sexta-feira, 4 de abril de 2008

Hoje correndo atrás do amanhã e depois.

*refrão de música escrita por Jorge Du Peixe.
Por Lucas Paolelli (nosso querido convidado e grande amigo das ohvarias)

5:54 da manhã de quarta-feira. Pouco mais de duas horas atrás, eu tinha acordado todo descangotado no sofá e não consegui dormir mais. Tentei de tudo. Vi o final de um filme na Sessão de Gala. Depois tentei deitar, mas nada de o sono voltar. Rolava de um lado para o outro da cama, sem relaxar. Eu estava agoniado, tenso, cabreiro, aceso. Aliás, é como eu tenho me sentido nos últimos tempos. Amanheci em frente ao computador, ajustando o AC Nicotime (meu time virtual) e ouvindo Tomorrow Never Knows, clássica canção de um certo quarteto de Liverpool (cujo título, por ironia do destino, veio muito bem a calhar).

Meu momento atual é difícil. Para um cara que sempre procurou levar a vida baseando-se em certezas, estou todo baratinado ao ter que me acostumar com as interrogações que a vida tem esfregado nos meus olhos. Em qualquer assunto que eu me recordo, pensamentos e conceitos do passado entraram ou estão entrando em choque com o que penso do que será do futuro, seja em comportamento, na carreira profissional que escolhi e pretendo construir, e até mesmo nas relações de amor ou de amizade.

Antes que surja um comentário ou trocadilho imbecil se reportando ao final do parágrafo anterior, ou mesmo atribuindo, a mim, um estado de crise existencial, faço questão de dizer que, apesar do meu ponto de vista (digamos) quadrado, acho que crise existencial é coisa de baitola, e portanto, nada tem a ver com a essência áspera feito lixa deste ícone da virilidade que vos escreve (ou ao menos tenta).

De uma personalidade radical, tudo aquilo que nela eu agreguei, ao longo dos meus 25 verões, foi fincado, em grande parte, no que eu sempre acreditei ser certo e no que eu achava melhor pra mim. Entretanto, mais do que as rugas e os fios de cabelos brancos que aparecem (e crescem de uma forma totalmente diferente do resto do cabelo), o passar dos anos tem me proporcionado, até mais importantes do que os momentos de felicidade, as frustrações. As porradas que a vida me deu fez com que grande parte das minhas certezas, de repente e sem dó nem piedade, ruíssem.

Eu era um cara aiatolá, extremo. Somente prestava ser como eu era. Somente era legal o que ou quem tinha a ver com isso. Eu repudiava os tipos cagão/playboy ou rastafaráaai-malandrinha, as babaquices desses tipos estrupícios me deixavam irado. Jamais ia à boate mais badalada do momento, dessas que viram notícia dominical de jornal impresso. Sentia ânsia de vômito diante do pop gritante, e golfava diante do alternativo rasgado. Escutava somente rock, e tudo o que não fosse rock simplesmente era “zuada”. Alguns desses exemplos demonstram os meus gostos estranhos e minha postura rígida. Eu era o normal (e era normal quem compactuasse com isso). Os estranhos eram os que faziam parte da maioria, por serem complacentes com tava imbecilidade. Ainda bem que esses tempos de percepção limitada já ficaram lá atrás ...

De uns tempos pra cá, foi natural e bombástico compreender essa visão curta fez com que eu me privasse de viver muitas coisas bacanas, de me relacionar com um monte de pessoas, de me fechar perante a diversidade e abrangência que o mundo tem para me oferecer. O meu ode ao incomum, ao esdrúxulo e às minorias tenderia a restringir os meus caminhos (para não usar uma expressão mais incisiva usando o verbo alijar). O prejudicado fui eu, pela inflexibilidade, pois no final das contas, EU seria o estranho, e A MAIORIA seria normal. Custava ser um pouco mais normal, e viver um pouco mais em acordo com a “normalidade da maioria”? Ao menos eu teria vivenciado experiências mais diversas, e me privado menos da mesmice.

Mas esse semancol que brevemente tentei relatar, até que não foi dos mais traumáticos.

O curso de nível superior que eu escolhi estudar e exercer profissionalmente exige retidão e formalidade. Tais atributos colidiram de frente com o jeito que, lá atrás, eu tinha. Eu, como todo bom rebelde que se preze, por teimosia e imaturidade, planejei remar contra a maré. Ledo engano.

Foi aí que a própria carreira me deu várias “mijadas”, pra apontar o dedo na minha cara e dar o seu recado: ser reacionário contra a imagem do profissional do Direito, aquela de moldes rígidos e quase intocados, traçados desde os primórdios desse segmento profissional, poderia resultar numa dificuldade a mais para mim, na carreira que eu pretendi seguir dentre as tantas que a formação jurídica oferece. Passei a reconhecer que não dá usar com o cabelo desgrenhado, roupa mulambenta, barba por fazer, ou tênis “excêntricos” toda a vez que der na telha, ou mesmo abusar de palavrões ou gírias durante uma conversa. Por mais que eu não concorde, infelizmente é assim que as coisas funcionam.

Pode parecer, pros outros, mediocridade, conformismo, ou até mesmo falsa humildade, sei lá. Frise-se, eu nunca fiz questão de ser o melhor, ou objeto da reverência alheia. Sempre quis ser bom e útil para quem eu esteja representando, independentemente de ser o ladrão de galinhas ou a União.

Entretanto, nessa carreira, infelizmente, prevalece muito mais aquilo que os colegas enxergam na(ou da) gente, a despeito daquilo que somos de verdade: ou eu danço conforme a música para ser reconhecido como bom, ou então, sou alijado do sistema e tachado de bizarro (mesmo que eu seja um dos mais brilhantes). Não posso ser escroto o bastante para ser do jeito que quero, mas se eu entrar na coreografia, corro o risco de ser apenas mais um dentre os milhares. Em determinados momentos, por questão de política profissional, serei obrigado a fazer uso da famosa “capa”, apesar de ser convicto de que tal artifício é algo repugnante. Eis um dos dilemas cuja dosagem ideal eu ainda vou perder muitos cabelos até encontrar. Afirmo com toda a certeza que, no campo profissional, as minhas constatações foram das mais chocantes e brochantes que eu tive nessas épocas.

Finalmente, o amor. Ah, o amor... o “quesito” que é, sempre foi, e sempre vai ser o mais embaraçoso de se entender, principalmente pra mim. O sentimento mais carregado de emoção, que sempre aparece para desmontar a fortaleza de certeza e razão que eu tento erguer como meu escudo. Prescindível é, a essa altura, ficar detalhando meu histórico amoroso com as mulheres (que não foram tantas) que fizeram parte da minha vida, muito menos esmiuçando cada relacionamento. A cagada é quando a gente lida com pessoas diferentes, e se apercebe de como as pessoas são complicadas, os relacionamentos são enrolados, tudo por causa da emoção e do sentimento. Essa dupla é pós-graduada em desmoronamento de razão.

Sempre na fossa, geralmente após ter tomado uns gorós e ter falado merda até não querer mais, o encostar da cabeça no travesseiro traz a tristeza. Como já foi dito lá atrás, das frustrações e dos reveses é que brotam os aprendizados. A pessoa que parece muito com a gente quase sempre não é a certa. E aquela de características opostas? Os opostos se atraem? Pura conversa fiada ! Aí é que não dá mesmo ! E por quê então é que tentamos? Simples: porque somos imbecis, e achamos que pode dar certo pensando com o coração. Olha aí a emoção novamente causando destruição.

Deu pra perceber que o amor, por mais forte e puro que seja declarado, é um sentimento podado por vários outros fatores, como amor próprio, egoísmo, diferenças. Portanto, nem sempre o fato de duas pessoas que se gostam demais vão resultar na melhor e mais inesquecível das relações. Ou por outro lado, até mesmo aquele relacionamento que começa despretensioso, sem aquele amor latente e derretido, mas que começa pautado no respeito às diferenças, a individualidade e ao amor próprio de cada um, esse sim, tem muito mais chances de se prolongar em harmonia. Mas, nessa hipótese, falamos mesmo do amor ? Ou seria uma espécie de relacionamento-de-conveniência-com_espasmos-de-carinho? Puta que o pariu, melhor nem pensar ! Enfim, algumas dessas “premissas” ainda não verdades absolutas pra mim, até porquê eu não consigo explicar como é possível que, e certos casos, é melhor que duas pessoas que, embora se amem muito, não fiquem juntas. Ou então, que a garota bonita, bem-humorada, inteligente, de bons gostos e bem resolvida profissionalmente possa chegar a amar um merda de um cara que não quer porra nenhuma com a vida, que não acrescenta nada pra ninguém, tem bafo e ainda é odiado por todos que gostam daquela. Ah, o amor ... cheio dessas ciladas !

São tantas perguntas sem resposta, tantas hipóteses, tantos caminhos a serem seguidos, cada um podendo ocasionar as mais diversas consequências. Os exemplos dados aqui podem parecer besteira – embora a música fale que besteira é coisa séria, é preciso com ela filosofar –, mas servem para dar um esboço de tudo que vivemos (nos) interrogando, ou de tantas certezas que fingimos que temos.

Mesmo assim, sinto que cresci. Hoje, ainda não o suficiente para ter a maioria das respostas que quero. Mas cresci ao menos a ponto de perceber o quanto o que eu perdi, o quanto de merda eu pensei, o quanto de coisas que eu vou ter que refazer e ainda o tanto de coisas que ainda tenho pra aprender, mesmo que seja na marra. Cresci, pelo menos, ao ponto de questionar minhas certezas de outrora, e de colocá-las em xeque.

Na vida, poderemos ser nós mesmos sempre, mas sempre lembrando que há os outros que nos rodeiam. Compreendi que não temos direito de impor nada a ninguém, nem sucumbir às imposições de outrem, bastando encará-las como opiniões, por mais diferentes que elas sejam. Comecei a entender aquilo o que a minha mãe sempre quis me dizer com o indefectível “temos que respeitar as diferenças”, e comecei a levantar essa bandeira não mais da boca pra fora. Não podemos virar de costas para o mundo com um ar de “foda-se”, pois dependemos de tudo e de todos, por mais ínfima que essa relação de dependência possa ser. Que muito daquilo que somos não se liga exclusivamente ao que queremos ser, mas também, de como moldamos nossa imagem, partindo de como pretendemos que os outros nos vejam.

Como diz o bordão, viver é um constante aprendizado. O que eu fui ontem, o que sou hoje e o que eu serei amanhã? Esse a partir desse conflito que brotam todos os outros questionamentos que surgem pra mim. Justamente por não saber as respostas, todas essas incertezas é que me causam tanta tensão, e às vezes, não me deixam dormir. O que serei amanhã vai depender das respostas que eu ache, de como vou equacionar o que eu QUERO ser e o que eu DEVO ser.

Ao menos, as primeiras conclusões eu já tenho. Sentar num bar e enfiar trocentos copos de cerveja goela abaixo para “esquecer de tudo”, além de não aliviar a agonia, ainda corrói o fígado. Em vez de encher a lataria, é até melhor chorar. Deixar escorrer umas lágrimas, não só por tristeza ou raiva, não é vergonha pra ninguém (sim, os viris também choram!). Chorar de felicidade, chorar por comoção, ou por qualquer motivo que seja faz (e muito) bem! Às vezes, uma lágrima e uma expressão facial traduz uma carga emotiva muito mais sincera do que mil palavras. O choro decorrente de um filme de drama pode fazer tão bem, ser tão descongestionante quando aquele que acontece pela simples constatação de que não estou preparado suficientemente para o turbilhão que anda pesando sobre as minhas costas. É... as lágrimas da incerteza e da fragilidade também fazem bem que só, aliviam, e isso eu só tive o prazer de constatar de pouco tempo pra cá

Mas isso ainda é pouco. Torço para conseguir achar as respostas rápido. Sob pena de ter outra iniciativa tosca de gerar um documento de Word relatando as minhas viagens pessoais para encher o saco alheio. Ou sob pena de ficar com olheiras estilo Ray Ban por continuar acordando às três e pouco da manhã, e no final, ainda enjoar de Tomorrow never knows ...

3 comentários:

moara disse...

essas coisas da vida nesses vinte e poucos anos nos pertubam, mas é isso, e vais bem obrigado.

ah..ache as respostas, mas continue escrevendo no word pra gente!

amei!

4 de abril de 2008 às 16:33
Carol Barata disse...

O mais engraçado é que eu consigo imaginar o Lucas - viril demais, diga-se de passagem - falando exatamente da forma que ele ecsreveu. mas confesso que jamais o imaginei sofrendo que nem nós, os meros mortais, sobre as crises de identidade e a necessidade da adaptação... hehehehe. mas amei. Concordo com a Moa: please, continue!

=o*

11 de abril de 2008 às 05:46
lora disse...

esse texto tá a tua cara nesse novo momento "leveza e maturidade"

muito lindo, meu amigo

:*

22 de abril de 2008 às 13:43

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