quarta-feira, 30 de abril de 2008

Pobre tem dessas coisas...

Por Moara Brasil

Ser pobre é uma merda mesmo. Andar de bonde pelo Guamá, meio dia, ouvindo tecnobrega no volume mais estridente , depois da faculdade, na “brea” de Belém, de salto alto, com fome, não é para qualquer um mesmo! E nos últimos minutos antes de descer na parada de ônibus, decidir se pára no restaurante que vende fiado ou arriscar almoçar em casa, e de salto alto, é sempre uma grande dúvida quando se tem que trabalhar exatamente duas horas da tarde. Decidi almoçar em casa, pois me falaram que ia rolar peixe na panela. O problema é que não senti cheiro de peixe no caminho da minha casa, e meu estômago junto com meus calos foram ficando mais tristes. É, a Cláudia não havia ainda preparado o peixão, e eu estava atrasada para o trabalho. Então decidi correr para o restaurante que vende fiado. Eu não gosto muito de lá, mas pobre não deve reclamar de muita coisa não. Entrei na sala, de cheiro gorduroso, daqueles que ficam impregnados no cabelo, procurei o povo do agência que eu trabalho, que sempre costuma almoçar por lá, e não vi ninguém. É, meu almoço seria solitário mesmo. E uma mesa vagabunda me esperava no cantinho.

Sentei, abri o livro “Luxo Eterno”, que eu estou estudando para o meu projeto de tese de conclusão de curso, coloquei o fone do meu mp3 nos ouvidos e esperei o garçom vir. Depois de ler quase uns dez minutos de identidade visual de marcas luxuosas das teorias de Lipovetsky, minha barriga roncou e resolvi procurar o tal do garçom.

Ele entrou na sala e disse que já ia me atender. Tudo bem, tudo bem. É bom ler num ambiente com odor de gordura e uma fome de gastrite. Fechei o livro, não consegui ler de jeito nenhum. E a TV me chamou a atenção: “Você já viu algo igual? Pois essa mulher é diferente, você já viu alguém escrever desse jeito?”. Enquanto isso o apresentador gordo mostrava um papel com uns rabiscos ilegíveis, com um fundo musical sensacionalista e o mistério da mulher que escrevia estranho era a grande sensação do programa da Record, naquele dia muito quente. E a mulher que escrevia diferente apenas escrevia de trás para frente. Entende? Na telinha da TV também brilhava uma notícia: Caso Isabella Nardoni, fique sabendo como pode ser fácil descobrir de quem é o sangue nas roupas encontradas.

E a minha barriga roncava, a minha mesa ainda estava cheia de pratos e restos alimentares que outro ser havia deixado por lá. Um trio de amigos trabalhadores chegaram, e sentaram na minha frente.

Olhei no canto do olho para a mulher loira, e ela perguntou para o garçom “O filé daqui é filé mesmo?”. Me irritei, mas não com o que ela havia falado, e sim porque outro garçom apareceu no recinto e não me atendeu. Acenei e chamei o maldito. “Espere um minuto”, ele disse. "ACONTECE que eu estou a meia hora aqui, já pedi para arrumar a minha mesa, todo mundo já está de barriga cheia e a sala está ficando vazia e ainda nem me ATENDERAM!”. "Tudo bem", ele falou na maior calma do planeta.

Mas eu não sei o porquê, meu filé escroto na chapa não veio, e sim o bife da cavala...ops...bife à cavalo da Loira do canto. Não era o meu dia mesmo, e o primeiro garçom surgiu das trevas para me perguntar adivinha.... “O que eu havia pedido mesmo?”. Claro que me irritei, disse que ia embora, e que não estava acreditando nisso. Mas enfim, tive paciência, e esperei pelo filé de pobre. E pra piorar, quando veio a comida, coloquei molho inglês na carne pensando que era molho shoyu, claro...porque restaurante de pobre pra gente pobre como eu coloca molho inglês em vidrinhos Sakura, só para enganar malditos pobres como eu.

E para finalizar, ainda tive que ficar esperando uns 20 minutos do lado de fora da agência, de salto alto, com calo no pé, jeans, uma comida de pobre no estomago e num corredor calorento, porque ninguém tinha chegado ainda. E quando os colegas chegaram, ainda me disseram que estavam no mesmo restaurante que eu...é... pobre tem dessas coisas, pobre tem que passar por isso. Pobre tem que sofrer mesmo, e não reclama!

1 comentários:

Carol Barata disse...

Vi uma frase um dia num blog desses da vida: "Eu nasci para ser filho de pai rico. Bem, eu nasci. Meu pai é que não fez a parte dele".

Acho que isso resume bastante a nossa saga de termos todo glamour do mundo sem nenhum tostão no bolso. Pelo menos me resta essa cara de granfina. HUAhuHAuHAUAHuHA

Eu saco esse restaurante que tu almoças! HAUhUAhuHauhUHa. Por várias vezes a Lora tentou me convencer de comer lá nos almoços felizes, nos tempos dela de Marajó. Mas depois que eu descobri o prato executivo - forma gentil e glamourosa de chamar o velho e bom prato feito (PF) - no Cosanostra, não quis mais outra coisa do meu almoço "comercial".

Pior ter grana e não ter classe, tá meu beeeem?

HAuHAuHAuhAUhU

5 de maio de 2008 às 12:55

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