui te exorcizar. Talvez tenhamos mudado de vibração, sei lá. Caminho saltitante pela orla da praia e agradeço ao universo por sentir apenas o que é cientificamente comprovado: a chuva fininha, a areia molhada, a água salgada.

Tudo estaria perfeitamente primoroso se eu não resolvesse olhar pra trás. Vejo-te distraído, olhando pro nada, abrindo uma coca e brindando o horizonte.

Estás vivo, principalmente dentro de mim.

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Dia do Perdão: sobre a lenda urbana e entidades educacionais sem fins lucrativos.

Num dia de semana qualquer, provavelmente numa quarta-feira, já que esse dia da semana é sempre tão esquecível, recebo um e mail me avisando que chegou com meu nome, à minha casa, uma correspondência da minha "saudosa" faculdade. Parecia que eu estava vendo aquele envelopezinho em tamanho padrão com o logotipo da faculdade em marca d'água impresso naquele verde desprezível.


A notícia era simples e apesar de não ter lido de fato a carinhosa cartinha, de longe, eu sabia como começava e terminava. Talvez a carta pudesse ser usada como exemplo de aula de redação oficial ou coisa assim: a fonte Times New Roman (ou Arial) em tamanho 12, com espaçamento duplo e com 3 cm de margem esquerda e 2 cm de margem direita. Ah, e claro, provavelmente começava com "Cara Maria,".


unamaO intuito da instituição educacional sem fins lucrativos – nunca entendi porque uma faculdade privada utiliza esse termo, me soa como piada. Sem fins lucrativos. Dá vontade de rir – era me avisar sobre uma dívida pendente.


Mas calma aí. Pendente? Como assim? Já não bastavam as infinitas negociações a cada seis meses (matrículas, rematrículas, confirmações de matrículas e etc, etc, etc) e eu ainda não estou quite com a tal instituição? Ah, continuo sem entender o tal "sem fins lucrativos". Mas me abstenho de compreensão e visto a carapuça do Shakespeare: "Há mais coisas entre o céu e a Terra do que sonha nossa vã filosofia".


Mesmo achando que a literatura inglesa aplaca grande parte das minhas dúvidas, fiquei com cara de interrogação até entender de onde vinha a tal dívida: biblioteca! Sim, aquele lugarzinho cheio de estudantes, de livros, de filas, de barulho em véspera de prova. Eu devo a biblioteca da universidade há, hum... deixe-me fazer os cálculos.Cerca de 7 anos! Podem rir, eu deixo.


Há exatamente sete anos atrás, a Alessandra, uma amiga minha que havia ingressado um ano antes no curso de Comunicação Social pediu a carteirinha da biblioteca emprestada para pegar um livro específico do curso. E claro, como toda boa universitária-cabeça-de-vento esqueceu de devolver no dia (ou no mês) que deveria. Resultado: uma multa de R$25,00 no meu nome.


Minha amiga não é caloteira, não. Eu que sou! Decidimos resolver o problema trocando dívidas. Ela assumiria a parcela de uma saia jeans que eu comprei no cartão dela e em troca eu pagaria a biblioteca. Tudo resolvido, não é? Claro que não. Eu,como toda boa brasileira-universitária-cabeça-de-vento, resolvi ouvir o Marth.


O Marth é um ser que mede 2,02 m, publicitário, meu amigo desde os tempos do pré-vestibular. Foi responsável pelo meu primeiro estágio no ramo de comunicação. Trabalhávamos juntos. Metade do tempo fumávamos (ele sempre filando meus cigarros) e a outra metade planejando como dominar o mundo da publicidade com as nossas campanhas super geniais, os roteiros dele super inovadores e as idéias que nunca foram aproveitadas. Nem por nós, nem pela agência. Talvez (muito talvez, gente) seja por isso que estágio não durou mais de 3 meses.


Quem o conhece sabe que falo de uma figura bizarra, que tem uma visão de mundo bem ampla – essa foi a melhor analogia que encontrei para não chama-lo de "idiota" ou dizer "Pára de viajar, doido. Tu só falas besteira" como eu fazia há alguns anos. Digamos que o Marth tinha uma imaginação beeeem ilimitada.


Nessa época do estágio, costumávamos pegar ônibus juntos para ir à universidade e foi numa dessas conversas banais que eu caí no conto ou lenda urbana, como preferir, do Dia do Perdão.


Bem, que há o Dia do Perdão no calendário judaico, eu sei. São 25 h de reza braba e jejum. Mas eu teria que fazer isso para que a instituição sem fins lucrativos "perdoasse" meus míseros R$25,00? Segundo o Marth, a biblioteca institucionalizou o Dia do Perdão para que as dívidas de devolução do material didático fossem absolvidas. Havia um porém: esse dia não tinha uma data certa, nem um mês pontual. Era preciso que você fosse lá perguntar todos os dias se era o Dia do Perdão.


Assim como todo ser em perfeito juízo, nunca acreditei cem por cento no que o Marth falava. Mas poxa, aquela mentira era tão legal. Passei a acreditar. Não no meu amigo, mas na mentira e fui além. Espalhei por toda universidade, mais as três turmas que fiz parte nos cinco anos de faculdade, sobre a possível existência do Dia do Perdão.


Nunca tive coragem de perguntar no balcão se realmente havia o tal Dia do Perdão. Mas chegou a um ponto que quando eu começava a falar sobre o assunto, alguém pulava e dizia "Ah, pode crer. Eu já ouvi falar sobre o Dia do Perdão".


Hoje, 22 de abril de 2008, eu ainda devo R$25,00. O Marth continua sendo absurdo: a última notícia dele que soube é que insiste na carreira de cineasta e foi fazer a exibição de um filme numa aldeia indígena. Chegando lá, o ser de 2,02 m escolheu um desenho animado da Disney (Madagascar) para passar aos índios que não conseguiriam ler as legendas. Até aí, tudo bem plausível.


O ponto "Marth" da história foi que ele chegou lá e liberou a distribuição de coca-cola e pipoca para os caciques e curumins. Se você por acaso andar pelo interior do Pará e ver um índio trocando qualquer artefato artesanal por uma garrafa de 2,5 l de coca-cola, pode ter certeza. É obra do Marth.


Para mim, restou a lembrança de tempos deliciosos de faculdade, das coisas absurdas que meu amigo falava. Mas o mais gostoso de tudo foi ficar com aquela risadinha debochada ao pensar que a tal instituição educacional sem fins lucrativos parece mulher casada que levou chifre do marido com a melhor amiga: não perdoa, nem esquece. Jamaaaaais!

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Quando a mulher entra em greve

(Como o nosso público é bem masculino, resolvi voltar a escrever sobre e para eles: os homens.)

Por Moara Brasil

Quando a mulher entra em greve, o mundo quase desaba. De repente parece que os hormônios afloram pelos ambientes, os homens sabem. E quando percebem que a mulher entrou em greve, sentem o cheiro de greve no ar, e se afastam. É melhor procurar as fáceis. Mulheres difíceis não existem mais, é chato. Só se for a santinha pra namorar, ou as mais quietas que não gostam de uma cervejinha.
É, mas decidir entrar em greve não é fácil não. Greve sexual mesmo, se você ainda não compreendeu, entenda logo! É uma decisão temporária, e dói. Dói pela carência sexual.
De repente a mulher resolve que os antigos “botes” já não lhe servem mais. Quando ela percebe que o fulano só acrescenta um pouco mais de sexo sem alma e sem graça pra vida dela, ela bloqueia. Deleta. E vai contando:

Paulinho diz:

“E ai, sabes qual a boa de hoje?”

Moa diz:

“Sei lá! Eu por acaso sou agenda cultural beibe?”

E mais:

Jorge diz:

“Oi gatinha, quanto tempo! Vamos sair?”
Moa diz:

Tá, bora para uma festa de uma amiga.

Jorge diz:

“Não, mas eu queria só eu e você, então te ligo depois”

"Eu e você?" E o fulaninho te liga cinco horas da madrugada? É puto? Depois quer ficar falando por aí que homem não tem comportamento de “ploc”, que isso é coisa de mulher. Porque na minha santa inteligência, desde a Idade Média, ligar de madrugada, na hora em que eu deveria estar contando meus carneirinhos, é sexo. Então: DELETA.

Fui riscando todos da minha “enooorme” lista. Quando vi, não restavam mais nenhum. Não sobrou um homem interessante com duas cabeças o suficiente para encarar uma mulher, assim como eu. E olha que eu não sou exigente, só quero uns carinhos, um cafuné, uma boa conversa e um sexo insaciável. Apenas.

Então, prefiro me contentar com o prazer de ouvir minhas músicas "autistas", cuidar dos meus cabelos, conversar com as minhas amigas e escrever sobre vocês. Pra ver se alguém se manca, e comece a se espertar para a vida. Porque homem de verdade, é uma coisa rara. E bote rara nisso pra se achar! Se um instituto fosse fazer uma pesquisa quantitativa e qualitativa, para medir a qualidade perto da quantidade de homens interessantes por aqui, e colocassem nas mídias, com certeza (E COM CERTEZA, por favor, escreva direito), agora estaria acontecendo um fenômeno: uma diáspora de mulheres infelizes da Amazônia para o resto do mundo. É isso. E viva os nossos consolos! E viva os nossos dedinhos. Mas "tá ruim" ein!

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Ao mestre com carinho,

Querido mestre,

Te escrevo para dizer que permeias minhas memórias juvenis. Lembro quando te contava meus sonhos, meus planos, e tu, vivido e experiente, me trazia para o chão. A realidade era posta ali, na minha frente para que deglutisse devagar. O pesar ajuda a ser sábio. E pobre. Como tu, que estás como te deixei um dia: antiquado, falastrão e mesquinho. Tenho pena de ti, perdido em meio às tantas frustrações, sem sonhos, sem novas idéias pra embalar teus longos dias de solidão e arrependimento. Azedo como tua presença e tua esterilidade de pensamento.
Àcida como as palavras que deixaram meus dias ao teu lado tão sombrios.
Tu, que me trouxeste tantas vezes para a realidade, um dia vais limpar o chão que eu piso e lembrar do meu caminho de sucesso longe de ti.
Obrigada desde já.

Sofia.

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Eu quero é pegar na mão

Por Lora Cirino

Vocês devem estar pensando: “que mal amadas essas moças deste blog”. É uma citando ex, outra citando “peguete”, outra citando homens imaginários e todas querendo alguém que nos pegue pela mão, nos assuma e nos leve ao shopping (piada interna).
Não gente, o problema não somos nós, é uma coisa que atrapalha vários núcleos da sociedade como um todo: o mercado.
Achar quem te coma, quem te pegue e até quem queira namorar, é a coisa mais fácil do mundo, um sorrisinho já resolve , uma meia dúzia de palavras admiráveis e demonstração de bom gosto musical já encantam. O problema é o mercado...
Enfrentamos dificuldades em vários setores desta área. Quando você começa a se encantar, as saídas foram boas, o sexo foi legal, fofinho, ou animal, aí você adiciona o rapaz no msn e lá vem os terríveis: ”agente” (é agente federal, meu filho?), “concerteza” (proveniente de onde essa palavra?) e “derrepente” (der-re...o quê?). Analisando, nem dá pra entender o que está escrito, se manque, em primeiro lugar. Todo mundo erra, mas tem coisa que é o básico da Raimundinha, me mete logo medo.
Ou aquele s do fofinho, case de sucesso, beijo delicinha, ainda não rolou, que fofo, vai rolar... Vai? Vai, não... Não vai, ele broxou. Calma, eu não tenho preconceitos, broxar é normal! Muito normal, eu sei, tranqüilo. O que não é normal é achar a coisa mais normal do mundo... Por duas vezes seguidas, abraçar e dormir sem tocar no assunto. Ai, gente, dá muito medo. Enfim, não viemos aqui pra isso...
Ou ainda aqueles que querem ser seus amigos. Você é do caralho, gente fina, a melhor companhia do mundo, transa legal e por isso você deve ser nam... Não, não, amiga! Amigos pra sempre é o que nós devemos ser. Porra! Já vale virar madrinha dos filhos da galera? Acho melhor não.
Por isso e por milhares de outros exemplos, minhas guerreiras e futuros pretendentes, a partir de agora, nós queremos é pegar na mão, mas não na mão de qualquer um. Homens se manquem e se tornem interessantes o suficiente, por favor, e quando acontecer isso, não queiram ser nossos amigos. E outra coisa: não seremos mais as mulheres compreensivas e legais, companheiras de birita, que liberam a vida e o resto pra vocês, não usaremos mais maquiagem, nem nos pentearemos, seremos aquelas sem-sal que vocês adoram pegar na mão e mostrar pra mãe. Ah, companhia pra bar? Podem esquecer... Pararemos de beber!
Calma, nosso queridos e fiéis leitores, vocês já são nossos amigos, com vocês continuaremos normais, mas a próxima vítima, se prepare. Afinal, nós somos pra casar, PORRA!

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D.A.N.C.E

Por Moara Brasil

Como sempre...sempre tem um video que me mostram para derreter qualquer publicitário. Só que esse não se trata de um video publicitário, e sim um video de Justice. Trata-se de uma dupla de eletro francesa: Xavier de Rosnay e Gaspard Augé. Em junho de 2007 lançaram-se com o album Cross. Ficaram conhecidos pelo hit “Never be Alone”, mas o clipe que deu o que falar foi “D.A.N.C.E", ficou muito interessante o ritmo da musica, a letra que fala para você dançar seguindo o ritmo, é tão fácil como o ABC, sua forma de mover-se é misteriosa. Enquanto isso as animações vão passando dentro das camisetas de pessoas em movimento. Perfeito. Assistam. Mais videos do Justice no meu vodpod----> aqui do ladinho, só clicar. =]

[youtube=http://br.youtube.com/watch?v=fo_QVq2lGMs]


fonte: lastfm.com

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Ronalda

Por Sofia Brunetta

Ronalda é uma pessoa incomum. Personalidade de estrela, conhecida no conjunto. Um monte de gente acena para ela. Do alto de seu 1,56 ou 1,57, ela mantém o passo.
Vê o mundo a seu redor como uma grande oportunidade de encontrar um novo amor ou a patroa de seus sonhos. Sempre foi doméstica. Doméstica mesmo, que nunca viu alguém ser “secretária do lar” ou um destes termos modernos que não enchem o prato.
Todo dia ela acorda cedo e faz a sua caminhada: short de lycra, camisa do candidato, ela tem pressa de deixar as pernas firmes e ser feliz. Nesta hora é madame, senhora do seu destino, escolhe o seu caminho. A parada. 217,678. O 715 é sempre melhor pra arranjar namorado. Nunca pega o 456, seu ex e atual desafeto é o cobrador.
Arrependimentos? Só por ter tatuado o nome do pai de seu quarto filho no braço. ”Que nem a atriz.” Passada a febre de paixão, “Infeliz” seria mais apropriado.
Teimosa, ela decide por conta própria a arrumação de cada casa. Conta o caso. Ouve atenta. Arruma a bagunça, não limpa debaixo da geladeira. Dá azar. Estica o lençol com precisão matemática. Reclama de cambraia. Cobra a mais da patroa desavisada. “Pelo mau gosto!” Gosta de cetim de seda. Lembra da avó costurando o vestido de missa. Sua religião é pagar as contas. O Padre que reza o sermão é o que paga a melhor diária.
Ela é cientista. Sua alquimia deixa branco até a gola do patrão. Não existe batom que perdure. Rende um agrado, pelo bem das unhas, claro.
Quando sai à tardinha, já deixou a janta pronta. Cozinhou o que de melhor tinha. Ninguém deve guardar na despensa, não sabe se vai acordar vivo. Ela vive. Aumenta o volume, capricha no batom de uva. Folheia o catálogo da vizinha. Soutien, chinela, material de manicure. Boa idéia de novo negócio para os dias vagos. Cheios de planos.
Um dia ela vai ser rica. Dormir em lençol de cetim. Comprar uma sombrinha maior: “-Coisa de pobre, não de madame, né? Coloca aí: Uma sombrinha maior... e uns “homão” pra pisar encima e não molhar os pé.”

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Velhos sonhos

Por Moara Brasil

Estou nessa fase que desaprendi. Não sei mais demonstrar aquele meu interesse apressado, e dizer o quanto gosto desse seu jeito de falar. Uma voz assim: charmosa como esse olhar. Deves ganhar meninas inteligentes só num flerte, e quando te envolves numa boa conversa. Ganhas também as meninas bobinhas, que te admiram por esse ser gentleman. De abrir as portas do carro para suas queridas amadas, de falar até "obrigado" quando te destratam. Dessa vagorosidade nos teus movimentos, o tempo é apenas um detalhe.

Te vejo um dia velho, de óculos para as suas leituras interessantes, e apreciando aquele bom vinho importado, que eu não entendo nada. Mas com a dama mais feliz de todas as damas, essa teve sorte.

Não tens a beleza dos modelos de revista, mas tens a beleza por inteira, nada de vazia. Aquela que vem da alma, e embeleza a face, os cabelos, a boca, a voz, o olhar. Beleza com trilha sonora de cinema, dos melhores filmes da sétima arte. Daqueles que sacaneam com as paixões inesperadas: Antes do amanhecer.

Nessa modernidade, acreditar em amores assim é quase uma tarefa árdua e delicada. Solidez não existe mais. E esse meu medo de aproximar-se de ti, é esse medo dessa sociedade em que fui criada. Ela me ensinou a consumir a novidade, numa eterna busca pelo efêmero. Ensinou-me que assim tudo fica mais fácil, e que paixões frustradas podem ser substituidas por outras, num intervalo pequeno do tempo. Que para sobreviver, é preciso procurar sempre os lançamentos, só assim não somos retirados das prateleiras.

Mas essa sociedade moderna é muito cruel, essa rapidez só atropela aqueles sonhos de nossos queridos velhos. Então continuarei acreditando em ti, e ser uma nostálgica de boas épocas. Mesmo que tudo isso não passe de uma mera ilusão, dessa minha cabeça meio doente, mas com pequenas doses de esperança.

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Assim caminha Luiza

Por Moara Brasil

Luiza se entregou ao o que der e vier. Já não cuidava mais do seu cabelo como antes, deixou ficar selvagem, mas ela ainda continuava muito bonita, morena e com uma estrutura física de causar inveja à qualquer mulher e despertar o anseio de qualquer homem, um corpo parecido com o da Juliana Paes, mulher como popularmente denominam de "gostosa".

Ela colocava um short jeans, uma regata pink e aquelas plataformas de sempre quando resolvia aparecer para o mundo. Gostava de tudo o que a não fizesse refletir muito, por isso sempre curtia aquelas mesmas batidas, que davam para ela energia e movimento. Queria curtir a velocidade desse mundo contemporâneo, e como era bom correr contra o vento. Ela apreciava e provava a vida com todo o gosto. E assim ia consumindo com toda a leveza, como se o mundo estivesse voltando para um tempo em que ela não tinha vivido ainda. Porque ela queria viver mais, e abraçar tudo o que ela julgava inalcançavel para os seus olhos ainda de menina.

Era simples, pura leveza. Puro cigarro malboro na boca e trident no bolso. E quem não a entendesse, mandava um simples "ora vai pra merda e não enche...". Mastigando sempre aqueles chicletes. Adotou essa personalidade nas relações familiares e assim seguiu numa linha progressiva. Toda aquela personalidade que ela havia construido até chegar aos seus 20 anos já não era mais a que todo o pai deseja de um filho, os primeiros goles de cevada fizeram Luiza não ser mais incubada. E os pais tentavam buscar erros, e sempre justificados. Mas não havia explicação, foi simples, foi assim, de repente como um acidente, imprevisível. Decisão de Luiza.

Mas a menina tornou-se frágil, e não compreendia o porquê de se entregar tão gratuitamente para o mundo. Gostava de viver o momento. E cada dia como o último, como o último dia do calendário da agenda. Mas ela não tinha agenda, quanto mais calendário.

E tudo tornou-se bens de consumo não-duráveis. E sua vida tornou-se um grande ciclo de novidades.
Era melhor cultivar os amigos do momento, e quando se enjoava, descartava-os e considerava-os ultrapassados para o que ela necessitava, a cada hora, a cada minuto. Jogava-os na lixeira, sem direito à reciclagem. Foi Jorge, alto e corpo de atleta. Foi João, magro e inteligente. Foi Luan, cheio de olheiras, meio bipolar e rodeado de entorpecentes.

E como era fácil para Luiza comprar felicidades. Ela comprava e esnobava aqueles míseros reais que depositavam todo todo o mês no seu cartão visa. Porque o mais interessante era comprar ilusões, pílulas anti-depressivas, e grandes doses de felicidades.

Luiza era sonhadora, quando falava dos seus planos para o futuro, seus olhos se enchiam de grandeza e ingenuidade. Mas era só ela deixar o copo quebrar, lá naquela casa em que se hospedava, e voltava para a pista. Voltava com outra plataforma, fechava os olhos, e sempre deixava os cacos de vidro no canto da cozinha. E os cacos cresceram de quantidade, e feriram todas as partes daquele corpo saudável. Ela não sentia mais dor, e o bacana era colecionar cicatrizes.

E os dias corriam mais rápidos, mas de um jeito lento. Todos observavam Luiza, todos falavam Luiza. A sua fisionomia estava intragável. E já não desejavam mais a sua companhia. Seu corpo diminiu grandes quilos, estava doente. Luiza estava anestesiada. E no meio da pista, ela rasgou toda a regata. Gritou para os rapazes, xingou para si mesmo, pegou a mochila e saiu andando por aí sem aquela leveza de sempre, mas pesada e determinada à sair daquele lugar, caminhando para uma direção não mais progressiva...que só Deus sabe para onde.

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TPM - Tremenda Psicopatia Medonha

Por Anna Carla Ribeiro

Hoje eu levantei com o braço esquerdo. Uma ótima maneira de começar o dia! Um clima de montanha e sonhos gostosos brutamente interrompidos pelo baque do meu corpo no chão. A única coisa que conseguiu se mover foi o braço esquerdo, num movimento de flexão, ótimo exercício para ser realizado às seis da manhã.

Tudo bem, tudo bem... Nem tudo o que começa mal acaba mal. Só porque eu sinto cólica, não quero falar com ninguém e pareço uma atropelada antes mesmo de ir trabalhar não significa que a vida seja uma verdadeira porcaria. Não mesmo! E as criancinhas da Etiópia? E os velhinhos da Malásia? E toda a população aidética da África? Eles sim têm do que reclamar!

E então vou tranquilamente ao trabalho. O estado de espírito brando permanece até eu descobrir que a merda do celular novinho que eu comprei desliga a todo o momento e isso faz com que o meu relógio sempre esteja atrasado. E eu, uma mera mula empacada metida a moderninha e fissurada pela era digital, entrego o meu horário a este pobre aparelho infeliz. E então eu fervo meu sangue em banho-maria e piso no acelerador como quem esmaga uma bagana de cigarro. É justamente nessa hora que a porra do tio do Corolla da minha frente resolve comprar a rua e pára no sinal verde. Na bendita hora que eu mudo de faixa, o corno velho broxa do Corsa resolve observar a bela paisagem de prédios pichados e anda de tal maneira que até um cachorro perneta consegue ultrapassá-lo.

Finalmente chego ao meu querido local de trabalho. É só fechar o carro, atravessar a rua e dar bom dia aos seguranças pra começar a praticar as minhas atividades. Mas... Pera lá! Como assim o carro não quer fechar? Como assim todas as vezes que eu travo esse carro idiota com o alarme ele fecha e abre sozinho? Como assim o carro não quer fechar nem na chave? Como assim, meu Deus? Depois de meia hora de tentativas frustradas e idéias interessantes como queimar o carro com álcool e fósforo só pra o mandar parar de ser viado, eu finalmente mando-o se foder e decido deixar ele aberto mesmo. E sendo um automóvel muito figura, é justamente nessa hora que ele resolve fechar.

Tudo bem, tudo bem... Só porque eu acordei caindo da cama, estou extremamente dolorida, meus ovários estão pulando de tanta emoção por estarem funcionando direito depois de três longos meses de ócio preguiçoso, odeio o mundo, cheguei atrasada no trabalho porque meu celular e o meu carro possuem vontades próprias e ainda peguei uma chuvinha filé até finalmente chegar à minha sala não significa que as coisas não possam melhorar. Não mesmo! Quem merece reclamar são os maranhenses desabrigados pelas enchentes!

O engraçado dos dias como este é que Murphy se diverte. Eu não tenho saco nem de ler histórias em quadrinhos e nem de ouvir piada, mas passo a manhã inteira escrevendo sobre nefrologia. Uma beleza! Descubro que precisarei fazer hora extra, minha barriga ronca e eu sou ainda mais insuportável com fome. Vou ao caixa eletrônico tirar um dinheirinho pra comprar qualquer coisa que seja considerada comestível e que evite a minha ‘monstrificação’. “Problemas na identificação no cartão”. Tentativa número dois. “Problemas na identificação no cartão”. Tentativa número 39. “Problemas na identificação no cartão”.

Respiro fundo, repito mil vezes o mantra de Dalai Lama: “Eu não vou chutar este caixa porque quem vai se foder é o meu pé”. Vou à minha agência, já que é aqui perto, saber o que diabos aconteceu se esse cartão é novinho e quase não sai da minha carteira. Alguns minutos depois, me deparo com um ambiente em construção, onde todos os aposentados da Região Metropolitana de Belém pretendem entrar no Guinness Book como a maior fila indiana já existente em toda a história mundial. Vão barrar o velório de Lênin, tenho certeza! Eles inspiram poeira enquanto suam debaixo do braço. Eu também. O mais legal é saber o resultado de mais de duas horas na fila: um número de telefone pra solicitar a segunda via do cartão de débito que terei que pagar porque, segundo a atendente, eu devo ter feito alguma coisa pra que a porcaria do cartão vagabundo desse banco escroto tenha se desmagnetizado. “Eu devo ter passado entre as suas pregas, querida”, penso rápido. Segundos depois me acho um monstro por construir frases deste tipo.

Volto ao trabalho, onde continuo fazendo as minhas missões. Preciso fazer uma matéria às 16h num hotel no centro da cidade. São 16h e eu me encontro na periferia. São 16h10 e eu já estou com a minha bolsa no ombro quando aparece um médico gentil para fazer um exame clínico, desses que a gente faz quando entra numa empresa. Eu tento me esquivar, mas não dá, sou a única funcionária que ainda não passei por este procedimento e, se eu for embora, isso vai dar bronca mais tarde. Tá, tudo bem. Vai, tira a pressão, tira o sangue, tira o meu tempo, que já nem tenho mais. O quê?! O que significa esses potinhos?! O senhor quer me dizer que eu terei que fazer as minhas necessidades fisiológicas mirando nessa circunferência de cinco centímetros até amanhã?! É piada? Que dia é hoje?! Prolongaram o primeiro de abril?!

Depois de um certo resmungo da minha parte, o simpático médico me solta essa: “Vai com fé, vais ficar craque na mira”. Anram, meu sonho sempre foi ser campeã mundial de mirar cu no potinho de exame de fezes!

Estou a caminho do hotel. Nervosa pelo atraso. Bocas nervosas que devoram uma barra inteira de chocolate. Chego lá, uma chatice. Essa mulher nem me olhou na hora da entrevista. Eu sento na última cadeira da última fila. Ninguém me vê aqui não?! Eu sou invisível por acaso? Vocês estão me ignorando? Isso tudo é de propósito pra me fazer chorar e ter crises existenciais, é isso?!

Livre, graças a Deus. Agora é só ir embora pra casa, me esconder na minha toca e nunca mais sair de lá. Mas... Eu me sinto tão inchada! Eu comi muito! A consciência pesa mais que a dor de cabeça. É melhor ir malhar... Não, hoje não! Hoje eu não parei! Não parei de comer, isso sim. Epa, quem é essa no espelho? Será a mulher melancia em seu maior estilo blonde blondor? Meu Deus, porque eu pareço um búfalo de calça jeans? Eu odeio a mulher melancia. E odeio os búfalos.

Um, dois, três. Um, dois, três. Eu até que gosto de fazer exercícios, mas odeio malhar a bunda. Odeio bundas. Não entendo porque elas são tão importantes. Mas já que estou aqui, faço esse esforço. Um, dois, três. Em cada “um” eu odeio a vida, em cada “dois” eu odeio o mundo, em cada “três” eu odeio todo o espaço sideral e quero explodir a cidade.

Volto pra casa com a consciência mais leve. Finalmente chegarei à minha toca e farei tudo o que sempre quis: nada. Jogarei-me na cama para não ver ninguém, não falar com ninguém, não ser ninguém. O melhor momento do dia! Eu sabia! Uma hora tudo iria ficar nos trinques. Um, dois, três. Três minutos se passaram, mas que puta dia tedioso! Que merda de vida sem graça... O ruim de não ter ninguém, não falar com ninguém e não ser ninguém é não ter porque, nem como, e muito menos pra quem reclamar. Implicar então, a minha especialidade, nem se fala... Quer saber do que mais?! Essa história de ficar coçando o saco me dá uma puta de uma ansiedade. E essa história de ficar ansiosa me dá uma puta de uma fome.

Mas eu não vou comer porque eu odeio a mulher melancia. Vou começar a seguir a minha meta do ano em que entrei na faculdade. Vou ler todas as notícias do jornal de cabo a rabo pra ser uma jornalista mais fodassa que o Zuenir Ventura. Um, dois, três. Três linhas da primeira matéria e... Que vontade de comer uma lasanha de frango! Porra pára de pensar besteira, garota! Concentra-te! Tá, as forças de segurança iraquianas libertaram 42 estudantes seqüestrados poucas horas antes por homens armados em Mossul e como é mesmo que se faz lasanha de frango?! Desisto de ser melhor que o Zuenir. A grande diferença entre nós dois é que eu leio as notícias do mundo pensando em lasanha de frango enquanto o Zuenir come lasanha de frango pensando nas notícias do mundo. Simples assim.

E só porque eu sou realmente uma piada, devoro o triplo de calorias que perdi na academia por conta de uma lasanha enóóórme de frango (com bacon e presunto). Mulher melancia em ação outra vez...

Mas... E os velhinhos do asilo?! E os sobreviventes do Iraque?! E os mutilados do Vietnã?! QUE VÃO TOMAR NO OLHO DO CUUUUUUUUUUUU, seus animais...

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Hoje correndo atrás do amanhã e depois.

*refrão de música escrita por Jorge Du Peixe.
Por Lucas Paolelli (nosso querido convidado e grande amigo das ohvarias)

5:54 da manhã de quarta-feira. Pouco mais de duas horas atrás, eu tinha acordado todo descangotado no sofá e não consegui dormir mais. Tentei de tudo. Vi o final de um filme na Sessão de Gala. Depois tentei deitar, mas nada de o sono voltar. Rolava de um lado para o outro da cama, sem relaxar. Eu estava agoniado, tenso, cabreiro, aceso. Aliás, é como eu tenho me sentido nos últimos tempos. Amanheci em frente ao computador, ajustando o AC Nicotime (meu time virtual) e ouvindo Tomorrow Never Knows, clássica canção de um certo quarteto de Liverpool (cujo título, por ironia do destino, veio muito bem a calhar).

Meu momento atual é difícil. Para um cara que sempre procurou levar a vida baseando-se em certezas, estou todo baratinado ao ter que me acostumar com as interrogações que a vida tem esfregado nos meus olhos. Em qualquer assunto que eu me recordo, pensamentos e conceitos do passado entraram ou estão entrando em choque com o que penso do que será do futuro, seja em comportamento, na carreira profissional que escolhi e pretendo construir, e até mesmo nas relações de amor ou de amizade.

Antes que surja um comentário ou trocadilho imbecil se reportando ao final do parágrafo anterior, ou mesmo atribuindo, a mim, um estado de crise existencial, faço questão de dizer que, apesar do meu ponto de vista (digamos) quadrado, acho que crise existencial é coisa de baitola, e portanto, nada tem a ver com a essência áspera feito lixa deste ícone da virilidade que vos escreve (ou ao menos tenta).

De uma personalidade radical, tudo aquilo que nela eu agreguei, ao longo dos meus 25 verões, foi fincado, em grande parte, no que eu sempre acreditei ser certo e no que eu achava melhor pra mim. Entretanto, mais do que as rugas e os fios de cabelos brancos que aparecem (e crescem de uma forma totalmente diferente do resto do cabelo), o passar dos anos tem me proporcionado, até mais importantes do que os momentos de felicidade, as frustrações. As porradas que a vida me deu fez com que grande parte das minhas certezas, de repente e sem dó nem piedade, ruíssem.

Eu era um cara aiatolá, extremo. Somente prestava ser como eu era. Somente era legal o que ou quem tinha a ver com isso. Eu repudiava os tipos cagão/playboy ou rastafaráaai-malandrinha, as babaquices desses tipos estrupícios me deixavam irado. Jamais ia à boate mais badalada do momento, dessas que viram notícia dominical de jornal impresso. Sentia ânsia de vômito diante do pop gritante, e golfava diante do alternativo rasgado. Escutava somente rock, e tudo o que não fosse rock simplesmente era “zuada”. Alguns desses exemplos demonstram os meus gostos estranhos e minha postura rígida. Eu era o normal (e era normal quem compactuasse com isso). Os estranhos eram os que faziam parte da maioria, por serem complacentes com tava imbecilidade. Ainda bem que esses tempos de percepção limitada já ficaram lá atrás ...

De uns tempos pra cá, foi natural e bombástico compreender essa visão curta fez com que eu me privasse de viver muitas coisas bacanas, de me relacionar com um monte de pessoas, de me fechar perante a diversidade e abrangência que o mundo tem para me oferecer. O meu ode ao incomum, ao esdrúxulo e às minorias tenderia a restringir os meus caminhos (para não usar uma expressão mais incisiva usando o verbo alijar). O prejudicado fui eu, pela inflexibilidade, pois no final das contas, EU seria o estranho, e A MAIORIA seria normal. Custava ser um pouco mais normal, e viver um pouco mais em acordo com a “normalidade da maioria”? Ao menos eu teria vivenciado experiências mais diversas, e me privado menos da mesmice.

Mas esse semancol que brevemente tentei relatar, até que não foi dos mais traumáticos.

O curso de nível superior que eu escolhi estudar e exercer profissionalmente exige retidão e formalidade. Tais atributos colidiram de frente com o jeito que, lá atrás, eu tinha. Eu, como todo bom rebelde que se preze, por teimosia e imaturidade, planejei remar contra a maré. Ledo engano.

Foi aí que a própria carreira me deu várias “mijadas”, pra apontar o dedo na minha cara e dar o seu recado: ser reacionário contra a imagem do profissional do Direito, aquela de moldes rígidos e quase intocados, traçados desde os primórdios desse segmento profissional, poderia resultar numa dificuldade a mais para mim, na carreira que eu pretendi seguir dentre as tantas que a formação jurídica oferece. Passei a reconhecer que não dá usar com o cabelo desgrenhado, roupa mulambenta, barba por fazer, ou tênis “excêntricos” toda a vez que der na telha, ou mesmo abusar de palavrões ou gírias durante uma conversa. Por mais que eu não concorde, infelizmente é assim que as coisas funcionam.

Pode parecer, pros outros, mediocridade, conformismo, ou até mesmo falsa humildade, sei lá. Frise-se, eu nunca fiz questão de ser o melhor, ou objeto da reverência alheia. Sempre quis ser bom e útil para quem eu esteja representando, independentemente de ser o ladrão de galinhas ou a União.

Entretanto, nessa carreira, infelizmente, prevalece muito mais aquilo que os colegas enxergam na(ou da) gente, a despeito daquilo que somos de verdade: ou eu danço conforme a música para ser reconhecido como bom, ou então, sou alijado do sistema e tachado de bizarro (mesmo que eu seja um dos mais brilhantes). Não posso ser escroto o bastante para ser do jeito que quero, mas se eu entrar na coreografia, corro o risco de ser apenas mais um dentre os milhares. Em determinados momentos, por questão de política profissional, serei obrigado a fazer uso da famosa “capa”, apesar de ser convicto de que tal artifício é algo repugnante. Eis um dos dilemas cuja dosagem ideal eu ainda vou perder muitos cabelos até encontrar. Afirmo com toda a certeza que, no campo profissional, as minhas constatações foram das mais chocantes e brochantes que eu tive nessas épocas.

Finalmente, o amor. Ah, o amor... o “quesito” que é, sempre foi, e sempre vai ser o mais embaraçoso de se entender, principalmente pra mim. O sentimento mais carregado de emoção, que sempre aparece para desmontar a fortaleza de certeza e razão que eu tento erguer como meu escudo. Prescindível é, a essa altura, ficar detalhando meu histórico amoroso com as mulheres (que não foram tantas) que fizeram parte da minha vida, muito menos esmiuçando cada relacionamento. A cagada é quando a gente lida com pessoas diferentes, e se apercebe de como as pessoas são complicadas, os relacionamentos são enrolados, tudo por causa da emoção e do sentimento. Essa dupla é pós-graduada em desmoronamento de razão.

Sempre na fossa, geralmente após ter tomado uns gorós e ter falado merda até não querer mais, o encostar da cabeça no travesseiro traz a tristeza. Como já foi dito lá atrás, das frustrações e dos reveses é que brotam os aprendizados. A pessoa que parece muito com a gente quase sempre não é a certa. E aquela de características opostas? Os opostos se atraem? Pura conversa fiada ! Aí é que não dá mesmo ! E por quê então é que tentamos? Simples: porque somos imbecis, e achamos que pode dar certo pensando com o coração. Olha aí a emoção novamente causando destruição.

Deu pra perceber que o amor, por mais forte e puro que seja declarado, é um sentimento podado por vários outros fatores, como amor próprio, egoísmo, diferenças. Portanto, nem sempre o fato de duas pessoas que se gostam demais vão resultar na melhor e mais inesquecível das relações. Ou por outro lado, até mesmo aquele relacionamento que começa despretensioso, sem aquele amor latente e derretido, mas que começa pautado no respeito às diferenças, a individualidade e ao amor próprio de cada um, esse sim, tem muito mais chances de se prolongar em harmonia. Mas, nessa hipótese, falamos mesmo do amor ? Ou seria uma espécie de relacionamento-de-conveniência-com_espasmos-de-carinho? Puta que o pariu, melhor nem pensar ! Enfim, algumas dessas “premissas” ainda não verdades absolutas pra mim, até porquê eu não consigo explicar como é possível que, e certos casos, é melhor que duas pessoas que, embora se amem muito, não fiquem juntas. Ou então, que a garota bonita, bem-humorada, inteligente, de bons gostos e bem resolvida profissionalmente possa chegar a amar um merda de um cara que não quer porra nenhuma com a vida, que não acrescenta nada pra ninguém, tem bafo e ainda é odiado por todos que gostam daquela. Ah, o amor ... cheio dessas ciladas !

São tantas perguntas sem resposta, tantas hipóteses, tantos caminhos a serem seguidos, cada um podendo ocasionar as mais diversas consequências. Os exemplos dados aqui podem parecer besteira – embora a música fale que besteira é coisa séria, é preciso com ela filosofar –, mas servem para dar um esboço de tudo que vivemos (nos) interrogando, ou de tantas certezas que fingimos que temos.

Mesmo assim, sinto que cresci. Hoje, ainda não o suficiente para ter a maioria das respostas que quero. Mas cresci ao menos a ponto de perceber o quanto o que eu perdi, o quanto de merda eu pensei, o quanto de coisas que eu vou ter que refazer e ainda o tanto de coisas que ainda tenho pra aprender, mesmo que seja na marra. Cresci, pelo menos, ao ponto de questionar minhas certezas de outrora, e de colocá-las em xeque.

Na vida, poderemos ser nós mesmos sempre, mas sempre lembrando que há os outros que nos rodeiam. Compreendi que não temos direito de impor nada a ninguém, nem sucumbir às imposições de outrem, bastando encará-las como opiniões, por mais diferentes que elas sejam. Comecei a entender aquilo o que a minha mãe sempre quis me dizer com o indefectível “temos que respeitar as diferenças”, e comecei a levantar essa bandeira não mais da boca pra fora. Não podemos virar de costas para o mundo com um ar de “foda-se”, pois dependemos de tudo e de todos, por mais ínfima que essa relação de dependência possa ser. Que muito daquilo que somos não se liga exclusivamente ao que queremos ser, mas também, de como moldamos nossa imagem, partindo de como pretendemos que os outros nos vejam.

Como diz o bordão, viver é um constante aprendizado. O que eu fui ontem, o que sou hoje e o que eu serei amanhã? Esse a partir desse conflito que brotam todos os outros questionamentos que surgem pra mim. Justamente por não saber as respostas, todas essas incertezas é que me causam tanta tensão, e às vezes, não me deixam dormir. O que serei amanhã vai depender das respostas que eu ache, de como vou equacionar o que eu QUERO ser e o que eu DEVO ser.

Ao menos, as primeiras conclusões eu já tenho. Sentar num bar e enfiar trocentos copos de cerveja goela abaixo para “esquecer de tudo”, além de não aliviar a agonia, ainda corrói o fígado. Em vez de encher a lataria, é até melhor chorar. Deixar escorrer umas lágrimas, não só por tristeza ou raiva, não é vergonha pra ninguém (sim, os viris também choram!). Chorar de felicidade, chorar por comoção, ou por qualquer motivo que seja faz (e muito) bem! Às vezes, uma lágrima e uma expressão facial traduz uma carga emotiva muito mais sincera do que mil palavras. O choro decorrente de um filme de drama pode fazer tão bem, ser tão descongestionante quando aquele que acontece pela simples constatação de que não estou preparado suficientemente para o turbilhão que anda pesando sobre as minhas costas. É... as lágrimas da incerteza e da fragilidade também fazem bem que só, aliviam, e isso eu só tive o prazer de constatar de pouco tempo pra cá

Mas isso ainda é pouco. Torço para conseguir achar as respostas rápido. Sob pena de ter outra iniciativa tosca de gerar um documento de Word relatando as minhas viagens pessoais para encher o saco alheio. Ou sob pena de ficar com olheiras estilo Ray Ban por continuar acordando às três e pouco da manhã, e no final, ainda enjoar de Tomorrow never knows ...

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Não!

Por Lora Cirino

Eu, mais do que muita gente, sei o que é saudade, sei o que é ter as pessoas espalhadas por aí. Dor de falta de presença física dói esquisito, dói lá dentro, dá angústia, aperto.
Então eu te digo que, quando for a sua vez eu nem sei, o mundo vai virar de ponta cabeça e nós vamos continuar cantando que "quem tá na chuva é pra se molhar...", minha mãe vai continuar obrigando a gente a almoçar separado pra comida não esfriar, tu vais continuar implicando com meu cigarro e minha cerveja, e dizendo que só vai comprar refri ou frango assado se eu for junto, na cozinha eu vou continuar sendo a Ofélia e tu a Neiva, no dia que precisar ficaremos sentadinhos em alguma repartição para que minha mãe possa vender jóias, vais permanecer dando "tapa de colher" na minha testa, em todas as páscoas e carnavais vais tentar me convencer a ir pro retiro contigo, e, é claro, me expulsarás do computador usando teu dom para o "mau" e tocarás instrumentos irritantes de sopro no meu ouvido e eternamente, tentarei fazer com que tu sejas fashion, e eternamente, mesmo tu não sendo, vou deixar que tu escolhas se a minha roupa está adequada ou não e eu a tua.

O melhor músico-irmão que eu poderia escolher, ganhei de presente dos meus pais.
É ele, o mais importante. O Henrique que dará seu nome ao seu afilhado, meu primeiro filho (no dia que vier).

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E a ohvaria do mês é Mallu Magalhães. Palmas pra ela!

Por Moara Brasil

Faz tempo que eu não vejo TV, e ontem, deitada no sofá, acordei com a voz de Mallu Magalhães numa entrevista no “Jô Soares” e confesso que fiquei “bege”. Achei que o folk estava dormindo por alguma calçada velha, ainda mais aqui no Brasil. Mas parece que esse estilo de música ressurgiu na voz de Mallu, e vai agradar a todos que apreciam esse gênero musical, que teve suas origens lá pela década de 60 em território norte-americano. Essa “pirralha” de 15 anos, que mais parece ter 12, pelo jeito muito imaturo e inseguro de falar sobre si mesma e “gaguejando”, tem a voz suave e um estilo de cantar que lembra um pouco “Joan Baez” ( até o lenço que ela coloca em volta do pescoço ) mas claro, com uma voz suave de menina na adolescência. Ela é dessa geração de talentos que aprendem tudo sobre o mundo pela internet, e eu acho uma maravilha, já nem me assusto tanto pelo talento precoce, mas fico feliz pela publicidade que ela está tendo em várias mídias. Gravou algumas vinhetas pela MTV, e entrevistas sobre ela correm por vários sites na internet.
E o melhor: afirmou gostar de Vanguart e Bob Dylan, Elvis, Johnny Cash, Beatles...Bora ver se essa menina resiste com todo esse carisma e talento por aí pelo mundo....

Assistam a entrevista do Jô:






E cantando "Xylophones" no Poploaded do iG:




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Conto de um amor sem economia

Por Anna Carla Ribeiro*

Eles se encontraram na sala de reclamações de uma operadora de celular. Ele forçando a sua mais nova aquisição, os pés de galinha, através de expressões grosseiras. Ela aparentava ter bebido todas no dia anterior, ou no mínimo, estava com problemas de insônia. Depois das duas intermináveis horas de pura discussão é que os dois perceberam a presença um do outro.

Ela era só uma pré-adulta que chamava atenção pela altura e a silhueta fina, igual a dez milhões que ele já vira nas esquinas em que passava, pelo menos foi o que ele pensou nos primeiros momentos. Mas não, quando ela finalmente pareceu acordar e levantou os olhos, ele avistou algo inusitado. Aquelas sobrancelhas...

Ela, apesar da sonolência e mau humor, já admirava ele de longe. Sempre sentiu atração por homens um pouco mais velhos, quando tinham o cabelo na altura do ombro então...

De lá pra um cafezinho na padaria da esquina foi “num tapa”.

Ele era economista. Enchia a boca pra falar dos maiores problemas da economia do país, da gripe do frango, de políticas públicas e de Lula e Delúbio. Ela só sabia que Delúbio rimava com Danúbio, um rio que corta Budapeste (aprendeu através da sua última leitura, é sempre bom ler Chico Buarque...).

Ela estudava letras e fazia teatro. Falava de livros, cinema, música, yoga. Sabia recitar todos os poemas de Manuel Antônio Álvares de Azevedo, o seu preferido. Ele, coitado, só sabia que esse tal de Álvaro era meio tãn-tãn (pelo menos foi o que lhe contaram quando ainda estava no colégio).

Mais interessante impossível. A cada minuto os dois se impressionavam mais com tamanho entusiasmo. Os olhos brilhavam, as bocas tremiam, as covinhas do rosto faziam ginástica. Ah, aquelas sobrancelhas...

Começaram a namorar lá mesmo, na padaria capenga da esquina. Depois de um tempo, ele costumava dizer que aquele romance era o PIB da sua vida. Ela dizia que os dois juntos era de inspirar Quintana a fazer o melhor poema já escrito pela humanidade.

No dia do casamento, ela lhe deu de presente uma carta em prosa, ele retribuiu, dando a ela um planejamento de custos e benefícios para o financiamento da casa nova.

Era um câmbio de experiências mais interessante do que qualquer Vladmir Maiakowski. Através da divisão de renda deu pra fazer um pé de meia. Na cama, os seus corpos rimavam como versos brancos. Do tremendo esforço físico lucravam de prazer mais do que o Banco Internacional. E todos os dias aquela brasa fazia com que o mais meloso escrito de Shakespeare parecesse racional, era paixão com uma altíssima inflação.

Com o tempo, é claro, os cabelos grudados no box e as meias sujas em cima da cama fizeram com que algumas brigas aumentassem como os juros do país. Nada que um perdão vassalo não resolvesse. E mesmo nas dificuldades, eles nunca deixaram que aquele sentimento virasse déficit.

Ela sempre sussurrava no ouvido dele que aquele amor era mais belo do que todos os 8816 versos decassílabos de Camões. Ele costumava dizer que esse foi o melhor investimento já feito em vida.

Ah, aquelas sobrancelhas...

*Texto publicado em 19 de março de 2006.

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