Um belo dia resolvi mudar

Por Anna Carla Ribeiro

* Dia 23 de julho de 2005, veraneio paraense. Belém do Pario, como todo e qualquer final de semana deste mês, é o mais perfeito cenário de uma cidade fantasma.

Domingo. Sempre tive uma raiva abundante do primeiro dia da semana! Que pra mim, aliás, é o último. Duvido que mais de 15% da população brasileira iniciem a semana domingo! E este é o motivo pelo qual as dietas, os trabalhos, e os demais afazeres quase sempre começam na segunda-feira. Desde criança domingo era sinônimo de calor e tédio. Era um dia em que não se podia fazer grandes estripulias pelo simples fato de que na segunda-feira a rotina voltaria ao normal. Tínhamos que passar a véspera sofrendo antecipadamente a chegada dos nossos compromissos. Pra completar, tive um inimigo no colégio com o sobrenome “Domingues”. O cara conseguia me irritar tanto quando aqueles dias repugnantes! O que futuramente resultou em um certo avesso aos derivamos: “Domingos”, “Domiguete” e assim vai...

De lá para cá, as coisas mudaram. A ressaca deixou os domingos da minha vida mais quentes e tediosos do que nunca! É o dia em que é preciso parar de pintar o sete na intensa boêmia belenense para se encher de engov e água de coco. Apesar dos pesares, deixei de odiar os domingos da minha vida e passei a enxergá-los como uma terça-feira, por exemplo: aquele dia que não fede e nem cheira; não vai, nem racha; não fode e nem sai de cima. Seria injusto continuar odiando os domingos. A vida me proporcionou alguns maravilhosos, que até pareciam sextas-feiras e sábados!

Pois bem, voltemos então ao contexto: calor, cidade deserta, domingo. Tudo para ser um dia monótono, sem graça. Onze da manhã, finalmente levantei da cama. Já tinha acordado umas quatro vezes, mas me deixei curtir um pouco mais a brisa no rosto e o macio do lençol enroscando meus pés.

Talvez tenha surgido daí a idéia de fazer um dia diferente.

Sozinha em casa, ou melhor, sozinha na cidade, era melhor arranjar uma companhia que nos últimos dias era ausente: a minha. Comecei a agradar-me pelos ouvidos: som no último volume, só as melhores músicas. Os vizinhos?! Ah, decidi ter um dia para pensar só em mim! Com certeza os poucos gatos pingados que se encontravam no meu prédio não reclamariam de um pouco de vozerio no meio de tanto silêncio.

Quando me vi, já estava cantando e dançando na frente do espelho. Fazia caras e bocas, inventava passos, imaginava situações para contracenar o momento. Ria das minhas próprias besteiras, falava sozinha, pulei na cama feito criança, gargalhei. O coração ficou enorme, a felicidade reinou. Não precisei de absolutamente nada além do que eu já tinha para me sentir verdadeiramente feliz.

Fui para o chuveiro, peguei todos os cremes, condicionadores e outros cosméticos da minha mãe. Os Beatles me faziam viajar por décadas nunca vividas, e me pegava berrando “yeah, yeah, yeah” no banheiro. O "banho de beleza" improvisado mexeu com meu ego, me senti poderosa. É impressionante como toda mulher esquece as crateras na bunda e as rodas de caminhão na barriga quando faz esse tipo de coisa!

Já eram quase 13h quando resolvi almoçar. Ah, a comida também tinha que ser diferente! Danem-se as calorias e as poucas posses que eu tenho até o final deste mês! Eu ia comer o que eu desejasse, e assim foi feito! Pedi uma boa macarronada por telefone, saboreei cada pedaço.

Depois resolvi sentar-me aqui, em frente a esse computador, para contar a mim mesma essa experiência. Foi inevitável refletir sobre alguns erros cometidos. Havia meses que eu sacrificava o meu presente para focalizar-me num futuro perfeito. Havia tempos em que eu procurava a felicidade longe de mim.

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Bárbara

Pela convidada Becky Braga
* Para ler ouvindo Bárbaro Soneto, de Patrícia Bastos.


Ela parou e procurou por uma mesa vazia. Sentou numa que ficava de costas para porta. Não queria ver quando ele chegasse.O garçom veio até ela e entregou-lhe o cardápio. Ela recusou e pediu uma vodca com gelo e tônica.

Acendeu um cigarro. Usava o isqueiro que ele havia dado a ela há alguns dias. Estava ansiosa e pensou que devia ter aceitado quando ele ofereceu carona. Estava detestando ter chegado primeiro e precisar esperar.

O garçom a serviu e ela deu um gole longo. Sentiu o estômago arder. Não era muito de beber.

Sentiu uma mão tocar-lhe o ombro. Fechou os olhos por uns segundos breves, arrepiava-se só de senti-lo por perto.

Ele sentou-se à sua frente e olhou-a com ternura. Tocou-lhe levemente o rosto e num gesto delicado tirou-lhe o cabelo do rosto.

Deram-se as mãos e ficaram a acariciar-se. Falaram sobre como tinha sido o dia, contas de banco, problemas com o computador e outras coisas sem muita importância.

Ele olhou pra ela por um longo tempo sem falar nada, quase violando sua curiosidade com os olhos ávidos, olhos que quase queriam falar.

"Eu senti a sua falta", disse enfim baixando os olhos.

Foi a primeira vez que ela se sentiu calma desde o momento que chegou. Pediram mais bebida e alguma coisa pra comer. Mas sabiam que não estavam ali pra isso. Tudo fazia parte do ritual de tentar iniciar a derradeira conversa.

A conversa sobre aquela relação mal resolvida que não acabava, que não deixava que ela se permitisse viver outras coisas mesmo quando ele tinha uma relação sólida e ela era a outra.

-Eu não posso continuar te vendo. Eu não possso ser desonesto com ela, nem com você. Eu a amo e não vou deixá-la. Você é tudo que eu sempre quis mas é como se tivesse chegado na hora errada. Eu não posso mais, não posso te ver assim... Não posso. Eu não vou te procurar nem quero que me procures.

Ela contempla os olhos úmidos dele com alguma serenidade, sente as mãos frias, trêmulas. Enxuga sua única lágrima e levanta com calma. Ele até tenta impedir mas ela repele.

Chega perto dele, abaixa-se e beija-lhe ternamente o rosto. Ele cerra os olhos, sente o cheiro dela.

Dissimuladamente ela passa a mão no garfo em cima da mesa e crava-lhe na mão esquerda.

O grito dele é mudo e seco.

Sai andando com calma, as pessoas ao redor estão assustadas com a cena. A mão sangra muito. Ela carrega um ar de satisfação.

Ele levanta, agarra-a pelo braço, beija-lhe a boca, a mão que sangra no sexo dela. Um beijo sôfrego, ela agarrada aos cabelos escuros dele, respirando difícil, o choro na garganta.

Sai de lá com as marcas de sangue na saia e ele, aturdido, senta incrédulo. Chora de dor. Mas o que dói, ele sabe, não é a mão.

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Contos de fada (ou do vigário).

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Ela andava afoita pelo futuro. O presente não oferecia novidades, não a estimulava, nem com todas as mudanças dos últimos tempos: mudou do Sul para o Norte, mudou de faculdade, mudou o número do celular e naquele ímpeto de quem quer dar grandes reviravoltas, disse a si mesma que mudaria mais um pouco. Começou uma dieta, deixou o namorado e se jogou na vida bandida, decidiu a felicidade.

Mas aquela vontade de saber mais sobre o futuro a corroia. Porque era presa de alma. Não conseguia dar um passo a frente sem perguntar a dez mil pessoas antes o que deveria fazer e era inexoravelmente maniqueísta. Traçava seu plano maior se baseando no que os outros pensavam e no que era “certo”. E pelo andar da carruagem - porque naquela cabecinha de merda ainda existiam contos de fada com princesas da Disney, carruagens que chegavam à meia noite e amor eterno – tudo daria certo enquanto ela focasse seu viver na pseudo-certeza dos padrões pré-fabricados por outras pessoas.

Foi aí que decidiu cair no conto do vigário. Para saber algo (leia-se mentira ou sinônimos) sobre o futuro, pagava qualquer coisa. Foi num cara que jogava búzios e pagou R$50. E claro, de nada adiantou. Ela logo percebeu que uma criança de quatro anos de idade faria aquela leitura: quando os búzios caiam com a cavidade para cima, era “sim”. Quando era o inverso, a resposta era “não”. Ou seja, porra nenhuma sobre nada da merda de futuro que a aguardava. Depois de uma espera de horas a fio, saber que tudo que o cara mais fodasso no ramo da vidência em búzios conseguia ler sobre a sua vida era aquilo, deu mais raiva ainda.

Aí num impulso de extrema “inteligência”, daquelas inteligências de macaco amestrado para freak show, foi que chegou a Tia Maroca. Ah, que mal faria ir a ela? É apenas uma vidente-benzedeira. Nada demais por apenas R$25 a mais. Agora ia dar tudo certo.

Pensou várias vezes em ir embora, mas como esperar que alguém extremamente desesperado por saber se seu futuro será composto por uma grande paixão, um emprego multimilionário juntamente com um príncipe encantado que chegue num cavalo branco, seja sensato? Não há como.

Por isso, continuou remoendo seus sonhos impossíveis de hight society e esperou. Meia hora, uma hora inteira, uma hora e meia, duas horas ... e finalmente, o fim da espera chegou depois de duas horas e meia de espera. Não tendo aproveitado nada de sua experiência anterior com o cara dos búzios, acreditou que aquela espera toda era um sinal de que a tal da Maroca era fogo na roupa, acertava tudo sobre tudo. Sentiu-se aliviada e pensou: “ – Agora vai.”

E foi. Só não sabia exatamente o que tinha sido. Ficou em dúvida se aquilo era piada ou pegadinha. Ela lavou a cara na pinga assim como a senhora carinhosamente ordenava - enquanto a chamava de “fia”. É tão mais aconchegante quando numa situação difícil, as mulheres deixam aflorar seu espírito maternal, não é mesmo?! – e ficou parada, tensa, enquanto a Tia Maroca baforava com vontade na sua cara e ao seu redor uma fétida fumaça de charuto de septuagésima categoria. A garota só pensava que logo, logo acabaria e brevemente aquela humilhação toda se pagaria. Ela saberia até quantos milhões teria na sua conta bancária conjunta com seu marido velho e multimilionário. Foi quando ouviu:

- Pronto, “fia”. Pode ir.
- Ir para onde?
- Ir... pode ir. Você já tá benzida e protegida, “fia”. São “vinte e cinco real” pra benzer, certo?
- Certo...

E para quem gostava sempre do certo, teve o que merecia. Pagou a grana e saiu de lá atrasada para a faculdade. No caminho, duas motos a perseguem e depois desse sarro que os orixás e oxalás tiraram com ela – ou ela mesma tirou consigo indo atrás do que vem a nós por seus próprios meios -, pensou que só podia ser assalto. Pisou fundo no acelerador e foi embora, furando o sinal que estava tão ou menos vermelho que sua cara de ódio da vidência e de si mesma.

Ela só não contava com que as motos fossem dois guardinhas de trânsito que a pediam para parar o carro. Foi nesse momento de “grande percepção” que resolveu fazer o que os ditos cujos pediam e pensou em rezar para alguém que inspirasse maior confiança do que búzios ou cachaça , mas não teve coragem.

Seria demais pedir a Nossa Senhora ou para alguma santa que a protegesse enquanto ainda estava impregnada com aquele odor de terreiro de macumba. Mesmo assim rezou: pediu com bastante veemência e resignação que, de alguma forma, os guardas de trânsito tivessem problemas de olfato e não sentissem a extravagante essência de caninha barata. Funcionou e bem melhor que seus neurônios, pelo jeito.

A partir daí, ela nunca mais procurou saber o que vai ter para o jantar ainda na hora do almoço. Decidiu pintar seu cabelo de outra cor e o cortou, temendo algum dia na vida ser reconhecida por qualquer pessoa que a tivesse encontrado no dia das tais missões adivinhatórias. Jogou fora as roupas que usou no fatídico dia e comprou um banho de ervas o qual disseram que é ótimo para tirar urucubaca de olho gordo. Como se pode ver, a menina operou grandessíssimas mudanças em sua vida.

Só não muda uma coisa: todo final de tarde, a bela garotinha de mais de vinte anos de idade se senta à janela na esperança de que apareça uma fada madrinha e a leve para fazer compras no shopping center mais “bombado” da cidade. Assim ela poderá jogar suas tranças e esperar seu príncipe encantado de idade avançada e um dote bem dotado resgata-la do caritó.

Ela senta à janela e espera... e continua esperando... pelo futuro.

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Chega de amor bandido, baby!

Cinzas (1894), Edvard Munch. (Expressionismo)
Cinzas (1894). Edvard Munch (Expressionismo)


Por Moara Brasil

"Ai, que saudade, simplesmente saudade, de amores puros. Eu não quero e nunca quis amores bandidos para sempre", e quem quer? Nem mesmo aquele puto que te liga todas as noites, só para querer esse teu corpo, nem ele quer esse amor bandido, mesmo que seja contraditório em suas atitudes, mas no fundo, bem ali no fundo, sonha por um amor que não seja imundo. Podem até dizer que o Mal do século é a solidão, que isso? Podem até dizer que é uma fase de curtição, que isso? Cansa! Ei, tem alguém aí? Tu realmente gostas disso?

Atire a primeira pedra quem nunca sonhou com aquele amor conquistado só no olhar, nos arrepios só de tocar na pele. Pêlos atiçados com beijos leves em todo o corpo.

Ah! Nem mesmo aquele bando, que parece ser tão livre, tão “nem aí” para tudo, tão cheios de parceiros, tão amor moderninho. Mas é aí que eles se perdem e se encontram, nessa vontade louca de ter um amor puro, quando a solidão bate na porta aos domingos. Nem vem! Bate sim! Ainda mais quando chove e a rua fica sossegada, batendo um silêncio aterrorizante. De doer nos tímpanos. E o que tu fazes? Pega o celular, ou liga aquele tal de MSN, para conversar ou sair com os amigos. Solidão, baby.

Ah! Que isso? Beija-te numa noite e no dia seguinte beija outra. E na maior cara lavada, volta para a primeira sem pedir licença. É legal, é divertido, é bom para curar paixões abandonadas por aí. Mas são boas essas curtições eternas enquanto "duro", afinal, cansa. E deixam as pessoas loucas e frustradas, com olheiras e ainda pisoteadas, abandonando potenciais amores numa gaveta cheia de teias e dores.

Quem numa noite nunca beijou uma boca e quis outra e mais outra? Normal, é natural, é legal, é demasiado humano. Mas é legal parando por ali. Depois tu te escondes no banheiro, e grita “Quero uma merda de amor para mim!”. Com a maior cara de choro.

Tu vais querer os corpos mais lindos, para colecionar naquele álbum, e contar para todas as tuas amigas e amigos as tuas rápidas conquistas. Vais te apaixonar e vais querer justamente aquele que não quer nada contigo, é certeiro, é isso. Vais chorar aqui no meu ombro, e suspirar "eu só quero alguém que me entenda". É isso, amor puro, baby.

Ah, quem nunca desejou uma companheira querendo a amiga dela e transar com aquela gostosa ali? Normal. Natural. É demasiado humano, mas tu te cansas por ali. Porque é necessidade, é sexo, é suprir desejos do momento, é que nem comprar uma mercadoria que tu usas, abusas e depois fica velho, joga fora. Porque só serviu para isso. Apenas use e abuse, baby. Faz bem para a pele, mas a pele envelhece um dia, baby.

Amor é um livro, já dizia Rita Lee. Mas não esse amor bandido... é o amor, puro, amor. Aquele que a gente compra, não pela capa, mas pelo conteúdo. E se entrega para ele numa fantasia em realidades. Esperando as novidades do próximo capítulo.

Atire a primeira pedra quem não quer um amor assim? Não precisa casar, não precisa ainda ter filhos, precisa apenas sonhar, compartilhar pizza e refrigerante no sofá da sala, ou passear naquele lugar tão desejado pelos companheiros. Ah! Chega de amor bandido, baby! Até a puta um dia cansa, e sempre tem o cliente preferido.

Inspirada numa conversa com a querida Vivi.

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Depois dos vinte

Por Anna Carla Ribeiro

* Texto inspirado na crônica "Vinte e poucas coisas sobre os vinte e poucos anos", de Sofia Brunetta.

É, pela Constituição Federal, você já é adulto. Mais isso não significa que deixe de gostar dos desenhos da Disney, de bolas de gude, de pular em cima da cama quando está animado (mesmo que isso te traga um certo prejuízo, afinal de contas, são 34kgs a mais), de querer brincar de cuspe à distância depois de um esporro do chefe, e muito menos deixe de ter atitudes mesquinhas, mimadas, descontroladas e irracionais.

Depois dos vinte, você já pode percorrer mais precisamente os seus sonhos, mesmo que eles se modifiquem a cada dois meses, pois já entende que saindo de algum lugar sempre se chega a alguma parte.

Depois dos vinte, você já se apaixonou inúmeras vezes, e sabe que não interessa quantos anos você possa vir a ter, sempre que estiver nesse estado, voltará a ser mais burro do que quando estava no maternal. Também ainda não entende direito o amor, mas acaba percebendo que mesmo aos cento e dez, será complicado defini-lo.

Depois dos vinte as suas nádegas já sentiram o asfalto quente e todo o seu sangue resolveu visitar as bochechas, quando por ventura a lei da gravidade resolveu entrar em ação conjunta com a casca de banana. Já engoliu criações de búfalos ao invés de sapos, já sentiu o coração querer ficar anão numa despedida, já virou melhor amiga de Murphy, já entrou em mais encrencas do que a Maria do Bairro, já colecionou mais “nãos” do que a sua lista de namorados. Também já provou a amargura de uma desilusão amorosa, da falência de um projeto que te custou inúmeras caixas de Tylenol e de um feijão azedado.

Depois dos vinte, você sabe que existem pessoas que deveriam ser indicadas ao Oscar pela brilhante atuação que fazem na vida real, sabe que seus pais são tão humanos quanto você. Sabe que o governo, os Estados Unidos, os outdoors, as suas amigas, as andorinhas, as mensagens subliminares e a mídia te manipulam e te influenciam (e, talvez, você só tenha começado a fumar porque viu a Mel Lisboa acabar trinta e sete carteiras de Carlton na ultima minissérie).

Depois dos vinte, você descobre que afogar os problemas na cachaça não valerá a pena, mas sabe que tomar uns porres de vez em quando ajuda a relaxar. Também descobre que chorar pela pinga derramada não resolverá nada, mas tem horas que é necessário. Descobre que amigos valem mais do que todas as cifras dos Bancos Suíços, mas que viver sem um boró no bolso é uma verdadeira porcaria.

Depois dos vinte, você já visitou paisagens incríveis, arquiteturas surreais, o Rio de Janeiro, raves, pagodes, pubs, botecos e bilhares cheirando a Ypioca. Mas ainda é pouco, pois você já aprendeu que desvendar o novo é, no mínimo, interessante.

Depois dos vinte, você já fez teatro, ballet, sapateado, flauta, fotografia, tae kwon do, musculação, yoga, kumon e dança do ventre. E mês que vem quer se matricular no pilates. Também já é uma boa enciclopédia: sabe falar de Chico Buarque, da Guerra da Bósnia, da era do rádio, de psicologia infantil e já é pós-doutourada em acne, metabolismo, dietas e hormônios.

Depois dos vinte, você entende que existem pessoas que a beleza supre o espírito, e que tem outras que o espírito supre a beleza. Também entende que não importa se a sua melhor amiga for sem pescoço e possuir meio metro de nariz: você sempre a achará incrivelmente bela.

Depois dos vinte você já se achou, se perdeu, se achou novamente e descobriu que ainda se perderá outras mil vezes, porque a cada ano que passa, mais em mutação estará o seu espírito. Ainda não entende muito bem esse tal de destino, mas até que acha ele boa gente. Desconfia das cartomantes, mas já foi em uma que acertou tudinho.

Mas talvez, a maior descoberta de todas, é quanto à felicidade. Depois dos vinte, já sabemos que não precisamos procurá-la, se a mantivermos em nós mesmos. E mesmo sabendo disso, ainda assim passaremos por situações em que perderemos o chão e todas as paredes. A vida é assim mesmo, passamos anos construindo, tijolo por tijolo, a nossa construção. Aí vem uma ventaria e destrói tudo. Então pegamos novos tijolos e voltamos a levantar nosso terreno, dessa vez com mais proteção.

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O desencontro de um Amor à francesa

Por Moara Brasil
Dedicado ao querido David C.

Charpentier acordou belo ao meu lado, com toda a beleza francesa que uma mulher deseja de um homem. Aquele cabelo tipo moicano, porém, meio diferente desses moicanos que enxergamos por aí, um moicano francês, num rapaz branquelo, de 28 anos. Charpentier acordou e me fez sorrir, mesmo com aquela cueca boxer verde e amarela, que eu até achei bonitinha, coisa de gringo, sabe.

Não sei, acho que era a bunda, uma graça. Ou era o cabelo mesmo? Ou por ele ser formado pela Escola de Belas Artes de Paris? Um artista completo e bom de cama, eles sempre têm uma coisa a mais. Gringo, cérebro e charme. Nossa! Eu admirava cada parte do corpo dele, como uma adolescente apaixonada. E eu tinha acabado de sair de uma relação desgastante, Charpentier apareceu em boa hora, como um anjo, que por ser piegas, caiu do céu. E não deixou eu sofrer mais que uma semana pelo outro, até consegui esquecer aquele meus outros dias tristes.

Pensei, ao acordar do lado daquele homem, que seria o último dia em que nos veríamos, o ultimo dia do nosso mês extremamente intenso e apimentado. Nessa hora, contive minha vontade demente de chorar, guardei de baixo da almofada… Eu não precisaria chorar por causa disso. Sou forte, ora. Tive a idéia de seqüestrá-lo eternamente para a minha vida, pois nunca tinha vivido algo tão recíproco e verdadeiro. E nem falávamos a mesma língua, ele se esforçava num portunhol, e eu num portuglês. Juntando tudo em gestos e mímicas. Charpentier amava até o meu jeito desastrado, de colocar a calcinha do avesso. "Você, menina boba, você".

Planejei. E se eu prendesse-o na cama com as cordas da minha rede? Ele perderia aquele vôo para Macapá- Cayena, e de Cayena-Paris. Bem, eu sei que isso o faria ficar um pouco puto comigo. Mas pelo menos teria mais uns dias ao lado do francês, porém, eu já havia adiado bastante a viagem dele anteriormente, e não havia como adiar mais. Ele já tinha adiado, só para ficar comigo, mais uns dias para quem ia ficar só um mês.

Conheci o Charpentier numa festa, num trapiche da cidade. Naquele dia não queria sair do meu quarto, mas minhas amigas insistiram. Falaram que eu não deveria me entregar àquela paixão fracassada. Mas logo show de reggae? Vocês sabem que eu já não gosto muito de reggae, e ainda mais quando estou assim, triste. Parecia que eu ia morrer de tanta desilusão amorosa. Mordi a língua, e hoje até sou devota do reggae.

Só que eu fui, e conheci o francês. Naquele mesmo dia ele foi para a minha casa e lá se hospedou um mês e mais uns dias. Minha família o amou, meus irmãos mais ainda. Meus amigos, também. Ele era o verdadeiro homem que faltava para a minha vida, um relacionamento definitivamente saudável, mas Charpentier já ia embora, em breve, eu sabia. E procurava não lembrar muito disso.

Acordamos um do lado do outro, nos olhamos, sorrimos. Aquele último sorriso, um sorriso feliz demais por um encontro de almas gêmeas, nesse fim de mundo maravilhoso, que é Belém. Levantei, como uma mulher forte, e cantei: “Você me faz ter medo da minha condição, você me trás segredos, e eu não te entendo mais”, Mombojó foi trilha sonora. Tomei meu banho, e voltei ao quarto, ele estava colocando as milhões de redes que havia comprado na feira do Ver-o-peso, numa mochila enorme. Ri um pouco do momento, isso era engraçado, para que tantas redes? Poderia não significar nada para mim, mas era só o que ele estava levando de lembranças daqui. E ainda comprou uma rede que faltava, uma azul e branca ( bem Papão) que ele tanto queria, arrumamos as trouxas, e fomos com o meu irmão no ver-o-peso. Achamos a tal rede, e seguimos ao aeroporto.

Eu estava no banco de trás, e ele na frente, pediu desculpas ao meu irmão e pulou para o meu lado. Os últimos momentos de abraços, de brincadeiras, de milhões de beijos em todo o rosto. E eu trancando a dor daquele dia especial de agosto.

Aeroporto, aquela fila, ele já estava um pouco atrasado, pegou a câmera dele, de filmar e repetiu “estou mutcho triste que la máquina fotográfica minha foi roubada, nossas fotos, suas fotos, lembranças de você, estou triste”. E fez a ultima filmagem de nós dois, sorrindo no aeroporto, brincando um com a cara do outro. Só restaram algumas cenas. E foi rápido, me deu um beijo, nada muito romântico. A comissária de bordo apressava. No entanto, ele me acenou lá do corredor, que vai para o avião, e mandou aquele beijo, que eu já sabia ser o último… Mas não o último beijo de amor. Depois, não me contive, e chorei no carro, e o choro foi pior que qualquer outra dor por alguma relação que eu já tive. O choro por algo que poderia ter dado certo, mas o destino nos abandonou naquela dia especial de agosto, e eu, fiquei com uma pequena esperança que o amor pode existir outras vezes.

Vídeo gravado no Pará e no Maranhão, feito por Charpentier.




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Melhor ir dormir

Por Anna Carla Ribeiro

Ah, a sexta-feira. O dia em que nós, seguidores do tribalhismo e procedentes do malandro equilibrista brindamos a origem da vida, divulgamos o novo corte de cabelo e, de queda, gargalhamos pelas cifras perdidas entre grades e latas de cerveja quente. Ultimamente tenho acordado deslumbrada nas sextas-feiras. É o dia em que eu bato no peito e brindo à minha liberdade e às piadas dos meus amigos. Afinal de contas, perdi muitos “dias sagrados” da minha vida encolhida em um sofá de meio metro comendo pizza de caixa.

Para a minha sorte, as circunstâncias me tiraram deste sofrimento e nunca mais me fizeram ficar sem graça ao ouvir os comentários sobre a noite anterior – sempre a melhor de todo o espaço sideral – em sábados de almoços com as amigas. Já parou pra perceber que justamente na época em que finalmente você consegue virar um ser caseiro (leia-se na coleira), todas as suas amigas estão desbravando o mundo, conquistando nações e se divertindo trinta vezes ao cubo por segundo? É o Murphy, meu bem. Mas depois eu falo nele.

Sextas-feiras são assim. Sempre cercadas das melhores maquilagens, roupas, olhares, lugares pra sair. É o dia em que finalmente conseguimos mandar dar cu o chefe, o cheque e aquela vizinha clone do Franquito Lopes, que sempre consegue te tirar do sério no infinito caminho da porta da sua casa até o carro. É aquela sensação maravilhosa de se estar aproveitando tudo ao máximo, é sentir a jovialidade em cada sopro de brisa. É o meu dia. E do Zeca, do Zé e do seu Oswaldo trabalhar, coitado. Deve ser foda ser garçom.

Tudo é alegoria. Alegria, alegria. Com direito a mentiras sinceras e Chiquinho gritando “Eu vivo bem sem amar a ninguém”. E viva o ôba-ôba! Sandálias eletrizantes, hormônios à flor da pele e tímpanos poluídos.

Maravilha.

Hoje é sexta-feira. Atípico dos últimos meses. As coisas mudaram, eu mudei. Fui do céu ao inferno em milésimos de segundos e agora pareço estar nos dois lugares ao mesmo tempo. Na esquina da fossa com a mocidade. Cansada e sozinha em casa. Pensei em ligar pra alguma amiga me fazer companhia. Seria uma distração. Penso, penso, penso. Desisto da idéia egoísta de estragar a sexta-feira de algum ser amável e solidário. Já basta a minha. Tento ler e acabo assistindo Homem Pássaro comendo palmito. E assim, como que de relance, me aparecem as Spice Girls sussurrando ao pé do meu ouvido: “Easy lovers, I need a friend...”.

De repente, me deu uma saudade de me retorcer novamente naquela cama de anão. Leve vontade de ter alguém disposto a dividir um saco de pão de queijo de supermercado e conversar sobre astros, geografia, ginástica e a guerra da Bósnia. Me lembrei de como é legal ter um colo e uma companhia para dividir os sonhos, alguns perdidos, outros realizados.

O ruim da boemia é a superficialidade. É estranho ter enjoado tão cedo dela. Claro que amanhã mudarei de idéia. Ah, melhor eu ir dormir.

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Amor ao amor

Por Lora Cirino

Ainda lembro como era, lembro mais ou menos, mas lembro. A gente se olhava bem forte e dava vontade de sorrir, tocar era a melhor coisa do mundo, segurar na mão. Andar de mãos dadas me trazia força e segurança. As festas tinham mais graça, elas terminavam em amor. A gente se divertia junto até tudo acabar e voltava para casa. Se eu acordasse de repente assustada, tinha certeza de te ter ali. Aqueles telefonemas, só para saber como cada um estava, eram gostosos demais, como já disse, eram certeza.

Hoje ouvi de uma amiga que ela está apaixonada e sendo correspondida, como me deu alegria por ela, que já não mais sabia o que era isso e saudade de ter isso também. Logo eu, que nunca soube viver sem você. Realmente era tudo mais cafona, só que mais gostoso. Tenho medo de ter desaprendido a te ter, medo de verdade, já confidenciei isso para algumas pessoas. As dores que passamos juntos, as brigas, as reconciliações. Que saudade do teu cheirinho, do teu gosto e de fazer amor contigo.

Morro de medo confesso, medo de nunca mais te sentir. Acreditas que eu já fiz força pra te sentir e não consegui? Obriguei-me a te ver em algumas pessoas, mas não era verdade, logo descobri. Caramba! Será que para sempre vai ser assim? Sem ti, sem aquela graça que a vida só tem contigo? Será que a parte mais delicinha da vida agora vai ser sempre monótona, chata, sem graça? Cadê o encanto de passear, de se bastar?
Volta pra mim, meu bem, eu morro de saudades de ti. De ter as palavras certas, de achar lindo teus defeitos, de conhecer cada poro, cada sinalzinho no braço, de dormir nos teus braços e sentir o cheiro da tua respiração. Eu quero me confundir contigo, com a tua família, invadir a tua casa, dividir a tua mãe. Sempre adorei sogras, não é agora que isso vai mudar.

E tu sabes que eu sou bacana, tu já me conheces e me experimentastes mil vezes. Eu não atrapalho teus estudos, entendo teu trabalho, teus horários, sou fina quando tenho que ser, sei me portar, me vestir e quando tem que cair na vala e beber até de manhã, eu também faço isso contigo.

Eu faço amor na rua, no estádio de futebol, em cima da árvore e dentro do mar, basta que queiras e me chame, já estou lá. Sabes que eu amo te ter, que eu amo te amar, amor.
Então, volta pra mim o mais breve possível, tu não vais te arrepender. E me ama, com a mesma intensidade, compreensão e tolerância que eu vou te amar.
Sei que sofrer de amor dói, adoece, sei bem, mas pior é não ter nem pelo que sofrer. É oco!

Carta ao amor, sobre o medo de nunca mais amar.

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Vidas paralelas


Por Antonio Carlos Monteiro

Nos idos de outros tempos, tive que assistir a um filme, para fazer um trabalho de uma matéria que não suportava... Fala de inconsciente... Assuntos tratados pelo velho Freud... E fiz por fazer, como alguém que cumpre uma obrigação e só...
Hoje relembrei desse dia, do tanto que praguejei da raiva que senti em ter que locar aquele filme disparatado... Pareciam um monte de malucos que dormiam e acordavam numa história histérica e sem sentido, avançando e retroagindo cada vez fazendo menos sentido...
Buscando uma analogia com o que vivo hoje, começo a observar que vivo em duas vidas paralelas... Não que eu esteja ficando louco, apenas alguns pensamentos e momentos preponderam sobre outros...
É como se a minha vida normal fosse cortada, em vários momentos, por outra até então desconhecida, mas que viajo tentando decifrar cada espaço ainda escuro...
E assim tem funcionado meus dias, me pego várias vezes com a cabeça longe, esqueço algumas coisas que fiz, outras faço de maneira automática sem pensar ou por instinto...
Alguns pensamentos fixos, um em especial... E esse me remete ainda mais a uma história apenas explicável se eu de fato considerar a existência de um mundo paralelo...
Refiro-me a saudade de alguém a quem apenas tenho acesso ao sorriso e umas poucas dúzias de palavras... Como pode?
Por isso hoje defendo essa vida paralela, acredito nela, tenho certeza que nos meus constantes momentos de branco viajo pra lá... Talvez lá possa conversar e rir exaustivamente de tudo que se passa, possa ser inteiro sem ser censurado, amar e ser amado a mesma e fiel medida...
Talvez lá e por enquanto apenas lá encontre o descanso, a paixão, a tormenta, a tempestade, o temporal, o sol, dunas, mar, sal, rio, doce, amor... Tantas coisas ambíguas, que se completam e se significam... Da mesma forma que faço com minha vida paralela até o momento de ser una.

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O tal do caritó



Costumo ouvir de “tias” mais experientes (leia-se mais velhas) - sendo essas casadas, separadas, amigadas ou viúvas – que vou acabar no caritó. Nem sabia o que era isso, mas pela força do hábito repetia que estava lá, no tal do caritó. Até o dia em que surgiu o questionamento.


Oh, céus! Será caritó uma comunidade longínqua no sertão árido do Nordeste??? A tal palavra nem estava no dicionário e isso sinalizava que a coisa estava feia pro meu lado. Até que das profundezas do mar sem fim, tive a brilhante idéia (eureca!) de fazer o que sempre faço: jogar no google, meu bem.


Eis que me deparo com este deleite. Um texto datado de 1959, da extinta revista Cruzeiro – publicação a qual eu só ouvi falar – da escritora Rachel de Queiroz. O bacana mesmo de encontrar pérolas como essa é que a gente pode perceber que algumas coisas no mundo não mudam.


Em pleno século XXI, minhas tias continuam achando que estou no caritó porque tenho 25 anos e não casei ou sofrem com a incompreensão de pensar numa “menina tão inteligente e bem educada” que ainda não conseguiu “laçar um bom partido”.


Bem, Rachel, concordo com você. A gente hoje põe o pó na cara não só para ir à janela a procura (ou à espera) de um bom partido. A gente enche a cara de maquiagem porque fica mais bonita ou pelo menos pensa que fica. E porque além desse detalhe que inflama a alma das mulheres com o pecado capital preferido do capitalismo, a vaidade, nossa make up tem vitamina e filtro solar. Tá, meu bem?



Resumindo: ainda vale a máxima de que as meninas boas vão para o céu. E as más, as que têm gingado nas cadeiras e malícia na cabeça, vão para onde quiserem.
Aí vai o texto para quem quiser saber o que a modernosa Rachel de Queiroz tem a dizer sobre o caritó!


“E tira o pó, Vitalina,
Bota o pó, Vitalina,
Môça velha não sai mais do caritó”
(cantiga popular)

Vitalinas



Da Bahia para o Sul, pouca gente saberá o que é vitalina e o que é caritó. Caritó é a pequena prateleira no alto da parede, ou nicho nas casas de taipa, onde as mulheres escondem fora do alcance das crianças, o carretel de linha, o pente, o pedaço de fumo, o cachimbo. Vitalina, conforme a popularizou a cantiga, é a solteirona, a môça-velha que se enfeita - bota pó e tira pó - mas não encontra marido. E assim, a vitalina que ficou no caritó é como quem diz que ficou na prateleira, sem uso, esquecida, guardada intacta.
As cidades grandes já hoje quase desconhecem essa relíquia da civilização cristã, que é a solteirona, a donzela profissional. Porque, se hoje como sempre, continuam a exisitir as mulheres que não casam, elas agora vão para tôda a parte, menos para o caritó. Para as repartições e os escritórios e os balcões de loja, para as bancas de professôra, e até mesmo, Deus que me perdoe, para êsses amôres melancólicos e irregulares com um homem que tem outros compromissos, e que não lhes pode dar senão algumas poucas horas, de espaço a espaço, e assim mesmo fugitivas e escondidas.
De qualquer forma, elas já não se sentem nem são consideradas um refugo, uma excrescência, aquelas a quem ninguém quis e que não têm um lugar seu em parte nenhuma.
Pela província, contudo, é diferente. Na próvíncia os preconceitos ainda são poderosos, ainda mantêm presa a mulher que não tem homem de seu (o “homem de uso”, como se chama às vezes ao marido...) e assim, na província a instituição da titia ainda funciona com bastante esplendor. E o curioso é que raramente são as môças feias, as imprestáveis, as geniosas, que ficam no caritó. Às vezes elas são bonitas e prendadas, e até mesmo arranjadas, com alguma renda ou propriedade, e contudo o alusivo marido não apareceu. Talvez porque elas se revelaram menos agressivas, ou mais ineptas, ou menos ajudadas da família na caçada matrimonial?
* * *
Não sei o que dirá disso a moral tradicional, mas creio que, felizmente, a existência da vitalina, mesmo na província, já anda perto do fim. A instituição da “môça livre” ou da “mulher de carreira”, segundo os modelos da América e da Europa, já tão bem copiada no Rio e em São Paulo, é uma tentação muito grande. Qual a môça que tendo possibilidade de viver do seu emprêgo, no seu próprio apartamento, onde, se lhe falta o aconchego do marido, restam sempre os consolos da liberdade, qual a môça que escolherá viver de favor em casa do irmão, sob a tirania da cunhada?
Será um mal a substituir outro, dirão. Pois bem nenhum sairá dessa nova liberdade. A isso não respondo, que não sei: o que posso dizer é que será, de qualquer jeito, um mal muito menos melancólico.

racheldequeiroz






Para ler na íntegra, acesse: http://www.memoriaviva.com.br/ocruzeiro/19091959/190959_7.htm

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Fogo e ar

Por Aimeé

Porque tu és fogo e eu sou ar. E dizem por aí que ar faz o fogo aumentar, faz o fogo correr mais longe. É verdade que o ar expande o fogo.



Não podes me prender porque nem sequer podes me ver, mas me sentes com a pele e suplicas por mim cada vez que abres tuas janelas, tuas portas, tua camisa e tua alma para mundo. Perguntas por mim em cada um desses momentos, mesmo sabendo que não adianta clamar por mim. Chego quando quero. Não dependo da tua vontade, nem da tua intensidade de me querer. Posso ser mais intensa à noite, posso causar rebuliços, derrubar tuas coisas, quebrar os vidros que te cercam e mesmo tão esperada, certamente incomodarei. Desmarcarei a página do teu livro como uma súplica para te pedir atenção.



Tu és o fogo. Aquele que arde, queima, incendeia e o faz porque assim é da tua natureza. Vais queimando e corroendo todas as minhas esperanças perdidas. Renovas meu sorriso, minhas manhãs, meu paladar e minha cabeça com teu calor. Causas-me um fogo interno, que faz com que minha face fique rubra. Trazes-me essas cores vivas, essa sensação de vida, de força, de coragem, de vontade em seguir em frente porque tua chama hipnotiza a quem quer que seja. Deve ser por isso que cresci ouvindo para não brincar contigo assim, à toa.



Talvez seja por isso que foste o primeiro entre tantos – e digo tantos, tantos, porque me queres assim, complicada, ácida e quase cruel quando te digo que foram muitos e muitos tantos outros antes de ti – que me pediu calma. Vagarosamente, me pediste que eu diminuísse meu ritmo, meu querer intenso. Viste que eu só sabia ser assim e me levaste pro teu fogo de ser dominador.



Então, por mais que não consigas me aprisionar, sei que precisas dessa minha força. Eu permito a partir de hoje e para todo e sempre seja lá até onde esse sempre vai dar ou o que signifique, que minha força te conduza a todos os caminhos porque te quero agora como meu próprio caminho. Selamos então um pacto: tu serás o meu fogo e eu serei o teu ar.

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Olá gente!

Bem, como as reclamações por melhorias na organização do blog foram muitas, estamos tentando mudar de acordo com o nosso conhecimento medíocre em configurações de blog.
Mas como vocês podem notar, aqui do lado direito ----> tem os textos organizados por cada autor, e o nosso arquivo por mês. Quem quiser, pode visitar os nossos textos antigos numa boa.
Além disso, tem nossos vídeos prediletos no Vodpod (atualizamos semanalmente com novos), ultimos posts, os comentários da galera, os textos mais lidos, nossos blogs e sites prediletos e o meebo (que você pode conversar on line com a gente).
Estamos em busca de pessoas que entendam de templates, para dar uma nova cara ao blog, quem quiser ajudar, "tamo dentro"!
E lembrando, o blog Ohvarios é um lugar que começou reunindo textos de 5 amigas, de Belém, sendo que atualmente uma mora em Macapá e outra em Manaus, e por isso mesmo foi criado para matar a saudade de cada uma das amigas Guerreiras. E hoje é aberto para convidados, que tem sido um espaço democrático e até mesmo "terapeutico" para alguns. Obrigada Lucas, Vivi, Antonio, Gonzalez, Maira, Raoni e John, vocês sempre são bem vindos!


Abraaaços!

Das ohvarias!

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Todos os homens são da Paty (histórias de João)

Por Moara Brasil


A Patrícia chega assim "causando" em qualquer lugar...Tem a mania terrível de achar que quem olhar pra ela “tá afim”. Vive mostrando para os que ela julga seus "amigos", mensagens dos seus machos, ou que fulano de tal ligou, e que o mauricinho “tá na área” . Ninguém se mete com a Patrícia! Aliás, ela só fala nisso. Não tem outro assunto. Não tem outro papo. Sabe aquelas meninas que a gente até tenta algo, mas cansamos rápido só de pensar? E pior que ela é tão bonitinha, rostinho legal, se veste até bem e é cheirosinha. E eu, João mané, sou o seu consolo.

Mas é difícil, eu confesso, só esse óculos Dolce Gabana não me encanta. Essa empolgação dela de dizer que gosta de Nirvana, realmente não me convence. E a coleção de calcinhas da Victoria Secret´s, nem são tão sexys assim nela. Sabe aquelas “menininhas” que tomaram danoninho na boca? Que nos quinze anos, além de um “puta” quinzola, também viajaram para a Disney? E isso não foi nenhum sacrifício do bolso dos pais dela...

Ela tem aquele carrinho da moda, e é a sua grande estratégia para levar qualquer garoto como eu para os momentos vazios da vida da Patricia. A pequena é filha de familia nobre da cidade. Os seus pais sempre estão nas colunas sociais dos jornais.

Ela sempre tem algum homem na sua rotina, tem todo mundo e não tem ninguém. É solteira, e assim permanece. Mas ela é a pior das solteiras: aquela que realmente não sabe o que é ser sozinha de verdade. Um dia desses, a Patricia veio me falar que a sua mãe estava preocupada por ela está tanto tempo sem arrumar namorado. E eu, João mané, querendo a loirinha, mesmo assim. Mas ela nem tchum pra mim.

Não demora muito, e lá vem ela. Com o perfume Chanel º5, que atrai a macharada. Tão linda, tão pequena e sorridente. Sorrir para todos numa elegância atrapalhada. Os homens até gostam, mas se afastam rápido. Eu gosto dela, até curto essa fineza toda, eu realmente gosto dela. Mas quando ela vem falar que está triste, que o mundo não a entende. Dá vontade de sair dando soco na cara bonitinha da Patricia!

Ela é jogadora, e daquelas jogadoras para ganhar e depois pisar. Pisa Paty.!Pisa!
Eu falo que ela é jogadora, mas a baixinha não entende. Eu sou um mero integrante do jogo da vida dela. Ela acha que os homens são os grandes culpados da sua dor de cabeça crônica. Descobri que a Paty tem uma identidade pertubada, daquela que tem múltiplas identidades, e não conhece nenhuma.

Uma hora Patrícia é roqueira, e coloca pulseiras pretas com aquele vestidinho vermelho legal. Outra hora ela resolve virar garota do reggae, e mete aqueles montes de fios no braço e uma rasteira. Depois vira minimalista, e não gosta de nada. Só de frequentar os melhores restaurantes da cidade. Outra hora, ela se esquece dela e coloca qualquer blusa do armário, a mais velha, e vai passear por aí...

Toda vez sempre a mesma história: “porque o Paulinho fez isso”, “porque o Julio é um leso”, “não vou pegar o Ricardinho porque não quero”. E eu, João mané, sempre ouvindo, mesmo que contra a minha própria vontade, as mesmas histórias de que todos os homens são da Paty. E eu também sou dela, zé mané.

E os caras até que são bonitos, mas ela fala sempre que eles não servem. Ela é jogadora, isso sim. Talvez eu seja o único que perceba.

Se tem um rapaz sarado na área, chegou na festa, ela é a primeira a se encostar, nem que seja só para conquistar o menino e joga-lo fora depois de segundos. E se ele não quiser ela, é porque ELA que não quis mais. Ô menina que não sabe perder, é jogadora! Ou melhor, talvez seja porque a Patricia sempre teve tudo de mão beijada, assim: carro,comida e roupa lavada.

Ela coloca um scarpim para dizer que Pode (e com P maiúsculo ), mas perde o salto vergonhosamente depois de altas doses de Absolut. Faz até xixi na bolsa da Vitton. E fala mal de fulano, e diz que não curte a sicrana, mas ela não sabe nada sobre eles. E sempre diz que não é para ninguém olhar para os homens dela, porque todos os homens são da Paty. E suas "amigas" fazem cara feia. E eu, sempre leso, ouvindo as histórias vazias dela. Na verdade, as histórias são mais dos outros do que da própria Paty, conheço pouco essa garota.

E essa menina tem um gosto estranho por filmes e histórias de serial killers, fez eu assistir aquele Jogos Mortais 2, um dia desses... E o sonho dela é ser delegada. Até estranhei quando a louca me disse isso. Mas agora ela inventou que quer viajar pelo mundo afora, e eu, não estou mais afim de viajar nesse mundo da Paty, “vai embora e some com teus homens daqui, e se um dia voltares, espero que seja com histórias menos vazias que esse texto."

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Hoje eu decidi ser Clichê!

Por Antonio Monteiro

Depois de tanto tempo vendo aqueles filmes água com açúcar, escutando músicas românticas, poesias soltas em tantos lugares, cheguei hoje a alguns pensamentos, talvez ingênuos, longe da realidade dos outros.
O primeiro deles é que não estamos tão longe da realidade dos filmes. Nossas vidas são como que caprichosamente controladas por um diretor ou escritor, nós meros coadjuvantes ou mesmo figurantes a espera de um roteiro surpreendente e uma trilha sonora não menos ilógica.
Achamos que temos perfeito domínio de tudo. E eis que de fundo ouvimos a chegada da trilha sonora. Algo que por instantes foi imperceptível, mas em uma tradução rápida a canção dizia: “Ela pode ser o rosto que não consigo esquecer... Um traço de prazer ou arrependimento... Pode ser o tesouro ou o preço que tenho que pagar...”
E realmente via na minha frente um sorriso e um olhar que jamais passariam despercebidos onde quer que seja. Ao andar apenas deixava um rastro dos cabelos ficando pra trás e um brilho natural que rodeava tudo em volta.
Engraçado como realmente isso acontece. Algumas pessoas têm um brilho interno, um imã que te puxa pra perto delas e que vai muito além da beleza que todo mundo vê. E fascina de imediato. Seduz de uma maneira a deixar confuso, um dilema, amarro-me aos mastros, tapo meus ouvidos, e escapo do canto da sereia!? Ou apenas admiro mais e mais e quem sabe me aproximo mais!?
E aí talvez esteja o pensamento mais importante do dia. Por que não me aproximar!?
Por isso hoje decidi ser clichê, ao menos hoje.
Quero encarar como num filme: “-Surreal mais encantador!”
Sem complicar muito, apenas deliciando-me com o canto, sorrindo com a lembrança do brilho nos seus olhos, sofrendo com a insegurança, esperando atentamente o minuto em que a parte da música tocará de novo e ela chegará.
Como é bom ser ingênuo, sonhar docemente e sem grandes pretensões, comer um saquinho de pipoca ao assistir o filme em que um cara normal conhece a melhor coisa que podia acontecer na faculdade...
E aí acabei dormindo, assisti apenas ao inicio, mas já foi suficiente... Dormi feliz, porque sonhei que eu estava lá, disposto a fazer mais que o necessário para fazer o melhor filme... Seja qual for o roteiro!

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Terça-feira

“...só vamos embora, quando tudo terminar.” (Mombojó)

Por Lora Cirino

É assim que a gente é. Eu tenho medo quando ligas pra casa e conquistas minha mãe, ela nunca te viu, não confia em ti, mas te adora, porque tu a desconcertas, assim como a mim.
É divertido te ter, porque tu és muito homem com cabeça de muito menino, eu esqueço minhas responsabilidades e me torno irresponsável, de manhã te admiro, fumando teu beck na janela e me levando pra casa com cara de praia. É terça-feira, dez da manhã. Tudo que eu não quero da vida pra mim, penso.

Uma delícia conviver com teu jeito de que não sabe de nada do que está falando e precisa de um estágio, só pra dizer pro pai que está sendo útil. E eu com meu trabalho carregado, com meu sustento e as dificuldades lá de casa. Como eu te quero, esqueço, viajo e entro no escuro daquele quarto só nosso.

Na noite seguinte esquecemos de tudo, quando me ligas umas 19 horas: ”to indo te buscar gata, que trabalho o que, para de frescura, vamos ficar juntos”. E sabe o que é melhor? Tu sempre percebes se eu corto uma pontinha do meu cabelo, ou mudo de cor e fala a verdade, mesmo a tua verdade sendo sempre achar lindo.

E por aí nós vamos, nas terças-feiras deliciosas com cara de sábado, com cheiro de suor e com a camisa pavorosa do teu time, que tu me obrigas a abraçar e me domina vestido com ela, como tu não presta e adora fazer isso... Eu também!

O melhor de tudo é que eu torço por ti e tu por mim, nós sabemos que isso é uma fase e que logo nos distanciaremos, até porque nunca quisemos ser nada além do que uma linda lembrança um pro outro.
E assim fazes eu “me queimar”, me dominando no fim da festa, quando não é terça-feira e me levando pro prédio azul, como desde o primeiro dia, eu, tu e o prédio azul.

Mostarda com misto quente ou qualquer coisa que vejas pela frente fazes virar maravilha.
Ao mesmo tempo em que és moleque, é o homem que tem prazer em me dar banho, colocar pra dormir e faz questão de me acordar pra comer e fazer dormir, e não me comer, só de manhã.
Nossas manhãs recheadas de fugas rápidas, risadas, inocência e sandálias quebradas. Tu olhas, elas quebram e eu me arrasto. Safado. Neném.

“Saí, toca a campainha de novo e volta pra almoçar, meu bem”.

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Amor de armário

Por J.R. Gonzalez


Fazia frio e aquelas portas de madeira prensada não deixavam o clima dentro do armário aconchegante. Ainda mais por se tratar de uma cozinha, onde tudo é azulejado e frio. E cá pra nós, aquelas dobradiças já deveriam ter sido trocadas há um bom tempo, a porta mal fechava. Isso só agravava em muito o que os produtos guardados sentiam naquelas longas noites de outono, que estavam mais para as noites de inverno.

Tudo começou após uma ida ao supermercado. Compras do mês. Ele sabia muito bem como era aquilo. De repente, a prateleira que estava quase vazia, privativa para aqueles produtos que não foram consumidos, se enchia de novidades. E ele sempre sobrava. Para falar a verdade, ele não sabia nem porque havia sido comprado. Ninguém naquela casa gostava de cereal de aveia e disso, tinha certeza.

Biscoitos diversos, fermento em pó, alguns produtos de compota, torradas, adoçante líquido, palitos. O Nescau ficava na prateleira abaixo. Em meio àquele redemoinho de novos colegas, algo em especial havia lhe chamado a atenção: aquela pequenina caixinha vermelha de uvas passas. Como era graciosa aquela rapariga da embalagem! Cabelos morenos curtos, pele alva, bem vestida. Muito nova, ele pensou, e provavelmente deveria ser de consumo rápido. Se ficassem uma semana juntos naquela prateleira, seria muito.

Em poucos minutos, todos os produtos foram guardados em seus devidos lugares para serem esquecidos ali até a hora que alguém sentisse fome ou a empregada resolvesse fazer um bolo.

Naquela mesma noite, algo inusitado ou nem tanto, sucedeu. Uma barata das grandes entrou junto com o frio pela porta mal fechada. A rapariga, como toda rapariga, assustou-se. Ao perceber o nervosismo da donzela, ele, velho de armário, se pôs a acalmá-la:

- Acalme-se. Isso acontece de vez em quando. Não tem com o que se preocupar. Você esta bem fechada?
- Estou... Quer dizer, acho que estou – respondeu aflita.
- Estou certo de que deve estar. Produtos recém-chegados raramente vêm abertos – disse, tentando abrandar o nervosismo da moça.
- Mas... Mas... Ela está em cima de mim...
- Isso é porque você provavelmente deve ser docinha. Deve ter ficado junto de alguma amiga aberta no supermercado e pegou o cheiro. Acontece. Não há com que se preocupar; logo ela vai embora.

Eles ficaram juntos durante toda a noite. Uma hora a barata se foi, mas eles continuaram um com o outro até adormecer.

No dia seguinte, acordaram bem cedo, devido á claridade que entrava pela abertura da porta.

- É claro aqui – disse a moça com voz de quem acaba de acordar.
- Claridade pela manhã e frieza à noite! Esta porta já devia ter sido trocada há muito tempo, mas aqui eles não dão muita atenção a esses detalhes.
Depois de algum tempo, ela continuou:
- Obrigada por ontem á noite. Você foi... muito gentil.
- Que isso! Não fiz mais do que obrigação. Eu sei como são essas coisas. Já estive numa prateleira de supermercado uma vez, mas isso faz muito tempo. Sei como é difícil esse período de adaptação. Estamos acostumados a vida inteira a ver e interagir com produtos que são milimetricamente idênticos a nós. Mas aí, de repente, alguém nos tira de nossa prateleira, nos joga num carrinho. Daí pra frente é esteira, leitura ótica no nosso código de barra (constrangedor!), saco plástico, mala do carro sacudindo e, sem mais nem menos, caímos aqui, nesta prateleira fria, repleta de produtos que nunca imaginamos existir...
- Repletas de baratas também!
- Elas não costumam vir muito aqui – disse, sorrindo – mas, de qualquer forma, uma hora nos acostumamos com elas.
- Tudo é tão traumático. Se não fosse você ontem á noite, eu não sei como teria agüentado. E eu não sei nem o seu nome.
- Pode me chamar de Quaker. E você? Como se chama?
- Bem, quando fui retirada de minha prateleira, falaram “Há quanto tempo não via essas passas!”. Acho que meu nome é Passas.
- Não, “passas” é o que você é. Do mesmo jeito que eu sou um cereal de aveia. O que tem escrito na sua embalagem? –A forma como Quaker falava era culta e explicativa, como se fosse portador de grandes conhecimentos. E como isso encantava a insegura rapariga.
- Deixe-me ver... Sunrise Raisains Sécs, não sei se é assim que se pronuncia.
- Um nome em Francês! Encantador!

Quaker e Sunrise continuaram conversando por muito tempo. Falavam sobre tudo: experiências pessoais, memórias do supermercado, a vida naquela prateleira. Quaker contava para ela os hábitos da família e juntos ficavam imaginando o que haveria nas outras prateleiras.

Uma hora, já de noitinha, o esperado aconteceu. Eles estavam juntos, da mesma forma como tinha sido guardados. Pela porta mal fechada, avistavam a janela da cozinha e, através dela, um magnífico céu estrelado. O frio também contribuía para uma atmosfera bem romântica.
- Posso te perguntar uma coisa? – titubeou Sunrise, com sua voz graciosa.
- Claro.
- Você acredita em reciclagem?
- Não sei. Não costumo pensar muito nessas coisas.
- Me acha boba? – perguntou, insegura.
- De modo algum. Acho que o bobo devo ser eu, por ser tão objetivo e divagar pouco sobre a vida. Você acredita?
- Acredito, sim. Eu acho que não pode tudo acabar assim, simplesmente indo pro lixo. Imagino que deve ter algo mais, algo além de tudo isso que conhecemos.
- É capaz. Não costumo pensar muito sobre isso... – Do mesmo jeito que ela se encantava com toda sabedoria de Quaker, ele era fisgado pelo ar misterioso que ela exalava em suas palavras.
- Sabe, ontem à noite, você me chamou de docinha... – disse em tom apaixonado.
- Chamei? Desculpe a indeli...
- Não precisa se desculpar. (pequena pausa) – Eu gostei.

E daí em diante, eles se amaram como um casal em lua de mel. Ficaram se amando, olhando para as estrelas e, enquanto todos os produtos daquele armário sentiam um frio danado, eles reclamavam do calor. Ela pouco se importava com a idade avançada dele, até gostava dos seus cabelos brancos. E ele nunca havia imaginado que conseguiria moça tão bela em toda a sua vida.

O tempo foi passando e os dois consolidavam a relação, mesmo aparentemente sem ter muito em comum, descobriram juntos que ambos eram ricos em fibras. Mas não era só isso que os unia. Os gostos musicais e artísticos também. Apesar de que o sonho da vida de Sunrise era se tornar uma latinha de sopa Campbell de Andy Warhol, o maior motivador das brigas do casal:
- Você acha que eu não percebo como você olha para a Gina dos palitos??? – ela revelou um dia, em tom irritado.
- Como? Ah, pelo amor de Deus! Deixe de ser ciumenta dessa maneira! Você enxerga situações que não existem!
- Não existem?!? Quaker, eu te conheço. É só passar uma loirinha que você se assanha todo.
- E você? Já reparou como aqueles “monges” do chocolate em pó te comem com os olhos? De monges não tem é nada. São uns safados, isso sim!
- Ei, fale baixo. Não queremos criar um clima ruim na prateleira.

Mas essas discussões eram passageiras e, na verdade, só adicionavam aquele ciúme normal, que apimenta e estimula os relacionamentos. E por falar em apimentado...
- E aí, garotão? Não tem caloria pra noite toda não? – disse com um sorrisinho na boca.
- Vou te mostrar quantas gramas tem aqui nessa embalagem!
- Levadinho!

A idade avançada de Quaker não atrapalhava em nada a vida sexual do casal. Ele era uma máquina, e ela, insaciável.

De vez em quando, alguém abria o armário e pegava um biscoito ou o adoçante. E foi numa dessas vezes que passou pela primeira vez na cabeça de Quaker o que ele sempre soube: aquele amor, a vida a dois, não iria durar pra sempre. Ele sempre soube, desde a primeira vez que viu Sunrise, que uma hora ela seria consumida e ele ficaria ali, esquecido no armário, como sempre. Isso já havia ocorrido diversas vezes. Nenhum dos produto adquiridos juntamente com ele, ainda estava ali, sem que ninguém o notasse.

Como seria difícil suportar a solidão no armário sem ela! E depois que ela se fosse, também iriam todos os que conviveram com eles naquele armário. Chegariam novos produtos, que não fariam a menor idéia de quem Sunrise e do que o amor deles tinha representado. Chegaria o dia em que só ele saberia que esse amor tinha existido, e – quem sabe – ele não tivesse existido só na sua cabeça, já que ninguém mais partilharia com ele essas memórias. Ficaria velho e perturbado.


Chegará o dia – porque um dia todos os dias chegarão, até este – em que consertarão a dobradiça da porta ou quem sabe comprarão armários novos? E ele se lembrará dela, do frio que sentiam, das estrelas que viam através da janela. E sentirá um aperto forte no fundo do peito, uma vontade apenas de contar pra ela essa novidade. Chorará por horas, dias sem fim. Chegará até mesmo – veja só que besteira – a desejar nunca tê-la conhecido, para não ficar condenado a uma vida posterior de saudades e sofrimentos. Mas, no fundo, sabia que só conhecera o que é a vida naquele dias de compras, quando avistou pela primeira vez aquela menina ainda sem nome. Aquela menina apavorada com a barata em cima dela.

Só de imaginar isso tudo Quaker emudecia.
-O que houve, amor? Por que você está com essa cara?
-Nada não, querida, Pensando... Será que existe aquela história de reciclagem? Será que no passado a gente não fomos um produto só?
- Ás vezes, eu penso nisso. Quem sabe, no futuro, nós não nos tornaremos os dois uma só embalagem, guardando o mesmo produto?

Pensar no futuro era fatal para Quaker. Todos os fantasmas da separação voltavam à sua cabeça e, ao seu rosto, voltava aquela expressão que tanto incomodava Sunrise.

Quando ela ia perguntar novamente sobre o que ele estava pensando dentro daquele chapéu, foi interrompida. A porta se abriu e a empregada enfiou o rosto na frente da prateleira. A primeira a ir embora foi Sunrise, quando ainda estava pensando no que afligia o companheiro. Depois, foi a vez do pote de açúcar – mas este sabia que iria retornar. E, por fim, nosso querido Quaker, que também faria parte da receita!

É! Por essa ele não esperava. Nunca imaginou que chegaria o dia em que seria consumido e sem que fosse preciso se separar de Sunrise. Seriam consumidos juntos, tendo o seu amor eternizado.

Ingredientes:
200g de flocos de aveia.
200 ml de água.
Uma casca de laranja ou de limão.
Duas maçãs descascadas e picadas.
Uma colher de chá de açúcar.
Uma colher de chá de erva-doce.
50g de passas de uvas.


Modo de preparo:
1. Cozinhe os flocos de aveia em água fervendo com uma casca de limão.
2. Junte as maçãs picadas, as passas de uva e a erva-doce.
3. Misture, adicione açúcar e introduza numa forma untada.
4. Asse em forno moderado durante 20 minutos.

Esta é a história do amor entre Quaker e Sunrise, que tiveram o seu conteúdo unido numa deliciosa receita de bolo de aveia com passas. Suas embalagens foram jogadas juntas na lata de lixo. Se foram reciclados ou não, ninguém sabe. E, mesmo se alguém soubesse, não viria ao caso estragar os mistérios da vida.

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Na realidade, meu amor...

Por Anna Carla Ribeiro

Eu lembro perfeitamente daquelas tardes à beira rio. Das pedrinhas que machucavam os pés, da vista privilegiada da orla, do biquíni listrado e das nossas conversas. Até hoje eu não entendo como ficávamos tanto tempo isolados dos amigos, dos parentes e de todo o resto do mundo. Éramos nós dois, a terra nos pés e as bocas nervosas, que não paravam nunca de contar velhas histórias, arquitetar futuros planos e criar teorias sobre comportamentos humanos.

A minha maior alegria era ter o dia inteiro sem fazer absolutamente nada, só pra fazer tudo por ti. E várias vezes eu deixei toda a rotina de lado, porque não me importava mais com nada além da tua imagem. Era coisa de doido. Nada mais me satisfazia se não fosse contigo, com as nossas conversas, as nossas viagens, as nossas caminhadas pra lugar nenhum, porque não interessava para onde fôssemos, se estivéssemos juntos já estava tudo bem.

Com o tempo, eu já nem me importava mais. Podias escolher o filme, eu assistia qualquer um, o que interessava mesmo era poder deitar a cabeça no teu colo nas noites de chuva. Eu também ia a qualquer lugar. Sabia que iríamos rir e dançar juntos e nos perderíamos no meio da madrugada. E eu deixei de ser tanto eu pra ser tanto tu que chegava a me desesperar. Escondia de ti toda essa submissão com a desculpa de não me preocupar muito com nada, ser tão desligada. Ao contrário de ti, que sempre foste muito cheio de severidade nas tuas decisões.

Mas éramos felizes. Eu ainda consigo sentir o coração quase vomitado pela boca quando minha campainha tocava. Eu já estava atrás da porta, mesmo assim esperava uns 30 segundos pra abrir. Ficávamos horas falando de como a vida era, o mundo era, os homens eram. E essas muitas vezes do nada viraram muitas vezes do sempre. Viciamos-nos em nós mesmos.

Quando ias embora, a minha garganta ficava tão apertada que eu jurava merecer óbito por edema de glote. Eu via teus passos em direção à porta e pensava rápido numa desculpa para demorares um segundinho a mais. “Não saia, existe lá fora um protesto que tomou a cidade. Donas de casa revoltadas com a mais nova edição do Omo Multiação Active Clean”. Como não tinha coragem de pronunciar as minhas baboseiras, ao menos rezava pra que raios beta, em contato com a fechadura, fizessem com que toda a porta virasse ferro fundido de 750 toneladas.

Agora eu fico pensando em como o mundo é, a vida é e os homens são. Todas essas coisas são como descrevíamos, mas era como se aquilo que falávamos não tivesse aplicação na gente, talvez porque não estávamos na realidade. Vivíamos fantasia e falávamos de realidade.

E então eu lembro quando eu te vi pela primeira vez nessa tal de realidade. Eras pra mim tão mais sonho, tão mais fuga, tão mais quimera, que não acreditei que fosses capaz de me levar nas alturas e depois ser o responsável por me jogar de lá, num empurrão sem dó e sem volta. Eu te odiei pelas tuas mentiras e a tua cara de pau. Eu te odiei porque te amava na fantasia, nas conversas à beira do rio. E tu me deixaste na tempestade, bem no meio da passarela da Almirante Barroso.

Foi aí que eu me perdi. Corri dos nossos sonhos como quem precisa aprender a nunca mais sair do mundo dos vivos. Avisei-te tantas vezes que eu não agüentaria viver no meio de tanta materialidade e coisas banais do dia-a-dia. E então me dizias que a vida era assim mesmo, “lembra”? Olhavas-me com ar de superioridade e dizias com toda a segurança do mundo, o mundo real, que eu tinha a mania de maximizar qualquer probleminha.

O problema é que os probleminhas eram criados apenas por ti. E afetavam apenas a mim. Como conseqüência eu saía como a lunática da história. Tu não eras nem personagem, dirigias o filme. Um cara normal que faz coisas normais. “Todo homem trai”. E eu não entendia porque diabos todo o homem trai, se eu não conseguia sequer olhar pro lado, se eu não conseguia dar um passo sem que desses outro, se eu não conseguia passar cinco minutos sem pensar em ti e dois minutos sem planejar o que iríamos fazer mais tarde.

Eu cansei. Cansei de tanta realidade. Cansei do nosso namoro feio, com tanta enganação, tanta mentira, tanto sentimento bom jogado no lixo. Cansei de sermos um casal que com o tempo virou como tantos outros, cheios de segredos e mágoas mal resolvidas.

Ainda tenho boas lembranças daquele tempo que as coisas pareciam tão fáceis e tão mais saudáveis. E essas lembranças na maioria das vezes me fazem ter saudades, não tuas, mas das sensações que eu experimentei. Poderia ser pra sempre. Não foi.

Algumas vezes, na revolta de estar em contato direto com o que é legítimo e verdadeiro, eu te odeio profundamente. Odeio-te por ainda me amares, mas por não saberes o que de fato isso significa. Odeio-te pela descoberta tardia, por me procurares agora e dizer que quer toda a fantasia de novo. Odeio-te porque jogaste tanta realidade em minha vida, que não consigo mais sair dela, e nem sequer consigo cogitar um vôo de devaneio contigo.

Assim, cheia do que é material, físico, bruto, cruel e entupido de átomos, quase tendo uma overdose da “vida como ela é” e das probabilidades do tempo e do convívio, acho que no fim, houve um desperdício de amor. E, quando isso acontece, só sobram mesmo os carros e suas fumaças, a batida atrasada do ponto na repartição e um par de sandálias já gastas.

Quando saímos de um sonho, só nos resta correr atrás de outro. Essa é a realidade.

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Paradoxal...

Por Vivi

Na verdade, essa não é a única figura de linguagem que eu vou precisar para descrever esse amor, palavra essa que uso como maneira de tentar definir o que eu nem sei até hoje, uma relação que não precisava nem de títulos, por nenhum caber e nem explicar o que há até hoje entre nós... Sinestesia seria bastante explicativa, pelo misto de coisas, sentimento cheio de sentidos, de todos eles... Eu bem me lembro, apesar de todas as amnésias alcoólicas que tivemos juntos, de cada exploração de sentidos que tivemos, começamos com tato, audição e olfato, afinal, se conhecer dentro de um reggae dançando, sentindo o aroma da pele do outro, onde cheiro de suor, cerveja e cigarro contrastavam com um perfume importado, as músicas embalando nossos corpos, os beijos que nem sei bem onde começaram e nem quando foi o último.

Quantas vezes entramos em seu carro para sair sem destino ouvindo apenas as nossas músicas? Podia ser Amy Winehouse ou Radiohead, coisa que já adorávamos separados e juntos serviu como nossas trilhas. Lembro da nossa cara de felicidade, embriagados não só pelo álcool, mas pela paixão que nos consumia...

O cheiro de cupuaçu no carro e mais algumas frutas, que você sempre explicava que era quando seu pai trazia do sítio. Olfato, sentido que você fez aflorar em mim... Sempre te dizia isso, “tu tens uma liga com cheiros...”, e assim passei a ficar, tanto que mesmo depois de separados, e num auge de mágoa que podia sentir por ti, foi assim que te cumprimentei num reflexo inconsciente quando te revi pela primeira vez, te cheirando. Lembra que antes dos nossos beijos sempre viam os cheiros? E o aroma de trident de melância que nos viciamos juntos... Ninguém pode ter esse hálito que não seja você, e sei que com certeza são dos meus beijos que você sente saudade quando sentes esse mesmo cheiro no ar.

E os gostos? De cerveja primeiramente, mas de tanta coisa também... Como era legal sair comprar milhões de guloseimas, voltar pra casa e comer uma por uma, e entre cada uma delas, um beijo pra registrarmos na boca um do outro esse gosto... E olha que não sou daquelas “descoladas” que comem de tudo, bem sabes disso... Mas, comi até pirarucu contigo, era de tudo, pizza de escarola, chocolate (daqueles bem pop, só pra te ver revoltado com a minha escolha), quiche, tortas, tudo... Com direito a receber na boca, de tão sutil que era... Café da manhã na cama... Pra enfatizar um bom dia que estava por vir...

O seu forte, a audição, quantas coisas conheci ao seu lado, jazz, lounge, soul, enfim, nem sei quantos gêneros classificar aqui... até hoje mostro toda cheia de mim algumas dessas descobertas, “Conheces Pedra Branca?”... Tantas foram as músicas com direito a tradução algumas vezes “Like a little old fashioned music box/With just one tune to play/My heart keeps singin' I love you/Twenty four hours a day”, até o que eu já conhecia foi complementado com você, como nas vezes que você com toda sua vontade de me irritar usava as músicas para me alfinetar “When i think of all the times/I´ve tried so hard to leave her”. Tudo era sempre composto por uma bela trilha, a nossa cara, super-ultra-mega-plus-depressivos... Ao ponto de se levantar da cama de madrugada, pegar uma carteira de mallboro light, (o nosso meio-termo entre meu carlton red, e seu mallboro vermelho) e se encostar na janela, ouvindo “I might be wrong” ou “ Morning bell”, sempre com comentários, “essa é do caralho”, “pode crer, lindinha”.

O meu forte, visão, coisa que desfrutamos muito bem, também. Minha memória fotográfica quase lotou o HD de tanta coisa que eu gravei... Das noites amanhecidas no bar do parque, das manhã dentro do carro, do reflexo do espelho de um quarto de motel, dos filmes, coisa que não pode ser lembrada antes das eternas sessões na fox à procura dos filmes “ já viu esse?”, “muito doido, né?”, “ o horror”... E nessa continuávamos durante hora e meia, ratificando o título de casal indecisão... “ escolhe...” “não, por mim tanto faz...”. Lembro tanto de tudo, das farras, dos olhares, do contraste, por isso mil vezes fiquei caladinha, viajando, era um momento de registrar tudo que estava acontecendo.

A pele, o tato é pra mim até hoje sem dúvida, o sentido de todos eles que mais nos aprisionou... Como já dizia Pixies, “We’re chained”, só de encostar meu braço no seu, minha perna na sua, nossas bocas, nosso colo, era como se todo o abismo que existisse entre nós fosse destruído em questões de segundos, juro que a nossa pele, nosso carinho, nosso sexo, segurou a gente durante a maior parte do tempo, vontade de estar abraçados, roçados, grudados um no outro, como se ali, não houvesse maldades, guerras, a úlcera do mundo. Não tinha uma única noite ao seu lado que meu corpo não pedisse o seu, e acredito totalmente na recíproca, sei de tudo que há de recíproco entre nós. O peso que cada sentimento tem no seu lugar.

E mesmo com tudo isso, não conseguimos... Apesar de tudo que há de mais comum e admirável entre nós, nossa falta de força, de paciência, de disponibilidade nos deixou assim... Misturando mais uma vez os sentidos... Saudade amarga. Lágrimas salgadas. Doces lembranças... Sinestesia.

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Belém tá Grávida

Por Moara Brasil

Eu sei que ir ao cabelereiro é a melhor coisa para quem quer saber de fofocar, e quem não gosta?
Primeiro que nesses lugares é cheio de revistas Caras (as melhores fofocas).E olha daqui, olha namorado de artista global pra lá, e a gente agradece pelo novo corte do cabelo da Suzana Vieira (ALELUIA IRMÃO!), e conta as news para o nosso hair stylist, e recebemos os melhores conselhos que qualquer amigo "Vai menina, te liberta, sabe o que eu faço? Pergunto logo se o carinha tá querendo arrumar namoro". Bem, eu nunca perguntei isso para nenhum dos tratantes, coragem, coragem...

Mas nessa de papo vai, papo vem, eis que eu ouço:
-Amiga, sabia que a Joana tá gravida?
-EEEEINN!
-É, ela vai voltar pra cá inclusive.
-AH...a Lu também ta grávida, acabei de saber.E daquele maldito!
-Nossa, meu Deus!CREDO!NOJA!Que azar!
-Ah, a Paty também.
-E ai? Quem foi o infeliz?
-Ih...parece que nem ela sabe...tá em duvida em 3.
-Ai.Sabias que eu vou ser titia? Poisé, minha irmã teve filho.
-Que fofo, vais ficar pra titia!
-Idiota.
-Ahhhhhhhhh, nem te conto...sabe aquela santa do pau oco?Tá grávida mana, gravidíssima.

Nossa! Dessa vez fiquei com medo. Não é possivel, numa noite apenas, ouvir que tanta gente estava grávida. Eu sei que tenho 25 anos, mas já está na hora de eu também ficar grávida? Não não, fora de cogitação. Foi então que, ao sair do cabelereiro, fui direto para aquele bar, e quem encontro? A Livia, aquela gostosa da época do colégio. Sabe aquelas mulheres boazudas que todo mundo quer comer?Isso mesmo. A gostosa estava com uns 10 kilos a mais da época que eu a conheci. A Livia realmente estava acabada:

-Menina, quanto tempo! Estás tão diferente! Nunca mais te vi!
-É, eu estava saindo pouco, agora que comecei a sair.
-Que coisa, saudade cara de vocês, casou mesmo?
-Casei cara, ano passado, eu só comecei a sair agora porque estava grávida.
-GRÁVIDA?
-É, minha filha tá com 5 meses.
-Ainnn...que lindo (com cara de espanto)

Olha, depois de saber de tanta gente grávida, em um dia, me deu medo. Começo a pensar que ficar em Belém é um perigo mana, aqui só resta ficar solteira forever ou ficar grávida....né? Use camisinha por favor!

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Todos os homens são da Paty

Por Moara Brasil
Histórias de João


A Patrícia chega assim "causando" em qualquer lugar...Tem a mania terrível de achar que quem olhar pra ela “tá afim”. Vive mostrando para os que ela julga seus "amigos", mensagens dos machos dela, ou que fulano de tal ligou, e que o mauricinho “tá na área” dela. Ninguém se mete com a Patrícia! Aliás, ela só fala nisso. Não tem outro assunto. Não tem outro papo. Sabe aquelas meninas que a gente até tenta algo, mas cansamos rápido só de pensar? E pior que ela é tão bonitinha, rostinho legal, se veste até bem e é cheirosinha. E eu, João mané, sou o consolo dela.

Mas é difícil, eu confesso, só esse óculos Dolce Gabana não me encanta. Essa empolgação dela de dizer que gosta de Nirvana, realmente não me convence. E a coleção de calcinhas da Victoria Secret´s, nem são tão sexys assim nela. Sabe aquelas “menininhas” que tomaram danoninho na boca? Que nos quinze anos, além de um “puta” quinzola, também viajaram para a Disney? E isso não foi nenhum sacrifício do bolso dos pais dela...

Ela tem aquele carrinho da moda, e é a sua grande estratégia para levar qualquer garoto como eu para os momentos vazios da vida da Patricia. A pequena é filha de familia nobre da cidade. Os pais dela sempre estão nas colunas sociais dos jornais.

Ela sempre tem algum homem na sua rotina, tem todo mundo e não tem ninguém. É solteira, e assim permanece. Mas ela é a pior das solteiras: aquela que realmente não sabe o que é ser sozinha de verdade. Um dia desses, a Patricia veio me falar que a mãe dela estava preocupada por ela está tanto tempo sem arrumar namorado. E eu, João mané, querendo a loirinha, mesmo assim. Mas ela nem tchum pra mim.

Não demora muito, e lá vem ela. Com o perfume Chanel º5, que atrai a macharada. Tão linda, tão pequena e sorridente. Sorrir para todos numa elegância atrapalhada. Os homens até gostam, mas se afastam rápido. Muito rápido. Eu gosto dela, até curto essa fineza toda, eu realmente gosto dela. Mas quando ela vem falar que está triste, que o mundo não a entende. Dá vontade de sair dando soco na cara bonitinha da Patricia!

Ela é jogadora, e daquelas jogadoras para ganhar e depois pisar. Pisa Paty.!Pisa!
Eu falo que ela é jogadora, mas a baixinha não entende. Eu sou um mero integrante do jogo da vida dela. Ela acha que os homens são os grandes culpados da sua dor de cabeça crônica. Descobri que a Paty tem uma identidade pertubada, daquela que tem múltiplas identidades, e não conhece nenhuma.

Uma hora Patrícia é roqueira, e coloca pulseiras pretas com aquele vestidinho vermelho legal. Outra hora ela resolve virar garota do reggae, e mete aqueles montes de fios no braço e uma rasteira. Depois vira minimalista, e não gosta de nada. Só de frequentar os melhores restaurantes da cidade. Outra hora, ela se esquece dela e coloca qualquer blusa do armário, a mais velha, e vai passear por aí...

Toda vez sempre a mesma história: “porque o Paulinho fez isso”, “porque o Julio é um leso”, “não vou pegar o Ricardinho porque não quero”. E eu, João mané, sempre ouvindo, mesmo que contra a minha própria vontade, as mesmas histórias de que todos os homens são da Paty. E eu também sou dela, zé mané.

E os caras até que são bonitos, mas ela fala sempre que eles não servem. Ela é jogadora, isso sim. Talvez eu seja o único que perceba.

Se tem um rapaz sarado na área, chegou na festa, ela é a primeira a se encostar, nem que seja só para conquistar o menino e joga-lo fora depois de segundos. E se ele não quiser ela, é porque ELA que não quis mais. Ô menina que não sabe perder, é jogadora! Ou melhor, talvez seja porque a Patricia sempre teve tudo de mão beijada, assim: carro,comida e roupa lavada.

Ela coloca um scarpim para dizer que Pode (e com P maiúsculo ), mas perde o salto vergonhosamente depois de altas doses de Absolut. Faz até xixi na bolsa da Vitton. E fala mal de fulano, e diz que não curte a sicrana, mas ela não sabe nada sobre eles. E sempre diz que não é para ninguém olhar para os homens dela, porque todos os homens são da Paty. E suas "amigas" fazem cara feia. E eu, sempre leso, ouvindo as histórias vazias dela. Na verdade, as histórias são mais dos outros do que da própria Paty, conheço pouco essa garota.

E essa menina tem um gosto estranho por filmes e histórias de serial killers, fez eu assistir aquele Jogos Mortais 2, um dia desses... E o sonho dela é ser delegada. Até estranhei quando a louca me disse isso. Mas agora ela inventou que quer viajar pelo mundo afora, e eu, não to mais afim de viajar nesse mundo da Paty, “vai embora e some com teus homens daqui, e se um dia voltares, espero que seja com histórias menos vazias que esse texto."

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Velho amigo velho

Dedicado a R. Cal

Melhor do que fazer amigos é redescobri-los. É um bônus, uma vantagem ou qualquer adicional que uma amizade pode ter. É uma delícia reencontrar um velho amigo e perceber que o tempo só passou do lado de fora, que dentro tudo continua do mesmo jeito entre vocês.


Quantos acontecimentos cabem entre uma amizade? Quantas coisas ruins ou boas conseguem f65440a85c479a8c98e372bcbe3350561c7535bb_m1caber no espaço que há entre a amizade de duas pessoas? Só é possível mensurar isso com afeto. Não que haja necessariamente um termômetro ou uma forma qualquer de medir o quanto esse sentimento é profundo ou verdadeiro.


O passar dos anos planta na mente a percepção de que amizade mesmo, amor mesmo, não é se encontrar todo dia com um amigo ou fazer imensas declarações públicas de afeto para um namorado. O bem-querer, assim como as demais coisas boas da vida, se constitui em pequenas coisas e assim transforma-se em cumplicidade.


E é aí que é uma maravilha maior redescobrir um amigo. Melhor que comer um bom bolo de chocolate é poder enchê-lo de cobertura. Melhor que fumar um cigarro é fumar um cigarro tomando um cafezinho. Melhor que ter um amigo é ter um velho amigo e reencontrá-lo depois de muitas mudanças na vida de ambos e sentar para conversar com ele como se o tempo não tivesse passado. Não! Corrijo! Não como se o tempo não tivesse passado, pois passou e da forma mais maravilhosa que poderia ser, mas como se rapidamente a gente desse um jeito de aparar as arestas que surgiram pela distância física e num estalar de dedos, a gente conseguisse conversar, rir, brincar, falar besteira e relembrar (muito).


Amigo velho, velho amigo ou velho e amigo. Sim. O tempo passou pra gente e quem nos vê brincando e rindo, numa mesa de bar que seja, nem sabe quantas conversas pela janela tivemos, as brigas de desligar telefone na cara, as paqueras, as confissões e nem faz idéia de que somos, nós dois, do tempo das cartinhas. Eu as fazia para ti em papel de carta, com envelope combinando e tudo mais.


És minha antiguidade, uma relíquia, um abajur em estilo art noveau. Num canto de uma loja de artigos usados, esse objeto pode estar meio empoeirado e até parece ter caído no esquecimento. Mas só quem o doou sabe o valor sentimental daquele objeto. No meio de tantos amigos novos, de tanta coisa nem tão nova assim na verdade, posso estar distante, podes estar tão distante quanto eu também. Mas há tanto sentimento por trás disso. Posso te chamar de amigo, e dizer que és meu. Meu amigo. Relíquia de amizade. Antiguidade no meu coração.

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Vida aos ex-namorados

Por Anna Carla Ribeiro

Tem certas coincidências que de tão fora da probabilidade parece que estavam no roteiro da história da minha vida, bem naquela parte que o filme precisa de um “up” pra chocar o espectador. De tão fora do lugar-comum, também parecem coisas do divino, dos cosmos, de todo o universo conspirando para fatos que não irão mudar em nada os rumos da história. Mas sem dúvida tornaram esta semana mais feliz.

Existem ainda certos momentos que combinam perfeitamente com esses fatos. Talvez pelos ventos de uma nova crise de TPM se aproximando, esta semana eu me senti sem a menor das graças. Estava naquela situação em que não me sentia tão bem assim, me olhava no espelho e constatava mais defeitos que qualidades, um pouco cansada, um pouco de saco cheio, um pouco me achando menos.

Isso é engraçado. Tem horas que estou nas nuvens e penso: “Caralho, eu sou fodassa! Tenho amigos fodassos, família fodassa, emprego fodasso. Vou almoçar naquele restaurante fodasso, com a minha calça preta nova fodassa, brindar à minha vida fodassa com meus primos fodassos”. Aí, de repente, a coisa inverte. “Lá vou eu com este cabelo de merda, ouvindo música nesta caixa de som estourada de merda, praquela entrevista chata de merda. Que merda! Pisei na merda”. Mais ou menos assim.

Vamos aos fatos. Estava eu, sem o menor sal, tentando dormir numa triste tarde de segunda-feira. Toca o celular. Número confidencial. “Deve ser do trabalho, alguma bronca de merda, porcaria”. Até tentaria explicar a minha reação se eu tivesse tido alguma. Era meu ex-namorado, o primeiro, o cara que me ensinou a namorar, que me aturou por dois longos anos e meio, quando eu ainda achava que namorar dois anos era tempo pra caramba. Eu era novinha, tinha acabado de fazer 17 anos. Fazia convênio e usava múltiplas pulseiras coloridas no braço. Fazia três anos que eu nem sequer tinha notícias dele.

Tem certas considerações que as pessoas nos dão que de tanta proporção duvidamos se merecemos. Disse que eu fui a primeira pessoa que ele ligou neste momento, um dos mais importantes da vida dele. Sabia o meu número celular de cor, depois de tanto tempo, e eu nem sequer lembrava que esse número era tão antigo assim. Terminamos brigados, passei um bom tempo querendo matar ele enforcado. Mas passou. Ele ligou pra saber de mim, se eu já tinha me formado, se estava trabalhando, feliz, como é que tava a minha mãe e o irmão. Riu das minhas respostas, agradeceu as minhas preocupações e disse que torcia muito por mim. Me deu vontade de chorar e de contar a ele que estava me sentindo tão mal. Fiquei calada. Ele disse novamente que torcia por mim, que eu era especial, um beijo e tchau.

Passaram-se alguns dias e eis que outro ex-namorado, também de longa data, só que bem mais recente, resolve me ligar. Não fiquei tão espantada assim porque temos uma relação amigável, nos falamos numa boa, nos emprestamos livros e de vez em quando eu preciso ligar pra ele pra perguntar qual é a senha do meu cartão de crédito. Ligou porque lembrou de uma antiga piada minha. Também queria me fazer inveja porque estava vendo o pôr-do-sol, que eu tanto gosto de apreciar, na beira do rio. Falou que tinham fatos que sempre faziam ele se lembrar de mim, coisas boas. Aproveitei para fazer uma nova roupagem da velha piada e então desligamos.

Agora estou aqui, com os pensamentos soltos, refletindo em como as coisas são. Ex-namorados sempre assustam. Eu sempre os preferi aleijados, mortos ou, no mínimo, plantando batatas no interior do Acre. Na época eles me pareciam enormes, monstros soltos pelas cidades que de tão perversos conseguiam me assassinar de mágoas só com um olhar. Eles me fizeram morrer várias vezes. Algumas de ódio, outras de lágrimas. Os dois já me afogaram em minhas próprias lágrimas. Já tive vontade de depilar todos os pêlos de ambos com cera fria – até mesmo os cabelos.

O que me deixou feliz foi saber que mesmo depois de tanta decepção, mágoa, brigas, e todas aquelas coisas angustiantes de um término de relacionamento longo, só ficaram as coisas boas. Eles, mesmo sem terem a menor idéia do que se passa no meu dia-a-dia, me deram a prova de que eu não sou tão mal assim. Posso ter errado, ter feito barraco, chorado demais, enchido o saco além do limite, mas eles me enxergam como algo positivo. Torcem por mim e me lembram com os dentes à mostra.

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Uma Viagem em minha vida

Por Vivi

Às duas da manhã da minha última segunda de férias e em São Paulo, resolvi colocar uma musiquinha daquelas que são a cara de filme pra escrever (...) Caso vocês queiram compartilhar da liga genuinamente, ai vai música: [youtube=http://br.youtube.com/watch?v=eX3KrXFAsd0]

Depois desse "loop" emocional em que me encontrei esse fim de 2007, percebi muitas coisas. Algumas até poéticas, outras bem grotescas. Mas no final, todas verdades, pelo menos para a minha vida como está hoje.

A primeira é que a dor vai estar sempre ao nosso lado, a diferença de se sentir maduro mesmo vem no momento em que aprendemos a lidar com ela. Confesso a vocês que até hoje (...) é como se eu tivesse vivendo uma espécie de transe, meio entorpecida, anestesiada e isso me fez tornar tudo mais fácil.

Até quando escuto coisas que me afetam (...) procuro abstrair, respirar, chorar enquanto ninguém vê e levantar de novo. Esse foi meu segundo passo. E tenho me esforçado para virar gente mesmo. Terceiro passo: largar meu maior vício, a mania eterna de depender dos outros, pra sair, pra viver, pra amar. Agora não! Resolvi que até mesmo quando me assusto, eu tenho que meter a cara.

Durante esse mês eu saí de táxi só, numa cidade imensa como São Paulo, a procura de distração. Fui a praia sozinha também, peguei metrôs ao som de Radiohead, Moska, Amy Winehouse ou qualquer outro som suicida desses que eu, masoquistamente, adoro!

Mas o que importa disso tudo é que eu estou me dando oportunidade de crescer de fato. Têm horas que enfraqueço um pouquinho e me dá vontade de saber, estar por perto ou até mesmo inventar o que falar. Consigo segurar essa vontade dois segundos e isso já é tempo suficiente pra eu perceber que não vale a pena.

Esse foi o penar mais forte e mais gostoso que eu já passei. Não sei se ainda vem mais dor por aí. Até agora eu reagi muito bem. Acho que o que eu sempre disse que ia acontecer, aconteceu.

Depositei todas as minhas fichas e na hora que eu tive coragem de me desligar de tanto sofrimento mesmo abrindo mão de um amor e suas conveniências, eu chorei, me levantei e recomecei. E olha que essas conveniências quase fodem com tudo.

Meus maiores surtos de sofrer, de achar que não ia agüentar, foram na falta dessas conveniências. Alguém que cuide, proteja e o que é melhor, (ou pior dependendo do ângulo) é que essa viagem que fiz foi só com casais.

Então na hora do aperto ou das manifestações afetivas, sempre quem sobrava era eu, seja pra sentar numa cadeira de duas pessoas, levar uma sacola grande, se proteger do frio etc. Tudo, tudo isso. Me doía na espinha a falta de alguém e era nessas horas que eu me escondia para fumar um cigarro, bater fotos, tomar banho de mar, qualquer desculpa era suficiente para me largar no choro. Quando voltava, já estava mais forte e cada vez menos impaciente com essa situação.
Para piorar, todos os doidos que eu agarrava, eram idiotas. Acho até que inconscientemente era por isso que eu procurava, por homens que não me representassem nada, daqueles que francamente, eu não acordava com a mínima vontade de saber de nada: telefone, orkut, msn. Nada! Peguei o telefone de todos, mas não dei o meu a nenhum.

Numa dessas ressacas morais, intelectuais e principalmente físicas, me deu liga torta, comprei uma passagem para dali a dois dias, mesmo com uma outra já comprada, somente por estar sentindo a solidão forte demais, presente demais. Foi um surto de correr pra baixo das asas dos pais.

Exatamente nesse dia, como que num passe de mágica, a princesa cansada de ver sapo, acaba encontrando um príncipe. Sim, conheci um príncipe! Ele é muito fofo, engraçado, inteligente, bonito, estiloso, cheiroso. Mas quem disse que eu ainda tenho coração?

Realmente, agora eu não consigo querer laços com ninguém. O que mais me encanta nesse moço é o poder que ele teve de resgatar minha vontade de um segundo dia ou terceiro. Ele colocou um pouco de açúcar e afeto em meus dias por aqui e só depois dele e não necessariamente por ele, vivi a melhor parte da viagem.

Conheci vários amigos que me divertiram. Desde um hétero maníaco por sexo, até as mais variadas bichas. Todos gente muito boa e maluca. Eles arrancaram minhas melhores gargalhadas e minhas piores pérolas. Mas, mesmo com toda essa empolgação, quis me livrar um pouco do gatinho e sua turma.

Acho que a opção de ser livre hoje é a única que eu não consigo me desfazer. Percebi que a solidão é nossa única companheira pra vida inteira. Então que ela seja a mais legal das solidões, a solidão opcional mesmo.

Acabei até magoando esse mocinho, mas não pega nada. Ele me entende. Agora, o lado mais sacana dessa história: eu estou virando um monstro, daqueles que abraça o acompanhante para olhar pra outro.

Vocês sabem tanto quanto eu que essas são as mulheres que mais se dão bem. Cansei do posto de coitada e é só isso que quero: ficar bem, sem machucar ninguém, mas principalmente sem me machucar.

No mais, corro pra Belém ansiosa em resolver minha vida para em breve estar partindo. Égua cara, o mundo é muito grande e como diz a Mayra: “o mundo precisa nos conhecer".

Essa viagem foi só pra dar o gostinho, de conhecer gente nova, ver novos lugares e ter novas idéias. O mundo cheinho de gente e conhecimento, a necessidade incrível de passar por aqui e deixar alguma coisa, seja como pessoa e como profissional. Saber que você vai ser falada em uma mesa de bar ou a de um escritório, fazer valer a nossa humilde existência.

Essas são as minhas metas agora e acreditem, vão rolar e vocês não se espantem de um dia ver a vida de vocês em uma tela de cinema, eu juro!

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A mulher que não prestava – Parte I

Por Anna Carla Ribeiro

Geni não prestava. De jeito nenhum, maneira alguma, puta, ploc, vagabunda. Teve alguns longos namoros durante a vida. Entregou-se a todos. Doou casa, comida, dinheiro, preocupação, afeto, e por fim, ela mesma, e todas as suas qualidades. Mas ela nunca teve nada de bom, porque não prestava. Se os traiu? Não, foi o contrário, ganhou variadas espécies de palmeiras na cabeça. Mas ela merecia. Era muito doida, imagine só! Tinha dois empregos, sete freelas, uma pós, uma avó doente e ainda customizava umas roupinhas nas horas vagas. Inventava a desculpa esfarrapada de estar sobrecarregada para sair com seu grupo de amigos que igualmente não prestavam, falar besteiras, beber cerveja, dançar freneticamente e soltar umas gargalhadas. Vivia na rua, a sem vergonha!

É bem verdade que Geni não fazia mal a ninguém. Nunca enganou ou faltou o seu dever com qualquer coisa que fosse. Mas ela era metida a moderninha demais, quando ficava solteira achava que não devia nada a ninguém, era cheia de idéias próprias. Diz que era personalidade esse papo de seguir as suas vontades e o seu coração. Papo furado! Dá pra confiar em alguém assim? Que faz o que dá na telha? Que não liga pro que os outros falam? Que é capaz de mandar toda uma sociedade à merda só porque acredita fielmente nos seus ideais?! O que são as ideologias de uma pobre Geni perto de uma vasta sociedade?! Nada, veja bem. Não presta, essa guria.

Algumas vezes se apaixonou. Quando estava assim fingia virar santa, santa de merda! Deixava tudo o que estava fazendo para ver o ser amado. Parava de olhar pros lados, provavelmente pra fazer aquela capa, tenho certeza. E quando sofria uma desilusão, já que como ela não prestava, não era levada a sério, chorava baixinho, levantava a cabeça e engolia tantas falsas considerações. Calava a boca e ia embora, sem julgar, encher o saco ou sequer olhar pra trás. Dá pra confiar em mulher que não sabe olhar pra trás?! Não, não, mil vezes não!

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Te amo, Máscara.

Desde que vocês foram embora que eu não o tinha mais, eu queria, mas nem me esforçava em procurá-lo. Parece que estava faltando eu me sentir forte de novo na vida, para que pudesse ir ao encontro dele, uma coisa tão fútil e tão significativa pra gente. Hoje foi um dia de coragem, coragem besta, mas coragem, pra enfrentar de novo o lugar que mais lembra vocês.

Fui, andei sozinha, comi sozinha, comprei sozinha, olhei o café... Não tinha graça toma-lo, ia acabar temperando-o com lágrimas e eu prefiro café doce misturado com sonhos de guinada.

Consegui resgatar um número que só pode lembrar vocês, nossos fins de semana de : “oi, o que tás fazendo? É que eu to me sentindo só na rua, vamos conversar já que é de graça?” Pois é, perdeu a graça e por 5 meses eu me arrastei.

Esta semana me senti bem de novo, mãe bem, alegria, alegria, vontade de tudo, a velha vontade de guinada como se vocês tivessem aqui, e estavam.

Como quem não quer nada, ele estava lá: azulzinho como as nossas tardes de cabelão, nossas noites de “sombra azul e batom vermelho”, como nossos sonhos que cabiam lá dentro de tanto que ele se parecia conosco.

Comi sushi com agridoce pra lembrar de uma, tomei água pra lembrar da outra, falei sozinha e comprei um scarpin novo pra lembrar das duas, de nós três.

Lembrei do natal, do cantão, do unama’s bar e restô, da “garagem intermediária G2, subindo”, da moda, da comida barata, dos cabelos fedorentos, do óleo de pupunha, do jingle de entrada e de tudo o mais que vocês sabem.

Voltei me divertindo junto com vocês, me equilibrando pros meus cílios ficarem do tamanho da nossa saudade, bem juntinhos e bem grandões, como ele consegue melhor que qualquer MAC deixar, comprei também um glosss com cheiro de Tay e vim acertando o Make com cílio de Sofia.
Dedicado aos melhores anos da minha vida, a cumplicidade, ao trio Guerreira Master.

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Bandolins e aquele Daime...


Esferas, Salvador Dali.

Por Moara Brasil


Ontem eu lembrei de ti, Lori. Sempre tivestes algo diferente no olhar, era misterioso, totalmente enigmático. Toda vez que ouço alguém falar do Daime, não tem como, lembro do teu rosto. Onde estás, Lori? O que aconteceu contigo, e aqueles sonhos que nós tivemos um dia de mudar o mundo, fazer Ongs, montar um bar de rock, e ter filhos roqueiros para contarmos todas as nossas experiências hippies e revolucionárias da vida? Mas tu mudastes, e eu muito mais ainda.

Percebi que estavas mudando quando não olhastes nos meus olhos aquela vez, para falar que alguém da Índia te visitava diariamente, ao som de bandolins. Eu procurei não compreender o que falavas, estranhei, e deixei passar batido.

Mas de repente desenvolvestes tais imaginações, de maneira tão esquizofrênica, quase uma "piada" entre amigos. E um dia encerrastes o assunto.

Tu, tão pequena, pele limpa e morena, com fisionomia daquelas indianas e olhar de criança, mesmo quando fizestes vinte anos, parecias ter quinze.

Te fechavas para o mundo, quando te trancavas naquele quarto ao som de Pearl Jam e The Doors. E eram esses gostos parecidos que nos faziam ser tão amigas, tão unha e carne, querida Lori.

Fazíamos poesias juntas, as mais simbolistas possíveis, porque gostávamos de "Poe" e coisas de Corvo. Tu riscavas todas as tuas mesas, todas as tuas paredes, e eu escrevia poesia nelas, e nós fazíamos poesias desconexas, e nos realizávamos. Lembra quando criamos a poesia do Desvario na aula chata do professor de Química? Tu foste a amiga mais interessante que eu tive e tão parecida comigo. Apesar de pertenceres ao Fogo e eu à Terra. Mas os elementos uniam-se tão perfeitamente.

Saudade Lori, saudade. De quando não tínhamos nada para fazer, então nos encontrávamos para falar dos planos de cada uma. E ouvíamos Led Zeppelin , com a querida Mary, tão calmas e sem muita pressa para o mundo, naquela sala que só tinha um som Gradiente antigo e um sofá agradável. Tão sonhadoras, descobríamos muitas coisas juntas! Tudo era novidade e perfeito!

Porém, um belo dia, tua alma se perdeu por aí, e nem eu sabia mas quem tu eras. Teu olhar estava perdido, e tu só sorrias com o canto da boca.

Te perdi para a vida, para o álcool cretino e coisas mais. Te perdi para aqueles becos da Pedreira, aqueles amigos estranhos, te perdi para aquele "filhinho de papai" de mente vazia, e com muito dinheiro no bolso para gastar em vadiagem. Maldito rostinho bonito! Grrrrr!

Ah, Lori, te perdi. E os bandolins ressurgiram como nunca, estavas mais esquizofrênica.
Afastei-me de ti, porque tua energia estava carregada. Eu curti contigo, e muita vezes, mas tu te entregavas para os becos e para o poço. E a vida continuava sem pé nem cabeça.

Chorei um dia, de tanta angústia, por não te ter mais comigo, por te ver tão acabada, derrotada, e tão jovem. E tua família procurava ajuda, e eu não te ajudava, eu não sabia como ajudar. Porque não adiantava, eras de fogo, não te enxergavas. E ainda chamavas terríveis palavrões. Realmente interpretastes tão mal quando William Blake disse que “a estrada do excesso leva ao palácio da sabedoria”. Sua burra! Idiota.

Resolvi me afastar, até saber da última vez em que acabastes no hospital, com glicose na veia. Foste embora, para bem longe daqui, e de lá voltastes com novidades.

É por isso que lembro de ti toda vez que ouço falarem no Daime.
Lembras quando me ligastes com outra voz, dizendo que tinha me visto no jornal? E que sentias muita saudade de mim. Fui te fazer uma visita. E estavas com os cabelos lisos e longos, antes eram tão curtos. Te achei tão linda! De saia comprida e bem magra, mais linda que nunca!

E havias mudado. Falavas de coisas espirituais, que tinhas te encontrado com Deus. Eu me assustei pela segunda vez, havias virado crente?Porra Lori! Mas colocastes uma fita, cheia de cânticos, umas senhoras cantando. Tinhas entrado no Daime, e estavas devota. Eu abaixei a cabeça, fiquei um pouco triste. Por que teu olhar estava iluminado, mas alienado?

E usastes todos os argumentos possíveis para eu entrar contigo nessa tua nova onda, falastes do efeito do chá e coisas e tal, e fizestes eu experimenta batata e strogonoff com soja. Eu não queria saber disso, eu queria era aquela Lori que eu conheci um dia. E não essa Lori que se transformou em um ser que eu desconheço.

Bora ouvir Portishead? Eu sei que gostas, mas tu querias que eu me concentrasse naqueles cânticos. Perguntei da tua vida, conseguistes te formar sem repetir. Estavas atrás de trabalho, e também, já tinhas até um namorado.

Agora eu penso que, apesar de não te conhecer mais, e ter te perdido duas vezes na vida, prefiro que seja desse jeito. Entendo que almas quando se tornam fracas e desorientadas, precisam de algo que as leve para atingir objetivos. E fostes determinada e sábia, que só atingirias algo, se tivesse que ser assim.

Enfim...que saudade de ti!

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