(Além do que se vê) os meus tantos poucos anos

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"O amor, ah, o amor: eu quero porque quero da vida"


Oswald de Andrade


 


 


Ouvir “eu te amo”. Dizer “eu te amo”. Falar “ou vai ou fica”. Ficar só. Chorar no escuro. Chorar por dentro, sem uma lágrima. Dormir ouvindo Chico. Contar estrelas na beira da praia. “One, two, three, floor” com tequila. Amnésia alcoólica. A dor de partir. A dor de ver partir. Saudades da infância. O sonho da escadaria e eu caindo, caindo. O sonho do carro desgovernado. A luxúria, ah, a luxúria. Tua mão me tocando em lugares públicos. A voz dele ao telefone, tão igual há tanto tempo. O nascer do sol numa beira de rio. O calor obsceno no carro e a terra avermelhada na lembrança. Aqueles óculos com lentes alaranjadas. Praia, areia fofa infiltrando-se pelos dedos dos pés a cada passo. A um passo desse tal paraíso de tantas cores. Lisergia num universo paralelo que só cruzava para nós. A chuva de folhas. A chuva com gotas grossas, doloridas na pele. Os pés calejados, a alma mais ainda. Traições, mentiras, promessas e partidas. Será que você sabe que construo diálogos e situações à distância? Acho que sou louca, ou tô pirando. Ah, falta-me fôlego para tanta luxúria. Banho de mar de topless. Gozar. Gozar a vida. Gozar dos outros. Gozar de si. Fazer amigos. Desfazer prejuízos. Reconstruir. Fazer aniversário. Não ver sentido em viver. Acordar querendo dormir ainda. Dormir. Dormir mais. Comer. Comer muito, compulsivamente. Sofrer sorrindo. Ménage a trois. Beijar aquela boca. Ah, que bocas, que olhos, quantas pernas. Os raios solares incomodando. Óculos escuros para disfarçar olhar de quem tem a alma iluminada existem? Músicas novas, novas sensações. Novas pessoas. Pessoas antigas renovadas. Sofrer, ah como dói no peito sofrer. Amar. Existe amar demais e amar de menos? É possível voltar atrás depois de dito “eu te amo”? É... eu descobri que é, porque deixei de amá-lo. Ou nunca amei. Sei lá. Deve ter doído. Cantar Beatles em cima da mesa. Sentir o vento frio na cara, cortante. Ligar de madrugada. Ficar na vontade, no desejo, na lembrança. Ler. Reler. Nascer. Morrer só um pouquinho todo dia até morrer um montão de uma vez só. E por isso renascer a cada queda e nascer puro a cada encanto. Reviver. Esquecer, apagar ou rabiscar. Tanto faz, o importante é deixar para trás. Recortar e colorir. Cheirar cada parte do teu corpo e lembrar-se de ti enfiando a cara no meu travesseiro e respirando forte. Insegurança no café da manhã e arrogância no jantar. Duas gotas de coragem no café preto e um cigarro forte para inspirar. Respirar fundo e ter plena consciência de que não importa o que a aconteça. O normal é que acontecerá tudo de novo, se Deus quiser.

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25 de dezembro

“You should be stronger than me” toca agora e eu só posso me sentir tão deprimida quanto a Amy ou achar que no fundo eu sei o que ela sentiu. A gente tem esse lance de se identificar com as celebridades quando elas estão no lixo ou quando são o próprio lixo, como eu agora.
É noite de natal, são 2:46 h da manhã e metade da população da cidade está dentro de algum antro tentando perverter-se mais um pouco nesse ano e eu não. Eu preferi um tarja preta, filme água com açúcar e esperança. Esperei dar 2:30 h para poder te abraçar e sentir o teu perfume forte e respirar fundo, aspirá-lo todo para dentro em cinco segundos e guardá-lo, para poder sentar nessa cadeira e escrever o que nunca vais ler porque nada do que quero dizer-te interessa. Nem a mim, nem a ti. A gente já não se interessa mais. É por isso que te desejo um feliz natal assim, meio como se dissesse “olha, vai chover”. É para dar um ar casualidade a dor. Fica tão blasé.
Uma coisa ninguém pode negar. Você finge que não me odeia direitinho e eu finjo que não te amo a ponto de quase me convencer.
Até o nosso próximo fim, no próximo natal.
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Sobre o Karma dos livros

Últimos dias de 2008 – Século XXI
- Égua, é muito bom comprar livros, né?
- É...
- Melhor ainda é ganhar. Nossa, ganhar é surreal. Imagina você que a pessoa que quer te presentear passou tempos olhando e folheando diversos livros até encontrar o que se encaixa a sua personalidade.
- Isso!
- Ai, amiga... Deixa eu te dar um abraço?
- hahahahahaha. Por quê?
- Porque eu sinto exatamente isso.

Um dia qualquer do ano de 1992 – Século XX
Escola de Primeiro Grau São Jerônimo. Aprendi a escrever com essa letra redondinha lá. Toda sexta-feira era o “dia da leitura”. Na praça central do colégio eram colocadas mesas enormes de madeira com livros que ficavam lá,  a revelia do nosso imaginário. Não era permitido levá-los para o parquinho, rasgar, rabiscar, derramar lanche em cima ou danificar de qualquer outra forma. Assim era repetido de cinco em cinco minutos na rádio interna do colégio.
Eu costumava investir os míseros 30 minutos que compunham meu recreio na avaliação e eleição de qual livro tinha um harmonioso conjunto que combinasse título interessante, enredo, desenhos legais e aparentasse ter um final surpreendente. Sempre indecisa, sempre.
Foi assim nos últimos minutos do intervalo de um dia qualquer que roubei “O Grilo Mágico”. Tudo nele me agradara. Era quase um milagre, um livro iluminado. A textura (e até o cheiro), as ilustrações de aquarela, os traços finos das fontes e claro, a história em si que era mágica como tudo que uma criança quer.
Aquele livro tinha que me pertencer e voltei para sala de aula apertando-o contra o peito, coração palpitando, o estômago em chamas sendo consumido pelo espírito de fora-da-lei e as bochechas coradas de criança gorda envergonhada.
Da escola, levei para casa. Durante dias mudava o livro de lugar com medo de ter que prestar explicações sobre o que era aquilo, de onde surgira este livro, como eu pudera cometer tal ato – desde pequenininha apresentando sérias tendências a tornar-me uma bela personagem neurótica de Woody Allen – e eu moía e remoia a idéia de que descobririam meu roubo, eu seria pega, desvendada e simplesmente teria que devolver “O meu grilo” à Direção do colégio e ainda levar o título de ladra, de usurpadora. Panic at library!
Os anos passaram, mudei de colégio e o livro ficou. Foi incorporado a minha prateleira como um livro qualquer. Mas de longe eu via o meu, somente meu dirty little secret.
A culpa só passou quando tempos depois numa dessas mudanças na qual você se vê obrigado fazer uma grande faxina geral (na sua vida), encaixotar todos seus pertences e é quando baixa o maior espírito Dalai Lama de Calcutá; eu repassei “O grilo mágico”, juntamente com mais outros livros didáticos, para crianças do interior do Estado.
Como eu nunca tinha percebido isso? Talvez porque nunca tivesse realmente precisado saber. Em virtude de ser mais velha, era meu irmão quem acabava por herdar meus livros já que boa parte da vida, nós estudamos em mesmos colégios. Para ele, isso era bom. Os livros alcançavam a mão dele ainda utilizáveis. Creio que se a realidade fosse inversa, eu não teria livros e sim, lixo tóxico encadernado.
Esse é o destino dos livros. Sem nhem nhem nhem de Secretaria da Educação, nem nada. Tô falando de karma, de energia, de dever na Terra. Cíclico, como a própria vida. O conhecimento, a lição, a aventura literária (ou matemática, ou geográfica, que seja...) seguindo mares e pares e lares nunca d'antes visitados.

21 de dezembro de 2008.
Quando a Mayra, em meio a uma livraria, exclamou para mim o quanto ela achava ganhar livros algo do caralho, eu só queria mesmo era abraçá-la. Isso sim é sintonia.
Faz parte dos pequenos prazeres da vida aquela sensação deliciosa que lhe atinge quando você lê algo que te emociona de qualquer forma e que subitamente lhe remete a algo ou alguém e vem aquele ímpeto de dividir um trecho, uma frase, um personagem com uma pessoa em particular.
Uma vez peguei da estante de minha mãe um livro chamado “A Festa”, de Ivan Ângelo, por conta de Caio Fernando Abreu tê-lo citado na apresentação de algum livro. Assim que folheei aquelas primeiras páginas, deparei-me com uma dedicatória de meu pai para minha mãe, que terminava assim: “... beijos amorosos meus, da nossa Carol e do nosso filho que está por vir”.
É nessa hora que eu conto para vocês que meus pais são separados há bem mais de 10 anos e meu irmão, que hoje tem 23, mora fora de Belém há dois anos. Não o vejo há esse tanto de tempo. Ler aquelas palavras foi como montar um quebra-cabeça, resgatar um pedacinho da história de cada um de nós quatro e relembrar que por mais que haja a vida que é estranha e haja a distância (física e emocional), somos e sempre seremos partes de um todo. Não tem como fugir disso.
Numa partida já deixei livros com pessoas queridas porque queria muito, muito que ambas tivessem algo meu: “A hora da estrela” (C. Lispector) e “Memórias de minhas putas tristes” (Gabriel Garcia Marquez). O livro de Clarice eu já havia lido pelo menos duas vezes, tornando assim Macabéa uma personagem viva na minha memória e que por vezes divagando em rodoviárias e centros comerciais eu conseguia de fato personificá-la na figura de caras estranhas e amedrontadas que cruzavam comigo.
Já o livro de Garcia Marquez eu já havia ganhado nessa mesma situação sob a qual eu o repassava, de alguém que partia. Então o passei a frente, como passos que gente dá para avançar: um a frente do outro.
Adoro a coleção sobre Filosofia Antiga que ganhei do meu pai. Confesso que só me foram úteis nos dois primeiros anos da faculdade. Mas eles conferem uma importância tão grande à minha prateleira: são sóbrios, com capas duras escuras, letras douradas e arabescos em cor de vinho. São livros  com cara mesmo de herança. Em meio aos meus livros de capas modernas e coloridas, são eles que impõem respeito e destacam-se.
Como eu poderia explicar para minha amiga que Caio Fernando Abreu é intenso, é sujo, é espiritual e sexual... Como? Eu comprei “Pedras de Calcutá” e antes mesmo de abrir a primeira página, emprestei a ela porque eu simplesmente precisava que ela soubesse sobre o que eu tanto falava.
Da mesma forma que só fui entender o que outra amiga minha queria dizer com “...nessa fase da minha só tenho amores a la Bukowski” depois de ler “Numa fria”. Era exatamente o que eu pensava: sexo casual resultante de bebedeiras homéricas e desapego, muito desapego a qualquer relação. Solidão existencial.
Não há outro jeito de dividir a emoção da leitura senão fazendo com que o livro corra por entre mãos eleitas. Não seria a mesma coisa se eu passasse horas e horas falando sobre o livro e fazendo mil e uma citações. É como pedir que alguém se emocione o mesmo que você vendo uma foto que você tirou de uma escultura no Louvre ou sei lá, em algum lugar muito fodástico para a mente e para a alma. Você só vai ter uma imagem e nada mais. O felling é único, não é repassado com o flash.
As histórias são sempre mais legais nos livros do que nos filmes. Dedicatórias em livros são sempre muito mais sensíveis, tocantes e perenes do que cartões com mensagens clichês e cheias de purpurina. Ler é muito melhor que ver televisão – pelo menos canal aberto – na maior parte do tempo.
Tenho meus grandes orgulhos de presente, como “Mamirauá” do Thiago de Mello e Luiz Cláudio Marigo – o qual me foi dado pelo próprio Thiago de Mello em 2003, num seminário que eu trabalhei e que rende uma crônica que com certeza viraria um capítulo na história da minha vida - e “Morangos Mofados” do Caio F., que ganhei de um ex-namorado. Nenhum dos dois livros eu dou, empresto ou deixo fotografar. São my precious, meus “grilos mágicos”. Um dia eles cumprirão seus ciclos e percorrerão outras mãos.
Não tenho como descrever que as mangueiras em frente à Estação das Docas são totalmente “Tim Burton” se você não estiver ligado no “Estranho Mundo de Jack” e é para isso que mando e mails com links das coisas mais variadas, toscas e legais possíveis. É só porque eu não posso estar com todos que eu gostaria em tempo real todo dia, conversando ou contando sobre como eu achei maravilhoso saber que o tal Tim irá dirigir “Alice no País das Maravilhas”.
É como a Mayra me ligar da casa número 1 do Quai de Bourbon, por causa de Camille Claudel, Rodin, Caio F. e uma promessa que fizemos a nós mesmas de tomar um dia um café  à beira do Sena. Sem deslumbres, apenas idealizações de vida adquiridas por meio de tudo de cultura que compartilhamos um com a outra.
Porra, dar um livro que eu já li é quase um convite a conhecer-me, a permanecer na minha vida ou quiçá um pedido, quase um sussurro de “não me esqueça”. O livro vai com as minhas marcações, minhas anotações que vão de encontro as divagações do imaginário de quem recebe e sobre quando, onde e como eu folheei tais páginas. É mágico, que nem o grilo. A meu ver, é realmente um presente, no amplo sentido da palavra.
Um dos meus livros queridos – que não dou, não empresto e nem pensar em fotografar – é bem quisto por isso, por eu ter sido sua segunda dona. Na verdade, sabe Deus quantas histórias esse livro tem pra contar que estão além de suas páginas pois ele foi comprado num sebo.
a634b74d920f266235d5a1a0ffd677b2e689c0bc_mSó sei que é melhor que qualquer terapia, qualquer antidepressivo. É energia pura e das boas. É kármico!

12:32 h – 22 de dezembro de 2008.
Notas adicionais:
Fome!
Estado emocional: leve
Cuca: legal

Você tem algum livro para indicar ou dar hoje? Aproveita!

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Balanço 2008

Esta é a época de divulgar o balanço dos últimos doze meses. Da Federação Internacional das Indústrias até a peixaria do seu Zé, todos acabam trocando um momento de distração por lápis, bloquinho de contas e calculadora. Até mesmo os mais desorganizados e desprendidos desse costume tiram uns minutinhos para avaliar o saldo do ano que vai embora. Se positivo, enchem a cara no dia para comemorar. Se negativo, compram uma grade para afogar as mágoas.


 


        Quanto a mim, posso dizer que reclamei. Foi um ano de muitos protestos, teorias e reflexões sobre a vida. Momentos de revolta, pouca tristeza, mas muita inquietude. Foi o ano que o desespero chegou, “quero tudo: dinheiro, emprego legal, tempo pra descontrair com os amigos, vida amorosa estável, baladas de sábado com a roupa da vitrine, ajudar os velhinhos desabrigados, estudar outra língua, visitar um lugar diferente, conhecer pessoas novas, viver, viver, viver”.


 


        Tinha uma sede incontrolável ao pote, por isso batia o pé, eu queria tudo, e queria já, agora, rápido que time is money, is honey, is one day more close to death. Passei o ano com o coração agoniado. Eu queria correr, subir todos os degraus, ter histórias pra contar. Dei uma de mimada e ponto. Por ironia, quanto mais rápido eu me articulava, mais me sentia presa, empacada.


 


        Comecei por sair quase todos os dias da semana. Eu tinha dinheiro, um emprego que adorava, o que não me fazia perder a responsabilidade e me tirava a dor na consciência. Entre uma cerveja e outra, conheci pessoas novas, aprofundei antigas amizades e ouvi histórias surreais. Eu tinha a sensação de cada vez mais conhecer a vida de perto, apesar de viver a minha de longe.


 


        Foram momentos felizes e inesquecíveis que, sem dúvida, me fizeram crescer. Mas era preciso arranjar alguma fórmula mágica pra tentar apagar essa ansiedade maluca que eu tinha de sempre querer mais e não ter paciência de esperar a concretização dos meus sonhos.


 


        Pois então que sai de mim e tomei certas atitudes que não considerava do meu feitio. Nada grave, aos olhos de outrem. Me perdi pra poder me achar depois. Procurei em rezas, livros e lugares saber até onde eu era capaz de chegar, o que de fato eu tanto almejava? Foi difícil, complicado, sofrido, cheio de uma falta de paz de espírito.  


 


        Mas eu me encontrei, sim. No final do ano, admito. E gostei do que pude ver. Tanto abstrato se transformou em construção. Hoje prefiro colocar o tijolo do que querer o muro feito. Não é fácil não, gente. Não serei piegas ao ponto de dizer que no fim das contas encontrei a felicidade plena para sempre – até porque ela não existe.


 


Porém, dizer que o ano foi negativo é renegar a minha evolução. Adquiri conquistas impagáveis, perdi outras guerras. Comerei as uvas da virada com outras muitas dúvidas, vontades de mudar e uma esperança renovada.


 


A diferença, no entanto, faz toda a diferença: o coração está tranqüilo e manso como uma bênção. 

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Madame

Por Alice

Sabe, garoto, você é bonitinho. Eu sei. E nem é porque usas essas roupinhas apertadinhas, mostrando os músculos, os bíceps, os tríceps e zero neurônios. Você só é bonitinho porque é jovem. Ser jovem é ser bonito. Sempre foi assim e sempre será. As propagandas da TV, dos outdoors, são feitas para vocês. Mas pouco importa, não mesmo. Você só vai saber um pouco sobre isso quando o sal da vida te corroer e te deixar tão enferrujado quanto eu. Daí você vai sair por aí pagando meninas – que nem eu pago a você – para te ouvirem, te beijarem, te chuparem e sorrirem para você; ainda que saibas que é um sorriso asqueroso recheado de pena.
... porque foi duro ser. Foi difícil acordar, levantar, respirar e repetir “bom dia” todo dia. Foi foda ser mulher o tempo todo e gerar uma vida durante meses e ter que amar uma coisa que crescia em mim, me deformando, me esticando, possuindo meu corpo. Eu sei que toda mulher sonha com isso durante a vida. Também sonhei e esperei e tive aquele corpo estranho querendo transpor-se ao meu ventre dolorosamente para depois estar em meus braços misturados com meu sangue e o deles. Porra, garoto, é um amor muito fodido, sabe? Não se compara com nada na vida. Nem com uma boa foda, uma dose de uísque com coca, uma dose de heroína ou uma injeção de adrenalina pra ressuscitar da overdose. Mas bom mesmo é ser mãe jovem, porque depois que você fica velha, você se torna um fardo. E olha que nem tô tão velha assim. Ainda dou um caldo, ainda tenho a minha pensão que me possibilita te pagar por uma boa foda e uma dose de uísque com coca. O prazer que me resta é o carnal, é gozar, gozar, gozar.
Ah, fora que depois ainda tem a vergonha. É, garoto, Você pensa que é só filho que expurga mãe de perto? Não, neném. A sua própria mãe... duvido muito que ela continuaria acariciando esse rostinho bonito, com pele de bumbum de bebê, se soubesse que você enfia sua cara na minha boceta, na xoxota de uma velha.
Por isso que eu digo que não é fácil ser mulher, não, senhor. E eu vejo por aí, nessas esquinas sujas e soturnas da vida, essas bichinhas de silicone no peito, querendo ser fêmeas a todo e qualquer custo. Eu fico me perguntando “pra que, porra?”. Por quê? Se vestir de mulher não vai fazer você ter uma racha no meio das pernas e sim um vazio psicossocial na cabeça. Vai fazer o pobre homossexual virar um freak que vai ser freak em qualquer situação: fila de supermercado, banco, cinema, dermatologista. Puta merda. Eu quis durante muitas vezes ser homem para revidar os tapas que tomei ou para poder bater naquele garoto de programa que roubou todo meu dinheiro. Filho duma puta aquele moleque, olha...
Você não é desse tipo, é, amor? Olha, presta atenção. Não me engana. Eu só quero foder, gozar, tomar um banho e voltar pra minha casa. Eu não tenho grandes bens e nem ninguém que se importe comigo caso você me seqüestre e peça resgate. Eu só tenho essa vida mesmo porque Deus é camarada ou porque ele me castiga ao não me fazer morrer. Talvez seja porque eu já tentei fazer por mim mesma e não deu certo. Tem alguma coisa nessa minha existência que eu não sei o que é, que insiste em existir, essa alma existe ainda em habitar meu corpo e não tem adiantado muito detoná-lo, estragá-lo, depredá-lo. Ainda respiro. Escarro uma secreção sangrenta cada vez que tusso. Mas ainda não me impediu de respirar.
Portanto, querido, não me mate, não me roube e não me violente. Porque eu provavelmente vou gostar e se não gostar, não vai me assustar. Mas eu vou adorar te puxar para baixo comigo, vou te buscar no inferno só pelo prazer de te ver igual um bichinho assustado que roubou a madame carente. Estamos em entendido? Bom! Então pede a conta aí porque a noite ainda é uma criança e que quero mais é abusar dela! hahahahaha
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Fake

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Eu sei que tem uma razão que me explique de forma sensata – razão, cadê você? – porque quis e quero te conhecer melhor. Eu nem sei de que buraco saíste, ora. Contudo, todavia, porém, entretanto – eu e meu vocabulário rebuscado - é engraçado imaginar todos os jeitos e trejeitos das piadas que fazes nessas sempre poucas horas de mensagens instantâneas e ignorar tua procedência.


Confabulo mil vezes sobre como vai ser, quando vai ser e como vais ser. Sem essa imagem estática e sorriso congelado de foto. Não! Quero movimento. Quero que vejas o quanto gesticulo enquanto falo e quero simular ao vivo, assim, com todas as cores da minha cara pálida, o sorrisinho canalha que dei para os links sobre notícias como o inglês carente que traçou um cavalo ou a lista das 10 bebidas que tornam as mulheres mais fáceis.


Isso tudo é muito fake mesmo. É falso sentir saudade de quem não se conhece e é falso entrar numa livraria e ter vontade de comprar um livro... para quem não se conhece. É tudo extremamente fake. Sabe Deus se eu mesmo não sou forjada.


Eu vivo nessa minha bolha assim imperturbável, só deixo entrar quem eu quero. Acostumei-me a escrever cartas longas para ninguém, ir embora da vida dos outros sem me despedir, entrar sem ser convidada, falar sem ser requisitada e dar a cara à tapa. O mundo real só me pertence ás vezes. Eu devo ser um personagem de algum filme B.


Ainda sonho muito. Não desses sonhos bobos com cavalos brancos e sapatinhos de cristal. Eu sonho com viagens, com pessoas diferentes, com um milhão de lugares inusitados e os livros que quero ler. Sonho demais com a vida que eu quero ter, com as pessoas que quero ter por perto de mim. Acréscimos sempre.


E esse lance de ter pessoas legais por perto, eu mesma construo. Eu trago para meu lado quem eu quero e expulso personas non gratas, sem rodeios. Atendo a todas as minhas vontades porque acho que estou ficando velha para ter tantos pudores e sou muito nova para me privar de atender aos meus impulsos positivos. É só isso. É feio ser infeliz e limitada.


Eu escrevo muito e digo que sou prolixa para descrever isso. Eu adoro Xico Sá e o portunhol tosco dele que me disse que todo amor começa no paraíso e termina na Consolação. Eu acredito que podem existir homens legais e que meu filho fará parte desse hall, porque ele já é da nova geração de crias de mulheres bem resolvidas. Sim, eu me considero muito bem resolvida, obrigada. Eu ainda acredito nas pessoas.


Eu não minto minha idade, meu nome, meu estado civil e nem minto pro Imposto de Renda. Eu gosto de cheiro de roupa nova, de chuva e de gasolina. É, eu sou estranha. Eu estranho pessoas que falam durante os filmes e adoro Nescau gelado. Eu sou cheia de sardas no colo, nos ombros e tenho umas saboneteiras tão fundas as quais seriam um deleite para Vinícius de Moraes que dizia que mulher mesmo tinha que ser assim que nem eu, com ossos salientes.


Eu devo ser fake por te dar tantas informações assim, de uma vez só. Eu só posso mesmo é ser fake por entregar-te tanto assim, quase à toa, tanto de mim quando em outras situações foram necessárias muitas conversas e entrelinhas para saber uma coisinha de nada a meu respeito.


Mas vamos combinar que eu sei e tu sabes que essa distância é real e longa. Quilômetros e quilômetros de conversas inacabadas pelo fim do expediente. Isso sim a gente sabe que é verdadeiro. Então, aproveita que é invenção. Aproveita que não há paraísos e não haverá consolação. Haverá um dia alguns dias, quem sabe algum encontro, Augusta, um bar, algumas cervejas e só isso ou tudo isso.


Mas faz que nem eu: aproveita porque é bom, ou não é?

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Sensível

Essa sensibilidade que tantas vezes eu odeio e teimo em arrancá-la de mim como se arranca uma parte do braço. Não adianta, fará falta. O que seria de mim sem ela?


 


É um membro importante, que às vezes inflama como um joelho com ligamento rompido. Se arrancar, nunca mais poderei caminhar pelos campos do tempo com tanta facilidade. Correr então, seria tropeçar na primeira pedra com uma velocidade que de tão baixa me irritaria.


 


Já disse, não adianta. É assim. Simples e claro como achar água de igarapé gelada. É só entrar e sentir, sem mistério e mais complicações.


 


Essa sensibilidade que me faz ver e entender melhor as pessoas, me faz tantas vezes sair do chão para poder tocar as estrelas.


 


De entender frases no olhar daqueles que amo e de poder filtrar todos os momentos que eu achei que não fariam a menor falta, mas que inundam o coração de saudade.


 


Inundam porque tiveram dias e dias que esse lado esquerdo apertou tanto que minha garganta dava nó. Vejam só, sensível do jeito que sou, não dava outra.


 


Porém, essa mesma sensibilidade que me fez compor tristes fatos de choro em vão, é a mesma que lavou minha alma e me fez nascer de novo. Agora mais forte, mais feliz e com saudade.


 


Vejo as minhas antigas fotos e sinto saudade. Daqueles dias que eu ainda não entendia o desenrolar das tramas, do cabelo de cor oposta.


 


Sinto a minha falta.


 


Era outra. Mais infantil, imatura, porém não menos eu. Cheia de sonhos e louca pra saber quais as surpresas da estrada.


 


Quer saber? Quem disse que não continuo ela? Dessa vez com uma imaturidade manifestada de outra maneira. Quem vive à flor da pele não tem como deixar de ser criança.


 


Mas o que importa? O passado ruim escorreu por entre os meus pés e entrou na terra. Nasceram apenas boas lembranças no lugar.

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Os sinos

Meio dia de dezembro. Não acho que o clima seja natalino, mas um clima existe, é fato, é bom. O calor me sufocaria se eu não estivesse saído do ar condicionado. É só um quarteirão até meu carro, não cansa, não faz calor. Pelo contrário, faz-me um agrado, tira o frio, faz voltar à vida. O mesmo guardador de carros, parado na mesma esquina. O céu azul, o sino agitado da igreja da mesma esquina do flanelinha. Sempre toca ao meio dia, meio querendo avisar que existem demônios no chão quando estamos nas nuvens. Quando não estamos, nos faz olhar pro céu. Os sinos sempre nos levam a algum lugar.


 


Coloco os meus óculos escuros assim que saio porque tenho mania de achar que estou sendo filmada. Vai saber? Que nem em Hollywood, naquelas cenas de comédia romântica onde tudo pode acontecer durante as míseras duas horas do almoço. Eu reflito sobre o meu absurdo, “Como assim, filme, cara?”, duas horas mal dá pra colocar um prato médio de salada na barriga e um banho de português, isso porque eu moro a cinco minutos do trabalho.


 


Mesmo assim eu gosto de imaginar que em algum lugar do Universo alguém filma meus passos, nem que seja mentalmente. Alguém deve nos acompanhar, não é possível. Algum ser superior, espiritual, alienígena ou microscópico deve anotar tudo o que fazemos. Será que ele sabe das minhas canções trancadas no quarto? Das perseguições silenciosas em minha cama? Parou. Não gostei desses pensamentos, constrangedor.


 


Meu coração está tranqüilo. Não sei se é porque todo toque de sinos nos transmite certas vibrações, sol de meio dia, clima de sexta-feira. Alguma felicidade sem explicação. Eu me sinto feliz. Uma alegria que se tivesse algum nexo talvez não fosse tão grande. Será de mentirinha? O que me importa? Eu a sinto e a suplico permanência. Pego-me sorrindo pro nada pelo vidro peliculado do carro. Daria uma cena e tanto.


 


A verdade é que eu amo. Amo você, o céu azul, o trajeto das coisas, as minhas antigas frustrações, os frutos que plantei, as glórias que colhi, as guerras contra mim, contra todos, tudo, eu amo. Eu nunca pareci fazer tanto sentido. Não existem explicações, existe só o sentido certo do caminho que eu não sei onde vai dar. O tal do coração aquece tanto que eu tenho vontade de chorar, de ligar e dizer para as minhas pessoas especiais que elas são as minhas pessoas especiais.


 


Eu amo, cara. Do que tenho que reclamar? Amar dói pra caralho, magoa pra porra, me faz perder o que mais tenho medo: o tal do meu orgulho e o meu alto patamar imaginário. Quanta bobagem, necessidade de auto-afirmação. Mesmo assim eu tenho medo, fala sério, não quero sair de lesa pra ninguém. Amar é foda porque eu passo horas rezando pra que todas as pessoas que eu amo continuem vivas. E eu sempre me esqueço de um e acho que cometi uma injustiça. E rezo dobrado pro excluído para compensar. E mesmo assim eu tenho um medo da porra de ficar longe. Admito: sou dependente.


 


O tal do amor me transforma em piegas, cara, o sol ta mais azul que o normal. É porque amo. E eu vejo um passarinho em cima de um parapeito pichado e acho isso o máximo. Sou babacona mesmo. Dessas de cartinha, declarações em momentos inoportunos, surpresinhas. Faço um bando de coisa tosca. Besta pra caramba. Meio fantoche, complicado de dizer não. Mas prefiro dizer nada, fingir que não sou nada disso. É meu grande segredo.


 


Quer saber? Eu amo mesmo é ser assim.



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Paixão sem trilha sonora.

A casa continua a mesma, sem coisas novas. Sem cheiro de novidade, sem nada. A casa está apática com a sua ausência nessas semanas muito chatas, movidas a cigarro e mundos imaginários.


 


Estou cheia de sonhos em que você não está incluso.Você torce pelos meus sonhos, mas não tenta aprecia-los comigo.


 


Nunca escrevi para você, e deves te perguntar o porquê de´u ser tão negligente com teus sentimentos. Alguém me disse que eu não deveria confiar nos sentimentos de um garoto, eu realmente não confio. E pensei que ias cuidar de mim, mas que nada.


 


Você não me tem todas as horas, eu não sou sua diariamente. Nunca fui de ninguém, sempre escorri pelos dedos tortos, grosseiros e masculinos assim como água. Sempre fui desse jeito. Quem sabe um dia eu mude, quem sabe... Que música mesmo você ouve e lembra de mim? Aquela que eu não lembro, da Adriana Calcanhoto? Há, não sei, nem gosto. Quando colocastes a tal música para eu ouvir, te distraístes e quase batestes o carro. Neste momento até acreditei num sentimento puro.


 


A gente não tem trilha sonora, nem sorte, nem ambientes coloridos de paixão.


 


Todo amor tem trilha sonora, toda paixão tem uma música tema. Todo beijo apaixonado levanta o pé do asfalto. Ah se levanta!


 


Tua palidez deixou meu amor assim, sem graça. Sem nada.

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A Menina Mãe

A morte. Fiquei íntima dela com 12 anos no dia em que ela decidiu levar a minha mãe. Essa fatalidade do destino apertou o meu coração quando eu soube pelo rosto da enfermeira que mamãe havia ido embora (ninguém tinha me explicado o que era exatamente a morte), mas mamãe deixava o seu sétimo filho para a sorte no mundo.


 


A querida mãe estava mais branca e pálida do que nunca no seu leito. Morreu bem ali debaixo do meu nariz, sem avisar os filhos, sem uma última despedida, sem um último beijo no rosto. A ultima voz que ouvi da mãezinha foi um grito, nada mais.


 


Restara o meu pai, vi as lágrimas e o desespero dele correrem as veias. O suor angustiado da testa e o calor dominar o seu corpo todo. A raiva possuir a alma do velho. O que o meu pai ia fazer sem a mamãe com sete filhos para criar? Ele correu e arrumou as malas, olhou nos meus olhos e disse “espera filha, eu volto”.


 


Naquele momento senti que ele não voltaria nunca. Desde então prefiro acreditar que ele foi assassinado. Agora eu teria que dirigir a pergunta para mim “o que eu vou fazer com 5 crianças e um bebê para criar?”. Eu só tinha 12 anos, será que o pai não sabia disso? Então mais uma vez a morte ficou íntima da minha vida: o meu pai faleceu, e ponto final. Eu assumiria a paternidade e maternidade dos meus irmãos, seria a menina mãe.


 


Neste momento me apoiei ao Pai maior, ele não me deixaria só. Qualquer pessoa que não tivesse forças não conseguiria ter razão para pensar em solucionar essa tragédia. Mas eu estava viva, eu e meus irmãos. Nós, e sem nenhum familiar para amparar a gente. Os pais dos meus pais já tinham falecido. Eu era orfã aos 12 anos, em 1932, no município de Capanema, no Pará.


 


É claro que as autoridades da lei em Capanema não queriam deixar eu criar minhas crianças, mais uma fatalidade que eu não deveria engolir.


 


Eu não deixaria de jeito nenhum estas pessoas estranhas roubarem a minha família. Isso não era justiça, faltava-lhes piedade no coração. Será que eles não sentiam a dor daquela menina? Será que eles não pensavam que era cruel demais afastar os únicos laços de família que lhe restara?


 


Mas o prefeito da cidade conhecia minha mãe, o Coronel Matias. A minha força de mãe precoce, as minhas palavras de adulta o comoveram. O Coronel Matias pediu que as autoridades não me pertubassem mais, e prometeu que daria pão e tudo o que as minhas crianças necessitassem. Ajoelhei, beijei as suas mãos, agradeci e chorei. Era uma mensagem divina, eu nunca mais estaria só.

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Quem leva tudo, também leva a saudade.

 


 


Égua! Uma noite dessas eu resolvi que queria escrever (novamente) sobre nós dois. Sei lá, uma maneira de tentar desabafar através da escrita tudo que eu queria dizer pra ti. E também uma tentativa quase que desesperadora de tentar entender tudo isso.


Deus, como um cara de "insights" e cheio de humor irônico, pensou:"Queres desabafar com o word, minha filha? Vou fazer melhor!" E me colocou de cara contigo,só pra ver onde chegava.


Como nós dois já imaginávamos, chegou longe demais. A minha ficha em relação a nós dois, ainda não caiu. Que porra é essa? Por que uma relação tão curta pode ser tão intensa? Quando seremos apenas um ex do outro? Digo assim, beleza! Frio na barriga, amigas avisando que você tá por perto, mas precisa a gente não ter mais olhos pra nada? Precisava sermos essa obviedade toda pra quem tiver por perto, que tudo isso ainda está muito vivo? Que necessidade é essa de sempre querer se ver, saber de nossas vidas, vivendo tudo ao máximo possível, extrapolando sempre os limites?


O computador ficou pra escanteio, "vou falar é pra ti". E falei. Falei tudo. Rasguei o véu, te perguntei, me declarei. Eu confesso que tinham alguns meses que eu ensaiava isso. Não achava que ia chegar ao ponto que chegou, mas de verdade, foi um alívio pra mim.


Eu acho que um dos motivos de eu não conseguir romper tudo isso é porque sempre há um "feed back". Nós sabemos de toda a reciprocidade que existente nesse caso. Por exemplo, a noite de ontem. Toda a festa, nossos conhecidos, não só da época que estivemos juntos mas, amigos pessoais de cada um olhavam pra gente e sacavam tudo, foram cúmplices de um encontro que nem nós mesmo conseguimos disfarçar o efeito que teve. Foi incontrolável. Excesso de saudade. Excesso de ausência. Excesso de vontade de ficar muito mais grudado do que já estávamos. E obviamente depois de tantas cervejas as palavras saem ainda mais destemidas. Vale ressaltar que de cerveja nós entendemos muito bem. Logo, o que acontece? Muitas verdades foram ditas.


Lindo demais saber de tudo aquilo que me falastes. Muito importante saber que eu não tô nadando contra a maré sozinha. Sabemos sim, que não estamos juntos, não sabemos o que vem amanhã . Sabemos também que intensidade nada tem a ver com duração. Tanto é que pessoas muito importantes estavam lá ao nosso redor e nem por isso elas enfeitaram nosso ambiente mais de cinco minutos. Eras tu e era eu. E isso por si só, já significa muita coisa. E claro, a nossa bela sacanagem, nossa intimidade escancarada, a falta de vergonha que um tem pelo outro. Dos apelidos, as frases de duplo sentido, a disputa quase implícita de quem tem mais poder, a eterna mania de não querer parar, mesmo quando uma hora depois já tem que estar acordada pra trabalhar, um tesão que só pára quando nos tocamos do contexto em que vivemos. Com muito, muito carinho.


Acho que até exagerei nas afirmações, mas o que isso importa pra nós? Que sempre fomos feitos de intensidade e autenticidade? Falei por que, por mais exagerado que seja, naquele dia era o que eu achava. Posso até reconhecer em algum momento que houve exagero. Mas naquele dia, não!


Muito importante te conhecer assim tão bem. Assim como é muito gostoso me reconhecer nas tuas afirmações.


Mesmo reconhecendo e botando muito valor em tudo isso, hoje me afasto de ti. Me afasto porque não posso te ter. Isso é cruel demais. O que acaba me deixando até boba, infantil, esperando de ti ações que nem me cabem mais esperar. Mas pelo simples fato de te querer pra mim, mesmo que não seja como já foi antes e não ter, dói demais.


Pena que não tenha sido contigo. Pois até dos teus defeitos mais insuportáveis sinto falta. Te queria desse jeito que tu és. Assim literal, com tudo o que te compõe. Pena não ter sido comigo. Pois sei que ia ser tão verdadeiro e intenso como foi naquele tempo. E sei o quanto me admiras pelo que sou, até mesmo meus vícios que mais ninguém aguenta.


Talvez o tempo tenha sido errado conosco. Talvez viver mais nos fizesse sentir mais dor um dia. Talvez a nossa hora ainda não tenha chegado. Deixo todas essas dúvidas no ar. E guardo esse amor num baú esquecido lá pelo porão. O mesmo baú que espero logo mais guardar esse acervo de lembranças. Te guardo carinhosamente dentro de mim. Desejando o amor e a felicidade. E deixando que a minha vida se encaminhe sem tudo que mais quero de ti. Esperando que as cores voltem logo aos meus dias sem  tonalidades, cores pastéis, friasjazz_spal. Sem tu e tudo que longe de ti eu já não mais possuo.

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...Amores impossíveis...

Por Pagu

Naquele dia, na sala 204, quando te vi eu sabia que nós iríamos muito além do que imaginávamos, mesmo sabendo que tu és quarenta anos mais velho. Eu tenho vinte, e pensei que nunca me interessaria por alguém da sua idade.


Só de te ouvir meu corpo todo treme, é teu olhar que já conhece a vida empiricamente e meninas do meu caráter. És homem, daqueles que só precisam estalar os dedos para levar qualquer mulher ao prazer absoluto. Encantei-me com a tua paixão pela arte, foi isso.


Eu adentrei no seu mundo, porque sempre te quis nos meus sonhos mais platônicos que apenas meus diários conheciam. Perguntei ao destino “Por que te conheci em tempos tão distantes?”, um desencontro amaldiçoado pelas nossas idades.


No entanto eu sou apenas a sua amante, e nada mais que isso. Um prazer de uma new generation que não tens com a tua mulher, sou a menina novinha em folha que te sacia. Sou a tua sorte, a tua garotinha.


-Fique comigo, para sempre.


-Não, nunca ficarei contigo para sempre.


-Mas você é a mulher que eu amo.


-Tu não me amas, tu me desejas. É diferente.


-Como sabes? Não sabes o que passa nesse coração de velho.


É por ser um coração de velho que eu sei muito bem o que se passa. E sei o que se passa no meu coração de garota também. Eu te desejo, mas não é eterno. Ele morrerá com o tempo. O desejo atingirá os orgasmos que eu desconhecia, mas assim como a tua pele vai ficando enrugada e desinteressante, meu desejo por ti vai a óbito.


Amarei apenas a tua alma, como amo o meu pai. E tu te culparás por algo que não tens culpa. Teus pensamentos ficarão mais teimosos, e teu olhar eternamente viciado. És um velho que me dá prazer, porém tens uma esposa que realmente te ama (lembre-se disso). Ela te conheceu jovem e te aceitará para sempre, como um fardo, com toda essa tua personalidade orgulhosa de si. Não serei eu a escolhida para  interromper a sua vida, trazer mais lágrimas que já derramei, porque eu não quero isso.


Sou uma canalha, libidinosa, e te seduzi como uma meretriz. Tudo o que eu queria: teus dedos de experiência e tua boca cortês. Agora eu me despeço de ti, sem um  sinal de culpa, e podes me amaldiçoar para o resto da sua vida, porque eu nunca mais voltarei para o senhor.

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Daniel you're a star in the face of the sky. E.John.

“E deve-se também pensar que os filhos podem morrer. É preciso se preparar para isso, tentando deixar o mais claro possível o diálogo que temos com eles. A perda de um ser amado é tanto mais irreparável quanto menos fomos longe no diálogo com ele. Isso não se trata de preceitos ou valores morais, de ética. A lógica do amor não é lógica da moral. Trata-se de uma sabedoria do amor, e não de uma ética moralizadora ou de direitos humanos.” LUC  FERRY


Perdi um amigo, e ver o corpo dele no caixão não foi uma imagem que eu gostaria de ter visto. Mas quando olhei para o rosto dele, eu sorri, e lembrei que o Dan me fez gargalhar a maioria das vezes que eu estive ao lado dele. Quando eu estava triste, chorando pelo irmão do Dan, o qual foi meu primeiro namorado, o Dan falava “Deixa disso, sorria”, e contava uma piada para me alegrar.


Mas a realidade é que ele estava morto, e tive um pouco de raiva do destino. Um rapaz tão jovem, cheio de sonhos para realizar, simplesmente morreu porque o coração dele não agüentava mais a vida. A vida que o fez ser pai tão cedo, que o levou a trabalhar para dar comida ao filho. Mas o coração dele era jovem, ele sonhava como todo o jovem, e isso eu não consigo aceitar.


Há 10 anos, quando conheci o Dan,  ele representava para mim a formação da minha juventude, quando eu queria sonhar e não querer saber de coisas chatas de adulto. Eu, o irmão dele, o Dan e os nossos amigos. A maioria meninos, todos se reuniam depois do colégio lá na pracinha da Pedro Miranda.  A gente não gostava de internet, nem coisas de ir para encontros de internautas em shoppings, gostávamos era da rua e de reunir com os amigos. Jogávamos RPG na casa do Drezinho, e praticávamos esporte. O Dan não gostava de esporte, mas ele gostava de estar com a gente. É tão viva a memória dessa minha época, de quando a gente se metia na praça da república, cada um com a camisa de sua banda predileta, e íamos fazer roda de violão, o Dan tocava para gente. Todos querendo ser rebeldes e roqueiros.


Então escrevo para ti, se tivesses vivo, gostaria que tivesses lido esse meu texto. Mas acredito que a vida é muito mais, e que sentias isso. Então lembrei dos momentos especiais que tive quando convivi contigo. Da primeira vez que a gente se conheceu, foi naquela festa na tua casa que só tinha homem, o dia em que eu resolvi te admirar. Nós éramos bem mais jovens, e gostávamos de Nirvana. Você e seus amigos faziam a barulheira que irritava a mãe dos irmãos Alcântara, a tua mãe que te achava um rebelde sem causa, lembra? Ela é mãe, eu dizia. Eu lembro muito bem, parece que estou vendo você falar comigo. Então escolhi namorar o teu irmão, e você ser o meu cunhado. O único cunhado de verdade que eu tive.


Lembrei que eu odiava ouvir Gun´s Roses, e ainda mais quando tu resolvestes montar uma banda com o meu irmão para ensaiar no porão da Bernal do Couto, na minha casa. Mas eu ria toda vez que o Junior cantava e meu gato siames miava com ele. É, meu caro, o Axl devia ter treinado miados com gatos quando ele resolveu sair cantando por aí...Eu não gostava da voz do Axl, e ainda mais da voz do Junior. Tudo bem, era uma banda cover perfeita do Gun´s. E tudo isso veio na minha memória como um filme, ao ouvir “patience” no seu velório, com o Junior chorando no caixão. E com o forte abraço da sua mãe.


Eu sempre acreditei em ti, Daniel Jam. Acho que comecei a ouvir Pearl Jam por tua causa, tu eras um viciado no Veder, era  a tua droga. Quando foi isso? 1998? Minha memória para anos é péssima.  Vi um rapaz cabeludo, alto e sorridente, com uma camisa do Pearl Jam e uma guitarra, um rapaz cheio de sonhos, ali no corredor do colégio. Às vezes também usavas, mesmo com o calor dessa cidade, uma camisa de manga comprida preta por dentro e por fora uma camisa xadrez, como um grunge. Eu achava legal, e entrei também na tua onda de sonhar com a música, fui tua tiete até quando eu não gostava do Gun´s. Frequentei alguns shows só para apoiar você, ainda bem que era rock meu amigo!


Era tão bom ser da tua família, o outro irmão que eu amava. O Dudu com veia jornalística e você com o talento para a música e a vontade de ser uma estrela do rock. Os dois se completavam, a dupla que entrava em conflito, mas que era perfeita: cada um com um gênio forte.


Eu falava "Toca aí Dan", e tu tocavas qualquer rock, fazia uma piada no meio, sorria para mim. Parece que estou ouvindo a sua voz e seu sorriso, é o que vai ficar pra sempre nas minhas boas lembranças. Os teus abraços de conselho quando eu chorava. Eu ainda não consegui cair na realidade, parece que estou sonhando, ou que estão contando uma piada sem graça. Queria ter vivido mais tempo ao seu lado, e tu estavas tão bonito e adulto desde a última vez que eu te vi. Mas tu morrestes, e bem ali vi teu corpo sendo velado pelos que te amam. Pensei que eu nunca ia chorar por alguém que só me fazia rir. Mas você pode ir em paz, pois todos os seus gestos vão ser lembrados pelos os que acreditavam nos seus sonhos, e sempre lembraremos que  davas valor a vida e a todos que tu amavas.


 


Os jovens nunca deviam morrer, Deus errou nisso quando criou a vida. Ainda mais se os filhos morrerem antes dos pais, isso dói demais. Porque a lógica seria os filhos enterrarem os pais. Mas a vida não tem muita lógica. Eu ainda não consegui aceitar com a minha razão essa realidade. Porém, penso que o sentido da vida é sempre amarmos os nossos amados, e sempre resolvermos nossos conflitos com os familiares. Penso que o pai que não perdoa o filho irá conviver com uma dor intensa para o resto da sua vida, se caso a prole venha a falecer antes dele, o mesmo acontece se for o contrário. É uma sabedoria para aqueles que não acreditam em algum preceito divino, penso que o rancor, orgulho, raiva, são sentimentos baixos e que devem ser eliminados enquanto se tem vida. Os nossos amados sempre devem ser homenageados vivos, com um gesto de carinho, com um gesto de respeito. Com uma demonstração de amor. Só assim talvez conseguiremos dar sentido às nossas vidas. E viver sem temores.


Moara Brasil

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Quando ser de classe média...

....é uma merda, ainda mais quando tu nascestes com alma de rico e bolso de pobre.

1. O que é a queda da Bolsa de valores? Você não consegue compreender muito bem quando tem queda na Bolsa de Valores, afinal, seu bolso vive em queda, então essa crise não faz diferença na sua vida. Ora, sua crise é ad eternum. Conclusão: você sempre está preparado para qualquer crise. Crise amorosa, crise financeira, crise familiar. Pobre não tem psicólogo e nem faz psicanálise, isso é coisa de gente rica. Sofrer é de menos, sofrer faz parte.

2. Classe média tem que entender de moda. Você tem que ter paciência para se vestir, como griffe é coisa de rico, então optas por escolher roupa sem marca, entre milhões de roupas horrorosas de uma loja desconhecida do comércio. E se não achares uma roupa decente tens que compreender muito bem de moda econômica.  Seja o seu personal stylist! Faça milagres sem cair no ridículo, olhe para aquela saia abandonada e transforme-a num vestido com um cinto barato de 10 reais. Ou pegue a calça jeans velha e meta a tesoura, pronto, temos um short. Olhe para aquela camisa estampada e grande de Brechó e meta a tesoura. Pinte aquele scarpin abandonado para mostrar que é coisa nova, e dê uma olhada nas revistas Vogue algumas vezes. Tudo é moda hoje em dia meu caro, só não seja cafona. É nessa hora que você percebe que pode ter ou não um futuro com estilismo.

3. Tem que denunciar! Classe média (marromenos) sofre, ainda mais quando vem aquela empregadazinha de merda e te rouba aqueles 300 reais que foi economizado para pagar uma dívida da C&A, você começa a pensar em ser amigo do Serasa. Mas você também fode com a vida da ladrazinha, então a denuncia para a polícia. Pobre fudido que rouba de outro pobre fudido, é inadimissível meu caro! Não tem perdão.

4. Quem fode com a tua vida tem que se fuder também. E falando em C&A, ser pobre é se individar com a mesma, não caia nessa! Mas como você não tem grana, você pode reclamar. Claro, porque C&A foi feita para fuder com a vida de quem é pobre, com aqueles juros cara de pau de abusivos. Então você pensa "vou ser amigo é do Procon antes de ser do Serasa", e você fode a vida da C&A. Para ser pobre tem que ter esperteza no sangue.

5. Tem que entender um pouco de culinária e ser saudável. Ser de classe média é não ser nem pobre e nem rico, é meio termo fudido, é aquele que tem que pagar os malditos impostos, pagar aluguel e conviver com parcelas infinitas. Então você economiza, classe média não pode comprar produtos sofisticados, semi-prontos, como lasanhas de microondas, hamburgues, etc, porque são caros. Então para ser feliz vá no google, é ótima ferramenta para o Classe média, lá ele acha de tudo, inclusive receitas culinárias fáceis. O Segredo é comprar o essencial de comida, lá no meio-a-meio, inventar, e ser bom de tempero. Pronto, você pode ser feliz. E deixar aquelas comidas cheias de gorduras trans, e apreciar uma ótima salada verdinha bem temperada.

6. Ser pobre não significa ser burro. Você sonha em viajar para Europa e não tem grana? Você não pode assistir peças teatrais, não pode ir para exposições artísticas, não pode pagar aquele curso sonhado, e quase não pode ter muitos livros, né? Procure então conhecer as coisas que você aprecia, vá no google e leia até blog, é bom, mas escolha bem. Youtube foi feito para salvar a vida do pobre, e para ele ter um gostinho em conhecer diversas coisas de vários países, mesmo que em vídeos amadores. Se informe de cursos gratuitos. Leia revistas e fique por dentro das atualidades, pelo menos você leu aquela resenha ou crítica de algum filme ou livro, e pode conversar em paz na mesa de um bar sem passar vergonha, com aqueles cults chatos e ricos.

7. Seja Saúde.Você é daquele tipo que paga uma academia e para de malhar justamente porque não consegue mais pagar as outras mensalidades? Então procure a academia mais barata perto da sua casa e convide um amigo para dar aquela força. Se a situação tá pegando, então vai correr na cidade e subir escada, compre uns pesinhos e pronto. Já pode ficar sarada e de repente sair na coluna society da sua cidade, ao lado de algum figura society gostoso, e quem sabe ele se apaixone por você e consigas ser rica e feliz para sempre.

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Ah, então escuta!



Por Selene Rilke

O filho da mãe me disse uma vez que eu não amo ninguém, só a mim mesma. Quem ele pensa que é para traçar a minha personalidade em tão poucos meses de convivência comigo? Ele não sabe de nada, porque eu nunca quis que ele soubesse, e ele não sabe que apesar desse meu jeito grosseiro de ser eu gosto muito dele. Tudo bem que ultimamente os meu sonhos estão muito sexuais, e que eu só penso em sexo quando penso nele. Mas porra, eu sou mulher e penso em sexo como qualquer pessoa normal e contemporânea.

Ele me disse que os papéis inverteram hoje em dia, que eu sou o homem e ele a mulher. Um gay mesmo! Eu ainda sou mulher, meu querido, mas a mulher precavida de tudo o que os homens já fizeram comigo.

Então vou te contar que eu já gostei de muitos caras e já deixei de ter amor próprio, isso mesmo! Escuta. Já chorei no banheiro, e queria morrer no chuveiro, e parecia que o mundo ia acabar, por que? Porque eu tinha levado o maior fora do universo que eu não queria ter levado, do cara que simplesmente disse que não ia conseguir me amar.

Escuta! Já tive um namorado que queria casar comigo e ter filhos, o problema que ele foi um desencontro na minha vida. Eu não queria isso! Eu amei esse cara, mas não aguentei o ciúme doentil que ele tinha por mim. E eu já amei um puto, isso mesmo! Amei um puto que tinha transado com metade da cidade, e eu amava-o assim mesmo, por ele ser canalha. Já me apaixonei por um adolescente que só sabia fazer sexo, e não conversava nada sobre arte, literatura e coisas afins.

Já gostei de cabeludos, daqueles nojentos que se acham um Jim Morrison e gostam de Poe e Nietszche, que tem transtorno bipolar e que amam o filme "A felicidade não se compra", apesar de que  o filme é uma boa sim, só eles que eram problemáticos demais para mim!

Tentei amar os velhos, mas eles eram cheios de vícios. Me chamavam de pequena e que eu tinha que viver muita coisa na vida, eu não sabia de nada. E eu pensava "porra eles nunca tiveram a minha idade?", e chutei os velhos, eles me cansavam. Quem sabe agora queira um.

Eu já amei muita gente, meu querido. Mais que você mesmo! E não me orgulho pela quantidade, mas pela patada que eu levei da maioria, que me fez tornar o que eu sou hoje: precavida meu bem! Você pediu para ouvir, e eu não queria contar.

Então pára de ciúme besta e deixa eu dançar com meus amigos, chega de paranóia e deixa eu ser livre como eu sempre fui, e não vai ser agora que eu vou largar tudo o que eu já sou acostumada a fazer há mais de dez anos por um amor que pode chutar a minha bunda na hora em que ele bem imaginar. Quer sair? Saia comigo, não quer? Então esfrie a cabeça e vá dormir meu querido. Eu tenho mais o que fazer.

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Memórias de uma velha triste

Por Moara Brasil

Eu tinha 84 anos, a minha vida havia se tornado a rotina mais repugnante que eu não tinha planejado. Todos os dias, sempre a mesma rotina. Acordava seis horas da manhã, mas não porque eu queria acordar, era porque não conseguia mais dormir como dormia antes, na época em que tinha vinte e pouco anos. Tomava meu café  com algumas bolachas de água e sal. E lia as notícias principais do jornal local, mas eu não tinha mais a vontade de saber de notícias da minha cidade. Assistia diariamente as mesmas novelas com os mesmos roteiros, depois de um tempo comecei a achar que a Globo havia caducado, tudo era sempre um dejavu. Eu poderia mudar aquela rotina, eu poderia ainda ter sonhos e ter projetos, mas eu morri sem saber que já estava morta.

Eu andava muito cansada, exausta, velha, irreconhecível. Um dia eu chorei como uma menina na frente do espelho, eu não me reconhecia naquele rosto cheio de rugas e tão diferente daquele de vinte e poucos anos. Eu não gostava de envelhecer,  era uma tortura! Se eu pudesse nem viveria aquela minha velhice medíocre.

Tudo o que eu tinha na vida era uma diabete e a solidão. Mas eu odiava a diabete e para me vingar comia chocolate escondido da minha filha, todas as noites, quando ela ia dormir.

A minha filha tentava cuidar de mim para eu não morrer, para eu viver mais um pouco ao lado dela. Eu tomava remédio controlado por ela. Mas eu estava amarga, eu não queria mais aquela vida, e nem queria dar trabalho para ela, então acelerava a chegada da minha morte física, porque a mental já estava sepultada.

O que uma velha como eu havia conseguido todos esses 84 anos? Nada. Nada de digno, nem para dar a filha que mais amo. A minha filha que pagava o aluguel da casa. Os livros, a estante, tudo era da minha filha.

Naquele domingo eu acordei, coloquei meu vestido e passei batom na minha boca. Me senti nova, tão nova que ao olhar no espelho do banheiro sorri como nunca mais havia sorrido. Meu coração palpitou. Lembrei do meu velho, quando a gente se conheceu no sítio do meu pai. Eu, com o vestido pink e ele com aquela calça xadrez, nós dançamos a noite toda e ficamos embriagados, e muito felizes. Mais uma vez meu coração palpitou. Eu chorava como uma moça boba.

Meu corpo todo doía, mas eu consegui andar até o sofá. De repente a minha filha apareceu e perguntou se eu estava bem. "Não, meu corpo todo dói". Senti um formigamento estranho e um enjôo que me deixava fria. Doía muito e vomitei. Tudo ficou embaçado, a minha filha me sacodia desesperada e eu ouvia a voz dela bem longe, como eco, como um sonho, a dor já não mais existia. Eu me despedia daquela vida, bem ali, naquele sofá, num verão qualquer daquele domingo apático e chuvoso de julho.

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Da esquerda para a direita

Por Anna Carla Ribeiro*

Ele tem o dom de passar a ponta o lápis na minha nuca esbranquiçada. Sempre percorre pouco menos de cinco centímetros, da esquerda para a direita. Passa por todos os fios do meu cabelo e depois volta pelo mesmo caminho, como quem faz caligrafia. Eu automaticamente paraliso. E me arrepio. E viro um gato domado. Mansa, mansa.
Vou começar do começo.
Foi a primeira vez que eu vi alguém de calça marrom fora do ensino médio. Ele se aproximou, disse que me amava com os olhos, e eu respondi com a sobrancelha direita levantada “Porque diabos tu tens uma calça marrom?”. Ele deve ter se achado bem interpretado, pois quase fez minha cintura perder dez centímetros com aquele abraço. Nenhuma palavra. Só o barulho dos estalos da minha coluna.
Durou pouco mais de dois minutos, tempo suficiente para tocar a saideira. Não pude ouvir. Minhas mãos o levaram para longe, meio metro, e meu rosto enrugado berrou incontrolavelmente.
_ Eu to cansada, sabia?! Você, sua calça marrom, chegam aqui do nada e acham o quê? Que vão conseguir algo mais do que beijinhos? Escute aqui, ô chocolate ambulante, não vou mais ser subestimada. Eu sou perita em práticas canalhas e ainda faço dependência em “Fuja dos Conquistadores Gratuitos”, sempre mais em conta do que os baratos.
Sorriu. Me mostrou toda a sua arcada dentária como se eu estivesse à procura de um canal. Tive vontade de depilar todos os pêlos do seu corpo com cera fria, incluindo aquele cabelo fininho e caído na testa. Foi quando ele tocou na minha franja. E eu virei estátua. Parei de pensar, de ouvir, de ter qualquer expressão. Minha sensibilidade se resumia aos leves toques do seu indicador, revezados com o polegar, da esquerda para a direita.
Foi aí que tudo se perdeu e se achou, simultaneamente. Achei a cura dos meus berros, das minhas dívidas, das minhas dúvidas. Que se dane o banco, o trânsito, a dor no peito, os conselheiros, as éticas, as experiências alheias e as minhas convivências frustradas. Que se foda os hinos, as cartomantes, as esmeraldas, os signos, os astros, a praia, a lua, os maias, incas e tupiniquins. Que se exploda até mesmo aquela calça marrom. Perdi a sanidade, a vontade própria, o controle. Vai, agora pode me levar. Para minha casa, para tua casa, para tua vida. Ou para marte, para o carro, para a padaria. Que diferença faz?
Ele me levou para casa, a minha. Sua pupila esquerda me contou que viajou recentemente para Budapeste e que estava à procura de novas melodias de blues. Nenhuma palavra. Minha pálpebra tentou, sem sucesso, me fazer ficar invisível. E ele ria. E eu tinha medo de chorar.
E entrou na minha vida como a bailarina entra no palco, tomando conta de todo o espetáculo. E me fez assistir de camarote a minha própria adestração. E mudou os meus assuntos, minhas pautas, meu jeito de andar pelas ruas. E não importa mais nem mesmo o inferno enquanto eu puder, no fim do dia, esquecer até mesmo de mim ao debruçar a minha cabeça nos seus joelhos. E então finalmente ele irá tocar levemente na minha nuca, da esquerda para a direita. E no final de cada show, eu levanto e bato palma.

* Texto publicado em janeiro de 2008

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Das pontas

Por Alice

"E se eu cortar o cabelo, talvez seja a solução do conflito
- cortar o cabelo é muito bom, pq a tristeza fica nas pontas"

Não sei de quem é a frase ou se é trecho de letra de alguma música de banda de rock alternativo que tem nome sem nexo, tipo "sapatos bicolores" ou "chove e não molha". Não sei e nem quero saber. Mas vou tentar tirar das pontas dos cabelos a metade da tristeza que não estou sabendo exprimir. Vou passar um dia inteiro num salão folheando revistas que falam coisas fúteis sobre a vidas das celebridades somente para que a minha pareça um pouco mais ridícula e sem glamour.

Vou fazer planos no salão de beleza, mas não planos de verdade e mais coisas do tipo "farei 10 zilhões de hidratações de chocolate-açúcar-morango". Vou tentar tirar a palidez da cara e as pontas "mortas" (como o cabelereiro fresco fala) para que a minha cara pareça só um poquinho mais viva que a  minha alma.

A dieta eu vou planejar para segunda-feira (sempre a próxima), a malhação ficará (sempre) para o mês que vem. Daí me organizarei para ler todos os livros que quero e ver todos os filmes da locadora que eu puder e isso eu farei, tenho certeza.

Vou polir o visual e o intelecto para que assim que as pontas se forem, nas primeiras tesouradas, eu sinta um poquinho de passado indo embora de mim e que as pessoas me olhem não como um ET que acho que sou e sim com um super-mega "puxa, como você está diferente".

Eles não verão as mudanças que se passaram aqui dentro do meu peito, mas é... eu mudei tanto: de cabelo, de roupas, de amigos, de endereço, de cidade e foram tantas mudanças que fica até difícil reconectar. Entre idas e vindas de duas realidades disttintas mas tão interligadas entre si, eu me pergunto  se realmente estive nesses lugares ... ou flutuei ... terei eu passado em branco? Eu passei, fui e vim. Fui e voltei.

Agora é mais um recomeço. Cheguei com um mala apenas. Vou-me embora com uma mala e mais oito caixas. Cheguei com tantas dores mais e tão poucas viagens de barco. Vou-me embora um pouco curada e um pouco ferida dos cacos que sobraram de grandes brigas internas. Vou-me embora com muito mais fotografias na mente, imagens de vagalumes, "gringas' sunday morning", a chuva de folhas amarelas na ventania e a temporada da queda das flores amarelas do ipê em setembro. Sempre setembro. 

Eu vou recomeçar de novo, só que agora muito mais slow motion. Começando tudo com a paicência e a sapiência necessária para que assim perdure. Vou começar pelas pontas soltas que deixei.

Viver ainda é amar (ou não é?) e se o "love is a loosing game", bem vou-me perdendo por aí. Amando mais a qualquer coisa que me traga a felicidade simples que ganhei aqui. "Um dia eu volto quem sabe..."









PS: Não tente fazer disso aqui uma forma de me conhecer. Eu te desconheço tanto quanto você não me conhece. Let it be, ok?

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Dia da verdade

Por Alice

Decidi que hoje é o dia da verdade. Institucionalizei, circulei no calendário com caneta marca texto e repeti três vezes em frente ao espelho. Hoje é dia da verdade. No dia primeiro de abril todo mundo sai por aí contando umas mentiras idiotas e porcas achando que é a coisa mais legal do mundo e pior, essas mesmas pessoas passam esse mesmo dia perguntando umas às outras se já "caíram" em alguma balela. Pois bem, hoje verei se esses mesmos espertões gostam da verdade, de verdade.


Vou começar dizendo para essa senhora aqui do trabalho que ela precisa parar de entrar na sala dez vezes por dia para usar o telefone, até mesmo porque esse telefone não é para que ela saiba se a filha dela já comprou o xampu e se vai ter carne assada com batatas para o almoço. O telefone, assim como o ambiente todo , é para fins comerciais. Chega de ligações, minha senhora, chega! Saia da minha sala e vá direto numa farmácia comprar uma tintura para esse seu cabelo medonho. Mas escolha uma cor e fique com ela até mês que vem, porque se apareceres aqui segunda-feira com o cabelo numa outra tonalidade como toda semana acontece, eu juro que perco a cabeça.


Quem aquele garoto pensa que é para passar ao meu lado e não falar comigo? Vem cá, moleque, tenho umas coisas para te contar. Primeiro que o sexo contigo era uma porcaria És um brocha. Ah, pensa que eu me esqueci disso foi? Não só não esqueci que és um brocha, como lembro direitinho quando me achaste a mais puta porque te pedi uns tapinhas na cama. Ah, fala sério, cara. Devias ter tido um súbito acesso de verdade como estou tendo agora e ter me contado que queres uma frígida sem sal na cama. Faz um favor para mim, faz? Não deixa só de falar comigo, não. Muda de lado quando me avistares, de rua, de cidade. Tenho medo de não me controlar e cuspir em ti quando passares ao meu lado.


Ainda descubro porque a cozinheira põe cenoura em tudo: macarrão, carne assada, carne cozida, frango guisado. Tudo, exatamente tudo, leva cenoura. Seja ralada, fatiada, em cubos. Porra, eu gosto de cenoura, tia. Só tô começando a achar que vou morrer de overdose de betacaroteno. Pega leve na cenoura, tá bom? Bem, agora vamos falar sobre o café. Cada um gosta de um jeito. A senhora não precisa derramar um quilo todo de açúcar na garrafa térmica. Eu sei que minto todo dia dizendo que tá ótimo, mas já virou um vício mentir para a senhora e para o meu paladar. Hoje eu exijo menos cenoura, menos açúcar e mais sabor. Minhas cáries agradecem. Obrigada.


O mesmo vale para a galera que gosta de reparar no visual dos outros. Sim, gente. Eu cortei o cabelo, sim. Ou vocês achavam que ele tinha caído? Ia ser o máximo, já pensou? Cair assim, de forma degradê? Um luxo só. Sim, eu engordei. Já entendi isso, galera. Pronto, agora podem voltar aos seus espelhos e reparar suas caras enrugadas, suas roupas cafonas, seus perfumes exagerados, sua forma cinzenta de ser e de viver e  deixar eu e meu cabelo, meu estilo, minha vida em paz porque já sou um inferno cheio de inseguranças e temores sobre eu mesma? Agradeço novamente.


Cansei de ser assim: meio extraterrestre ou autista. Dizem que eu sou estranha e eu me sinto assim. Fazem-me sentir assim.  Porque quando falo o que penso e isso agrada, eu tenho um jeito espontâneo. Se o que eu falo desagrada, sou impetuosa. Ninguém nunca se poupou de me criticar, de me apontar o dedo e de colocar em meu peito uma letra escarlate para me taxar como ovelha negra.


Pois saibam que a ovelha negra também sabe berrar e eu berro por isso, pelas verdades. Por um pacto com a verdade nua e crua. Tenho plena consciência que não posso sair por aí reclamando do pau pequeno do brocha, do cabelo e da tagarelice de uma senhora ou até mesmo da comida. Eu tenho consciência! Eu tenho fome de vida, de amor, de pôr-do-sol, de cerveja gelada final de tarde, de rock dos anos 80, de tatuagem e isso vale muito mais do que revelar aos outros o que eles deviam saber sobre si mesmos. 


O preço de ser tão fã da verdade é o rótulo. É como carregar consigo para todo canto, como um caracol carrega sua casinha nas costas, tudo que você pensa e mais o fardo do que os outros pensam de você. A maioria - talvez seja por isso que Maquiavel dizia que a unanimidade era estúpida ou burra, ou sei lá o que. Não sei qual o termo que ele usara - passa maior parte do tempo a olhar o rabo dos outros e esquece de limpar seu rabo e coloca-lo entre as pernas antes de reparar na vida dos outros.


Vamos viver com nossas verdades. Rir do que nos alegra é um direito. Pintar o cabelo uma vez por semana de uma cor também. Assim como o "laranjinha" da cenoura alegra a comida, engorda e faz crescer. Deve ser por isso que tô gordinha. Mas sou uma gordinha saudável e feliz. Se a Preta Gil é, porque eu também não posso ser? Eu sou. Claro que sou. E agora chega. Acabou o dia da verdade. Voltarei pro meu sorriso hipócrita porque nesse momento.... adivinha? Tem alguém de cabelo multi-colorido que me pergunta: 


- Oi, meu amor. Posso fazer uma "ligaçãozinha" rapidinho?


As verdades me exauriram tanto quanto substantivos e adjetivos no diminutivo.


 

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Mofado

Por Aimée

Sabe que eu tento não pensar em um milhão de sarcasmos e ironias, que eu amo por sinal, só para te explicar o que sinto agora de uma forma bem bonitinha e descolada que não seja humilhante ou que não me faça parecer essa bitch que você tá pintando por aí a meu respeito. Mas, "beibeeee", não consigo. Juro.


Eu sinto vontade de rir, eu sinto vergonha de mim e eu imagino todas aquelas pessoas que eu me afastei rindo de mim pelas costa durante tempo que eu gastava contigo. E foi assim: um gasto. Tô gasta, tô bege, tô passada e ando por aí numas aventuras tão legais  que colorem a vida que... porraa... quero rir de ti e de mim, de nós dois juntos andando de mão dadas. É piada, só pode.


Fora o fato d'eu ser problemática e fora o fato d'eu ser completamente maluca e fora o fato d'eu ter surtos psicóticos, mon amour, não tô na prateleira de qualquer supermercado. Entendes isso? Eu fico me repetindo nessa função de te fazer compreender que eu quero muito que entendas o que digo, porque é exatamente o que sinto.


Quando digo que não estou na prateleira, não só quero dizer que não possuo código de barras, manual de instruções, bula ou posologia (quiçá contra-indicações). Eu tenho uma auto-estima que baixa de vez em quando ou de quando em vez e vejo o quanto você é que é o ass hole da história, porque você sabe disso e você usou disso o tempo todo para me manipular.  


Daí eu demorei a perceber que eu sou mais, mais, mais que isso; que não tenho vocação para fazer "capa" contigo, nem para precisar de relacionamentos "muletas". Mais uma vez me preocupo se consegues sugar a compreensão que preciso que tenhas para que esta mensagem atinja a parte do cérebro onde devem ficar armazenadas as idéias sobre "vergonha de si mesmo".


Hoje eu cheguei a uma conclusão, brilhante por sinal, que eu adoro o que sou, como sou e eu sou assim, exatamente feita sob medida para algo que seja super-plus-mega-master sublime. Resumindo: je suis habité.  Plenamente habité, com meus problemas que viram piadas.


Dói-me pensar que perdi tanto, tanto tempo com você. Dói-me também saber de ti por aí choramingando, de nhem-nhem-nhem com nossos amigos em comum para que todos pensem que eu sou aquela pessoinha má. Não sou. Você não está tendo sucesso na sua campanha.


O problema é o seguinte: entre trancos e barrancos - e olha só que conclusão mais mágica, mais sublime, mais fodástica que se deu agora, justamente agora - eu sou extremamente amada. Chega a ser surreal a forma como as coisas dão certo para mim e mais ainda como pessoas do bem, de bom coração, me querem bem por nada.


Agora eu preciso respirar, viajar, absorver (porque dá menos trabalho que abstrair, afinal, absorvendo sairá na urina) tudo que nos aconteceu e dar grandes risadas. Primeiramente as internas, sabe? Daquelas que a gente dá andando sozinho na rua, fumando o último cigarro do dia antes de dormir. Depois... ah, depois eu já esqueci tudo, no intervalo entre um cigarro e outro, eu já esqueci.


No mais, fique bem. Chegamos a ser morangos, doces e raros por essas bandas daqui, de clima tão quente quanto o inferno queimando em enxofre. Hoje, nosso morango mofou, não é? "Morangos mofados". Morango e mofo.


Caio F. continua tendo razão: "Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem".

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Vivo?! Morto?! Vivo?! Vivo?! Morto?!

Dia desses estávamos juntos, Barata e sua prole fofinha e banguela, Moa, Laércio, TT e eu. Churrasquinho prum lado, cerveja pro outro, malboros no meio.

Vivi: Vocês viram? Dorival Caymmi morreu né, gente?!

Barata: Amiga...(cara de reprovação que só ela sabe fazer junto com um silêncio para enfatizar seu desprezo) Ele morreu já faz quase uma semana.

E nesse papo mórbido fomos um pouco mais longe. Alguém da mesa soltou "Aliás, eu nem mesmo sabia que ele estava vivo..." E aí sim, desenvolvemos o assunto. Gente como pode? Essa televisão é fogo. Tira e bota quando quer os famosos e as tentativas deles, aí o resultado é que não sabemos quem morreu ou só está na geladeira do 4° poder. O ócio, a cerveja e o humor negro nos permitiu começar a filosofar:

 

"Dercy Gonçalves morreu!"

"Morreu há mais tempo, só que não quis desencarnar e ficou aqui nos assustando com sua boca vermelho mal pintada e seus palavrões."

"O Ary Fontoura tem maior cara de quem já morreu!"

"Verdade! Se ele não tivesse na novela das oito, iria achar que ele já tinha batido a bota"

"Ele e seu protetor*"

"Hahahahaha"

"Gente, o Enéas morreu, né?!"

"Meu nome é Enéééééas"

"Bora ver quem acerta, então. Morreu o Waldick Soriano ou o Cauby Peixoto?"

"Cauby."

"Waldick."

"Os dois não estão mortos, já?"

"Hahahahah"

"Sub-celebridades morrem e a gente não sabe."

"E haja neguinho que deveria morrer logo"

"Faustão"

"Hebe, outra múmia que não consegue desencarnar"

"A Xuxa já tá passando da hora também, bichinha tá ficando estranha!"

"Luciana Jimenez, mesmo tão novinha, tão gatinha, morreporfavor!"

"Ou agora que amarrou o diretor estribado, vai fazer compra, viajar, lançar uma ONG. Tudo menos ficar na tv em canal aberto perguntando o que é um equínio, faz favor?!"

E depois de redescobrir vários defuntos, matar mais uns quinze, e se esbaldar de rir de tamanhas desgraças.

"Chega gente assunto mais fúnebre, melhor mesmo, é morrer esse papo!"

"Hahahahaha"

Adoramostrocadilhosmisturadoscomhumornegro.

Beijomeligaevêsemorre!

* O protetor era um amigo imaginário, uma espécie de anjo da guarda do personagem de Ary Fontoura na novela, A Viagem [super sugestivo, de novo]

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Sonhos e temperos


Por Moara Brasil


Todo mundo deve ter sonhos. Os sonhos são o tempero da vida. É humano sonhar, e quem diz que não tem sonhos é como dormir sem lembranças, sem projetos, sem fantasias, enquanto espera deitado na cama, revirando a cabeça na almofada ao silêncio da madrugada, numa rotina sem surpresas e mistérios. Esperando o fim do mês, para receber aquele salário de sempre, acompanhado de olheiras, e dores de cabeça ao lado de dívidas.


Deixar de sonhar é como perder algum dos sentidos, é viver atrofiado, é viver como um objeto, uma coisa. Um nada. Sem graça, sem sal. Sem alma.


Juliete tem sonhos, é empregada doméstica, mas quer que um dia o filho dela entre  na faculdade de Direito. Um dia ela consegue. Guarda o dinheirinho para ajudar o seu filho e anota todos os seus planos num caderno precioso.


Rose nunca deixou de acreditar que vai encontrar o homem  da vida dela, aquele homem gentil e cavalheiro,  que compartilhará todos os projetos de vida com ela, eternos enquanto dure o amor. Apesar das reclamações de sempre, ela acredita.


Mesmo aquela mãe, que tu enxergas ali, todos os dias, caseira e às vezes infeliz. Ela também tem sonhos, eles ficam guardados, trancados com uma chave dentro do baú. Um dia eles serão soltos, é só acreditar que eles se materializam. Todo sonho é possível.


Cante todos os dias “eu vou conseguir”, como um mantra e agradeça sempre por tudo, seja grato. Os sonhos precisam  ter pernas, elas que fazem andar.E para andar é preciso ter um cérebro que tenha energia para pensar. E mesmo que seu sonho pareça um pouco distante, acredite, ele pode estar tão  perto que nem imaginas.


Não ter sonhos deixa a pessoa careca, deixa a mulher frígida, deixa o homem infeliz. Não sonhar é não viver, é não ter a oportunidade de querer ser tudo aquilo da sua imaginação. Se não sonhas é porque já estás morto, procure então logo o dia e o local do seu enterro. Não sonhar é como viver sem trilha sonora, e comida sem tempero.


Nós nascemos para sonhar, e todos os teus amores esperam isso de ti. Todos esperam ansiosos, e sonhar é um componente da felicidade. Que nem temperos numa comida. Prove todos os temperos, experimente o cominho, a pimenta do reino. Saiba aonde colocar o alho, sinta o cheiro bom do manjericão. Respire o alecrim e  saiba dosar o sal. Faça a comida com todo o amor, corte com carinho a cebola, o tomate, o pimentão. Prove, prove e reprove. Pense no outro que irá comer a sua comida. Ame o outro e faça-o sentir que ele é amado ao servir aquele prato delicioso.


Todo sonho é possível, pois ele já nasce nas idéias e no coração. Basta sonhar e acreditar, depois é só saber o segredo dos temperos e doar todo o amor a sua comida.




Imagem: Ulisses Parente- Belém-PA


 

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Sapatos

Por Lora Cirino

Dia desses, por acaso vi uma foto tua. Não, eu não a tenho, não deu tempo de construirmos nada, mas tu me desconstruíste rápido. Quero colocar a culpa no pouco, quase nada que passamos, mas não dá, pelo simples fato que em muito tempo, tu foste o único que despertou um sentimento tão puro e fofinho em mim, parecia amor. Não! Não posso ser idiota e chamar de amor, eu acho que sei o que é sentir amor, eu já senti! E uma noite de poucas horas não pode definir tal sentimento.

É, vai ver que eu inventei que tu és o que eu quero ter, quero muito. Tento parecer que quero, mas ninguém enxerga isso, ninguém me leva a serio e a culpa é minha, que tentei construir a imagem da independência, toda ela e consegui, que ironia! 

O que eu entendo muito bem é que há muito eu não sentia um beijo tão puro e uma vontade tão grande de cuidar. O sorriso solto nos lábios, o mundo esquecido ao nosso redor. Eu, que criei uma vergonha idiota de demonstrar sentimentos, naquele dia escutei: "e aí, vocês vão casar hoje mesmo ou o quê?". Por mim sim, casaríamos. Finalmente eu havia encontrado alguém, que eu nunca tinha visto, mas que não precisava disso.

Eu sentia vergonha alheia pelos teus sapatos, os mais ridículos que já vi na vida. Sentia um pouco de vergonha pela tua idade, mas não haveria problema, porque nós tínhamos nos encontrado no mundo e de repente éramos a certeza um do outro e não conseguíamos nos separar por nada.

Era estranho ver alguém no meio dos meus conhecidos que eu nunca tinha visto, foi quando eu descobri que nossas fronteiras eram distantes e que a partida era próxima, uma hora aproximadamente. Uma hora. Eu não merecia te conhecer e te desconhecer em uma hora. Em uma hora me deu infinita tristeza e infinita alegria por ter te conhecido. Tu foste o meu entorpecente daquela noite.

Houve promessas e conversas posteriores que se foram como sempre acontece, sem um adeus, uma explicação, nada. Nossos corpos se conheceram muito pouco, nunca ficamos sozinhos, nunca fomos ao cinema, eu não conheci teu avô e nem tu a minha mãe e isso não vai acontecer. Mas eu te agradeço por ter me despertado, mesmo que tão rápido e tão lindo.

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Desaniversário




Quando criança, fazer aniversário era aquela coisa toda de esperar que o mundo girasse a meu redor com os presentes, as felicitações, as surpresas e as pessoas queridas paparicando. Claro, que a melhor parte era ganhar presentes: eu sempre era levada àquela loja de departamentos gigante onde eu podia escolher o que quisesse.ac023e62cbc946434bd52b93ec3a799aafe7a21f_m

Com o passar dos anos a vaidade diminuiu. Não gosto de dizer aos outros que é meu aniversário. Passo todos os dias que antecedem a data lembrando os outros com diretas e indiretas sobre presentes e comemorações e chega no dia, morro de vergonha de receber o simples "parabéns".

Passei a afirmar o mito do inferno astral que antecede a data do meu nascimento e esse ano, parece que o próprio Lúcifer se planejou para executá-lo com maestria em todos os departamentos da minha vidinha, indo desde o "setor" profissional até o sentimental. Rebuliço cósmico planejado para anteceder 24 de setembro de 2008. Caprichado!

Passado o inferno, ficou só o astral. Não esse de gente efusiva que alardeia seus pequenos feitos. Ficou o que fica depois da tempestade. Os destroços e algumas fagulhas de uma esperança que parece, nesse exato momento, ser a última. Mesmo que essa coisa completamente incompreensível chamada de existência já tenha me surpreendido várias vezes, o meu astral tá em cima do muro, tá no fio da navalha.

Não desanimo porque não posso. Fraquejo, sim. Muitas e muitas e muitas vezes. Cometo erros, dou mancadas com as pessoas que mais amo, não termino o que inicio e tenho o péssimo hábito de afastar as pessoas de perto de mim. Receio por fazer o processo inverso: ao invés de tornar-me borboleta, virar casulo de vez.

E hoje está sendo mais um dia que vai ser o primeiro dia do resto de minha vida, mais um recomeço, um start novo, novas metas a meu tempo. O lance todo foi a compreensão de algo bem simples: a gente não possui o tempo.

De nada adianta dizerem que estou mais pros 30 do que pros 20. Cada um tem seu tempo e constrói (ou destrói) sua vida nessas horas, minutos, segundos... sei lá, nessas convenções para aprisionar algo que nada mais é que nascer e pôr-do-sol. O meu tempo pode não está sendo tão ágil como muitas pessoas desejavam e até mesmo como eu previa para o meu futuro.

Lembro de imaginar-me, menina ainda, com meus 26 anos e parecia tão distante, algo bem como "casada, com casa, com filhos, cachorro e periquito". Não foi o que plantei no decorrer desses anos, nem sei se definitivamente é o que quero. Não quero dizer que sou auto-suficiente ou algo do tipo.

Claro que quero um companheiro pra vida toda ou até onde nos aturarmos. Filho eu já tenho. Cachorro também. Mas a conjuntura é outra, entende? Eu quero mais do que isso e foi por abarcar o mundo com os curtos braços que fiz um monte de burradas e me enchi de confiança sem ter criado nenhum tipo de alicerce para me sustentar.

Hoje, eu quero menos. Quero as coisas no seu tempo. Não quero mais sofrer pelo que não foi, pelo que deixei para trás, pelo que está lá morto e enterrado. Não quero mais paixões avassaladoras, quero só me apaixonar por tudo e por todos a cada momento, como curtir uma caminhada num final de tarde ou sentir um prazer supremo em ir ao cinema sozinha (adoro!).

Parece meio papo de mulher á beira de ataque de TPM, toda essa reflexão sobre passado e futuro, sobre insatisfação e expectativa. Mas sempre - e quem me conhece sabe disso - sempre mesmo fui movida a grande quedas, a crises de ansiedade e a insatisfação perene sobre eu e o mundo todo. Desisti de mudar o mundo, até porque vi o quanto o mundo me mudou nesse último ano.

Lembrei do início do filme "Muito gelo e dois dedos de água" agora. Deu-me vontade de contar pra vocês que um dia vocês todos vão ver minhas obras de arte, ler meus best sellers e ouvir minhas músicas, porque tudo que a vida tem me acontecido está aguçando a minha veia artística. Pois bem...

Não sei se ano que vem vou contar para vocês que tomei coragem e montei um portfólio com meus textos e saí oferecendo por aí minhas escritas, em redações de jornais, de porta em porta. Ou pode ser que até lá eu possa ter tido oportunidade para fazer aquele curso de fotografia que sempre sonhei. Ou que tenha dado continuidade nas três línguas estrangeiras que comecei e deixei lá de stand by.

Ou pode ser que esteja na Austrália, surfando (mesmo sem crer que há alguma possibilidade nessa vida d'eu ter coordenação motora suficiente para ficar em cima de uma prancha). Não sei... Pode ser que nada dê certo ou pode ser exatamente que nada pareça dar certo para que no final tudo pareça estar encaixando. O bom é que no auge dos meus vinte e poucos anos, eu descobri que pode... que TUDO pode e não vou mais abrir mão de ser feliz.

Portanto, feliz desaniversário para mim. É muito mais divertido pensar em cada um dos dias que compuseram esses anos todos do que avaliar hoje e só hoje. Vou continuar comemorando todos os dias por estar aqui, viva e em pé até porque é muito divertido ver as pessoas organizando uma festinha surpresa para mim pensando que eu não tô sacando nada....

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